Editorial O machão de Harvard e as engenheiras brasileiras |
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Larry Summers, o reitor da prestigiosa Universidade de Harvard, viu-se em maus lençóis após sugerir que diferenças entre os cérebros masculino e feminino explicariam o pequeno número de mulheres na área científica. Por conta do comentário machista, acabou protagonizando um episódio inédito nos 400 anos de história da instituição. Em 15 de março, os professores da Faculdade de Artes e Ciências aprovaram uma moção de desconfiança contra ele. Como sói acontecer com as teses preconceituosas, a infeliz ponderação não encontra qualquer base em estudos científicos. Para o geneticista Steve Jones, em declaração ao jornal inglês Observer, reproduzida pela revista Carta Capital, “a celeuma diz mais sobre Harvard do que sobre os cérebros de mulheres ou de homens”. “Tudo isso está relacionado a contextos históricos e antes de se eliminar essa questão não se podem fazer generalizações do tipo da feita por Summers”, completou. Assim, claro está que a participação de homens e mulheres em certas áreas do conhecimento e a divisão sexual do trabalho estão ligadas a fatores socioculturais, e não à genética. Talvez ajudasse a clarear as idéias do professor Summers a leitura da tese de doutorado da pesquisadora Maria Rosa Lombardi, recentemente defendida na Faculdade de Educação da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). Intitulado “Perseverança e resistência: a engenharia como profissão feminina”, o estudo demonstra a vocação das mulheres para o setor, apesar de todos os obstáculos. Entrevistadas pela pesquisadora, as engenheiras contam inúmeros casos de discriminação no mercado de trabalho. Aquelas com idade acima dos 50 começaram a enfrentar o preconceito em casa, por escolherem uma profissão considerada inadequada ao seu gênero pela família. As mais jovens já podem abraçar a engenharia com a bênção dos pais, mas ainda assim têm de enfrentar um universo preponderantemente masculino na escola e no trabalho – em 2002, as garotas foram responsáveis por 20% das matrículas em engenharia. À situação, reagem exemplarmente: “O traço diferenciador do comportamento do grupo minoritário de moças em relação ao grupo majoritário dos rapazes no ambiente escolar (...) é a estratégia feminina de afirmação, através da grande dedicação aos estudos, de um excelente desempenho escolar (...).” O aumento contínuo e constante de mulheres na profissão demonstra que há avanços, mas ainda não o suficiente para garantir igualdade de oportunidades, conforme aponta a pesquisadora: “A conclusão a que esse estudo permitiu chegar é que a posição das mulheres na engenharia permanece especial e excepcional, sua presença nas turmas das escolas de engenharia ainda é contabilizada de memória, em que pese o seu crescente número nos cursos de engenharia e no mercado de trabalho e também sua melhor aceitação nas escolas e nas empresas hoje, comparativamente a 30 anos atrás. A ordem de gênero transversal à engenharia classifica áreas de conhecimento e de trabalho, atividades, atribuições e posições hierárquicas como mais ou menos masculinas ou femininas e as valoriza de forma diferente, em favor do sexo masculino.” E, no entanto, elas insistem: “Para as engenheiras, a perseverança e a resistência parecem ser a regra, a norma a seguir para permanecer no campo profissional, mas, apesar de tudo isso, são profissionais satisfeitas com as carreiras que construíram, pois, conforme a quase totalidade delas afirmou, fariam tudo de novo.” Pelo visto, o que falta às profissionais brasileiras para se firmarem no campo da ciência e tecnologia é oportunidade, não pendor científico.
Murilo
Celso de Campos Pinheiro |
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