Opinião

Afinal, o que é qualidade de vida?

Luiz Edson de Castro Filho

 

O IEQV (Índice Econômico de Qualidade de Vida) pode significar muita coisa. Tudo depende dos parâmetros utilizados para formação do conceito em questão. Enquanto para um recém-nascido a qualidade de vida pode estar na simples proximidade do colo materno, para um pré-adolescente provavelmente esteja na possibilidade infinita de freqüentar baladas ou na existência de inimagináveis pistas de skate.

Assim, cabe perguntar: o que quer dizer qualidade de vida quando se trata de meio ambiente? Na edição nº 260 do Jornal do Engenheiro, a manchete de capa, “Árvores pedem água”, é a tradução da cegueira ambiental da maioria dos administradores urbanos. Sob o título “Árvores padecem na selva de pedra”, o texto menciona ponto crucial nessa questão: “Fundamentais para a qualidade de vida nos centros urbanos, com importante papel na minimização dos efeitos das alterações ambientais, as árvores nem sempre recebem o tratamento que merecem.” Precisa maior clareza?

Enquanto isso, em matéria veiculada no jornal O Estado de São Paulo, de 30 de julho último, a Subprefeitura de Parelheiros teve seu IEQV avaliado com a nota zero. Aparentemente, precisamos avisar aos messiânicos que seu “solo sagrado”, visão do Paraíso na Terra e sede mundial da igreja, está equivocadamente situado na região. Pela mesma lógica, a APA (Área de Proteção Ambiental) Capivari-Monos talvez devesse ser objeto de um plano de urbanização da CDHU ou da Cohab.

O leitor, por acaso, sabe da existência de uma cachoeira com desnível de 80 metros no Rio Capivari, no próprio município de São Paulo, onde se realizam trilhas ecológicas e rafting? E, acreditem, com o IEQV igual a zero, da mesa em que escrevo, já pude ver guaxinim subindo em árvores. E à noitinha consigo ver estrelas.

Evidentemente, por falta de política habitacional na área central da Capital, há uma verdadeira invasão da periferia, guiada pela ótica predatória das imobiliárias. Algumas vezes orquestradas pelos próprios políticos de plantão, as invasões em área de mananciais são as principais responsáveis pela degradação ambiental.

Parelheiros não empobrece ninguém! Ao contrário de grande parte das subprefeituras da Cidade, a de Parelheiros não é desenvolvimentista, mas sim preservacionista, uma vez que vem dela pelo menos 20% da água consumida em São Paulo. Com cerca de 24% da extensão territorial do município, possui mais de 70% das áreas com características tipicamente rurais. O adensamento populacional não é bem-vindo a Parelheiros. Os lotes populares, com 125m², são extremamente traumáticos para a região, dada sua vocação de provedora de águas.

Obviamente, a normalidade deve prevalecer. Assim, loteamento clandestino, invasões, degradação de área de mananciais não podem ser toleradas, mas combatidas a todo custo. A ocupação deve obedecer a critérios de manejo sustentável, com sítios ou chácaras de lazer, culturas adequadas ao local, devidamente orientadas por agrônomos, engenheiros florestais, geógrafos e agentes de gestão ambiental.

Nesse sentido, parabenizo o SEESP pela abordagem de sua matéria, que tal qual um lírio no lodo, mesmo estando sediado junto à Praça da Bandeira, soube ter os olhos para a realidade com visão de longo prazo. Pode ser que, para muitos, conviver com ar puro, água de qualidade e a natureza preservada não seja qualidade de vida. Mas, sinceramente, essas pessoas não sabem o que é qualidade de vida.

 

Luiz Edson de Castro Filho
É engenheiro e coordenador de Planejamento e Desenvolvimento Urbano da Subprefeitura de Parelheiros

 

Texto anterior

Próximo texto

JE 263