Economia

O que muda para as micro e pequenas empresas

Soraya Misleh

 

O Projeto de Lei Complementar nº 100/2006 define normas gerais às micro e pequenas empresas – aí enquadradas as que têm faturamento até R$ 240 mil, no primeiro caso, e R$ 2,4 milhões, no segundo. Tramitando no Senado em regime de urgência, foi aprovado na Câmara dos Deputados em 5 de setembro último, por 308 votos favoráveis, contra apenas seis e três abstenções.

Entre outras disposições, institui a essas empresas o Supersimples, ou seja, um único regime de arrecadação de impostos e contribuições da União, estados, Distrito Federal e municípios. Com a medida, segundo André Spínola, consultor do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) em Políticas Públicas, as 1,85 milhão de optantes do Simples atual – que abrange apenas tributos federais e é destinado em especial aos setores da indústria e comércio – devem ter, em média, diminuição nos impostos de 15% a 20%. Além disso, a partir do Supersimples, um novo universo deve ser beneficiado. Spínola estima em mais 200 mil empresas, cuja redução tributária pode chegar a 45%, incluindo-se as de engenharia e construção civil. No total, conforme ele, configuram-se no País como micro e pequenas 2,7 milhões.

Na ótica do consultor, o grande mérito do projeto, portanto, é que apresenta respostas às duas principais queixas dos pequenos negócios: a burocracia e tributação excessivas. “Com isso, gerir a empresa fica praticamente impossível.” De fato, são grandes suas dificuldades. De acordo com ele, no Brasil, conseqüentemente, as micro e pequenas respondem por apenas 2% do valor exportado, a despeito de corresponderem a 99,2% do total das empresas nacionais. A participação nas licitações também é pouca: 13%. Têm, ainda conforme o consultor, menos acesso ao crédito, dadas as dificuldades em dar garantias, e à inovação tecnológica.

A Lei Geral da Micro e Pequena Empresa propõe mecanismos para enfrentar essas questões, como prioridade e simplificação em licitações (exclusividade nas até R$ 80 mil), facilidades nas linhas de financiamento, abertura, escrituração e fechamento dos negócios. Nesse último caso, lembra Spínola, a baixa é automática no caso de três anos sem movimento, “mesmo que haja passivo tributário” – contra os cinco anteriores. Na sua concepção, ao se atacarem os principais problemas dos pequenos negócios, cria-se um círculo virtuoso, com reflexos sobre o crescimento do País. A expectativa é que haja geração de emprego e renda, já que o universo objeto da lei é o que mais contrata – 60% da força de trabalho, segundo divulgou o relator do projeto na Câmara, deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR). E que se reduza a informalidade. Nesse sentido, embora não se arrisque a fazer projeções, Spínola acredita que a nova norma será um divisor de águas.

 

Flexibilização e outros riscos
Ninguém contesta a importância de se facilitar a vida dos pequenos negócios. O problema são medidas pontuais previstas no projeto. O jornalista Antônio Augusto de Queiroz, diretor de documentação do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), por exemplo, vê ameaças aos direitos trabalhistas. “O projeto estabelece que a fiscalização, nesse e em outros âmbitos, para empresas com faturamento até R$ 2,4 milhões, será orientadora. Ou seja, não se multa de cara, notifica-se a que se faça um ajuste de conduta”, explica. Para ele, é um convite à ilegalidade, uma vez que não há fiscais em quantidade suficiente para a realização de dupla visita em curto espaço de tempo. A despeito de a medida estar prevista no atual estatuto nacional da micro e pequena empresa, na análise de Queiroz, sua abrangência é ampliada. Isso porque, além de englobar novos setores e elevar a faixa de renda (antes estipulada em aproximadamente R$ 2,1 milhões), consolida essa situação, por ser apresentada sob a forma de lei complementar.

O projeto abre ainda brecha a que o negociado prevaleça sobre o legislado. Em seu artigo 75, dispõe que “as microempresas e empresas de pequeno porte deverão ser estimuladas a utilizar os institutos de conciliação prévia, mediação e arbitragem para solução dos seus conflitos”. E no parágrafo primeiro, que “serão reconhecidos de pleno direito os acordos celebrados” no âmbito dessas comissões. “O que for negociado terá eficácia liberatória aos empregadores”, constata Queiroz. Além disso, as empresas enquadradas pelo projeto ficam desobrigadas de procedimentos como anotar as férias dos empregados nos livros ou fichas de registro e comunicar ao Ministério do Trabalho e Emprego a