Engenharia

Tapa-buracos deixam a desejar

Soraya Misleh

 

Tanto o programa de recapeamento da Prefeitura de São Paulo, em execução desde outubro do ano passado nessa cidade, quanto o Petse (Programa Emergencial de Trafegabilidade e Segurança nas Rodovias), iniciado em janeiro pelo governo federal, têm enfrentado enxurrada de críticas. No primeiro caso, as queixas referem-se principalmente à ausência de sinalização e desnível no asfalto após o recapeamento.

No segundo, questionam-se desde as intervenções que vêm sendo feitas até o caráter emergencial do programa. Especialistas alertam ainda que as soluções, tanto em vias urbanas quanto em rodovias, deveriam levar em conta a diversidade de solo, clima e materiais disponíveis nos diversos pontos. “Cada pavimento, cada camada tem uma estrutura diferente”, complementa Márcia Aps, pesquisadora do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) e mestre em engenharia de transportes.

Ambos têm em comum o fato de terem sido necessários devido à ausência de manutenção devida. “Quando um governo lança esses grandes programas com vias ou rodovias muito deterioradas, está dizendo que não fez a lição de casa. Ou seja, não foram efetuadas as manutenções de rotina e periódica e a reabilitação”, constata Aps. Janos Bodi, engenheiro da Assessoria Técnica de Obras e Serviços da Secretaria Municipal da Coordenação das Subprefeituras de São Paulo, avaliza: “A Prefeitura poderia se antecipar ao aparecimento do buraco. Só que a nossa receita é muito pequena.” Segundo ele, esse tipo de serviço é feito apenas nos países do primeiro mundo. A contradição é que, conforme Bodi, prevenir sai muito mais barato que remediar. Além disso, “adia a necessidade de investimento em recapeamento por dois a cinco anos”. Isso porque, como ensina a pesquisadora do IPT, o buraco “evolui de um outro defeito”. Por exemplo, de uma fissura capilar na via, caso não seja tratada.

No município de São Paulo – em que, segundo informação oficial, a operação abrangerá 207 vias, num total de 230km –, entre as irregularidades estão “buracos, afundamentos ou ressaltos variados devido à má reposição de valas por parte de concessionárias de serviços públicos”. Tendo em vista os trechos comprometidos, a idéia, conforme Bodi, era que o programa abrangesse 1.400km. Porém, não houve recursos para tanto. Diante disso, selecionaram-se pontos prioritários, tais como “as marginais, grandes avenidas, ruas mais movimentadas”. O engenheiro enumera as soluções adotadas no município: tapa-buraco, recapeamento, fresagem, uso de massa com ou sem polímero, além de capa asfáltica (bynder) na primeira e segunda faixa das marginais. Tais ações custarão cerca de R$ 100 milhões, oriundos, de acordo com Bodi, de orçamento próprio e verba do governo estadual.

Quebra-galho
Além de o programa não atender toda a extensão necessária, após determinadas intervenções, têm sido preciso efetuar correções. “Tem nivelamentos que devem ser feitos, tem buracos que abriram recentemente por falhas de material em áreas pequenas”, reconhece o engenheiro. Outro problema que salta à vista de quem anda pelas ruas paulistanas é a não-sinalização adequada em trechos que sofreram intervenção, onde, por exemplo, não foram pintadas faixas na seqüência. “Existe algum atraso, porque a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) tem poucas empresas contratadas para tanto. Mas licitação está em andamento”, explica Bodi.

Com materiais empregados e métodos uniformes em todo o País, segundo informação da assessoria de comunicação do Ministério dos Transportes, o programa do governo federal também deixa a desejar. “As soluções deveriam ser por região e não uma única para o Brasil inteiro. Mesmo porque existem em torno de 15 ou 20 defeitos diferentes que ocorrem nos pavimentos asfálticos, mas numa mesma malha viária não passam de cinco”, salienta Aps. O Petse inclui 26.441km em 25 estados – entre os quais São Paulo, ao qual são destinados, para obras em 823,9km, cerca de R$ 4,4 milhões do total de R$ 440 milhões.

Para Edemar de Souza Amorim, vice-presidente do Instituto de Engenharia, trata-se de serviço quebra-galho. “O certo é reconstruir o pavimento. Tem fissuras a 50cm do buraco que não estão selando. Vai continuar penetrando água e arrebentar em torno do local onde foi feito o remendo.” Ele condena ainda o lançamento do programa nesse momento. Como justificativa, o Dnit (Departamento Nacional de Infra-estrutura) afirma em seu site que, a partir de 2003, o governo iniciou amplo programa de manutenção. Contudo, “não havia disponibilidade financeira suficiente para atendimento do total necessário”. Conforme o órgão, a situação existente “não poderia esperar a elaboração de projetos de engenharia e a execução de obras definitivas de restauração, o que será realizado concomitantemente ao programa e em seqüência desse”.

Na análise de Carlos Bastos Abraham, diretor regional Sul da Federação Nacional dos Engenheiros, a verba arrecadada com a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) poderia melhorar bastante esse cenário. Porém, segundo a assessoria de comunicação do Ministério dos Transportes, tais recursos ficaram contingenciados até o ano passado para compor o superávit primário. Conforme divulgado pela imprensa, a receita obtida com a Cide em 2005 foi de R$ 7,7 bilhões, sendo repassados aos estados 29% do total.

 

 

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