Opinião

Contran quer impor extintor perigoso

Jair Lauriberto Roveri e Rolando Rodrigues da Costa

 

Lembra-se do estojo de primeiros socorros? Pois agora o Contran (Conselho Nacional de Trânsito) vem com outra novidade absurda e descabida. A partir de 1º de janeiro de 2005, todos os veículos automotores devem possuir o extintor ABC descartável com o pó químico MAP – Monofosfato de Amônia (NH4H2PO4), prejudicial à saúde e agressivo ao meio ambiente. Na expedição da Resolução nº 157, de 22/04/2004, o Contran demonstra falta de conhecimento acadêmico e científico, ignorando inclusive a ficha técnica do monofosfato de amônia, onde constam os riscos que o produto oferece.

Esse substituirá o tipo BC com bicarbonato de sódio (NaHCO3), utilizado atualmente e plenamente seguro. Basta lembrar que é o que tomamos, diluído em água, para combater a acidez, sem contar seu uso culinário, para tornar bolos mais saborosos.
Para compensar troca tão estapafúrdia, o Contran, em nota técnica e em entrevistas à imprensa, alega três benefícios: maior proteção, vantagem financeira e segurança. Contudo, todos podem ser refutados:

1) Afirma que o extintor descartável ABC cobre a classe A, referente à forração interna dos veículos, aos bancos e aos tapetes. No entanto, o princípio de incêndio nunca se dá nesses locais, mas sim nas classes B, líquidos inflamáveis, e C, equipamentos elétricos.

2) Não há vantagem financeira, pois o extintor ABC custa o dobro do preço.

3) Para ter segurança, o usuário terá que usar roupas de PVC e equipamentos de proteção respiratória, pois o monofosfato de amônia, em contato com o fogo, libera gases tóxicos irritantes, nitrosos, amônia e óxido de fósforo, que causam danos respiratórios agudos. O pó transforma-se em líquido, que causa queimaduras e irritações na pele – e imagine o acidentado preso nas ferragens do carro.

Além disso, demonstrando falta de transparência, não informa que, no descarte, o monofosfato de amônia contamina cursos de água – em países do Primeiro Mundo, o material é reciclado.

 

Impacto social – Com a medida, o Contran está também provocando mais de 40 mil desempregados e a falência de mais de 1.200 empresas brasileiras envolvidas na manutenção e na reciclagem dos atuais extintores BC. Aos 36 milhões de proprietários de veículos, não dá opção do que fazer com o atual extintor; na mesma situação fica o um milhão que está nas empresas de manutenção. Tudo isso beneficia uma única empresa multinacional recém-chegada ao Brasil. Para tornar a mudança possível, a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) atualizou em oito dias a norma NBR nº 10.721, adequando ao extintor ABC descartável. Agora, impõe-se à sociedade, de modo truculento, a troca do extintor.

Ciente de que 90% dos condutores não sabem usar o extintor de incêndio, o Contran deveria era ter expedido resolução exigindo no curso de formação de motoristas a matéria “prevenção e combate a incêndio”.

Nisso tudo, esquece-se de uma questão elementar: o extintor de incêndio é para salvar vidas.

 

Jair Lauriberto Roveri é engenheiro mecânico e de segurança do trabalho e Rolando Rodrigues da Costa é arquiteto e engenheiro de segurança do trabalho

 

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