Opinião

Tecnologia para o transporte

Adriano Murgel Branco

 

Dias atrás, fui instado a dizer, no Sindicato dos Engenheiros, como enxergo a questão tecnológica nos transportes. A idéia corrente acerca de tecnologia é de que ela responde pelas inovações, a partir da pesquisa e da expansão do conhecimento. De fato, são as universidades e os centros de pesquisa que alargam as fronteiras do conhecimento. Mas um certo gênero de pesquisa, sobretudo aquela feita por pesquisadores industriais, segue a “encomenda” de novos produtos ou novos processos. É o que se tem convencionado chamar de “pesquisa aplicada”.

Não se pode ignorar, por outro lado, a influência do talento nato e da experiência acumulada por sociedades que não seguem as regras do saber clássico. Assim, a sociedade moderna vem, por exemplo, procurando adquirir conhecimentos até então desdenhados, como aqueles praticados há milênios – o caso da acupuntura – ou encontrados nos povos primitivos, sobretudo no que tange às questões de saúde. Virou até moda, nas últimas décadas, produzir medicamentos e cosméticos a partir do conhecimento dos indígenas acerca das plantas.

Mas também não se pode descartar a intuição e a observação, guiadas ou não por um certo conhecimento. Foi à custa da queda de uma maçã, por exemplo, que Newton chegou à formulação de suas teorias.

A solução dos problemas do transporte urbano também depende da tecnologia, mas não meramente aquela dos veículos. Aliás, os veículos de transporte que utilizamos são praticamente os mesmos dos últimos 100 anos, ainda que em sua maior parte – os automóveis, ônibus e caminhões – sejam baseados nos motores de combustão interna, de baixíssimo rendimento energético. Um terço da energia gasta vira trabalho (na melhor das hipóteses) e dois terços se transformam em calor. E os três terços respondem pela maior parte da poluição atmosférica.

Não obstante isso, cresce continuamente o uso desses transportes poluidores, em detrimento daqueles de uso coletivo mais intensos e movidos a eletricidade, com rendimentos energéticos na casa dos 80%. Em São Paulo, até nos demos ao luxo de descartar os bondes e hoje, aos poucos, estamos degradando os trólebus. Pela primeira vez, em um século, o transporte individual ultrapassou o coletivo, mesmo que se saiba que, na cidade de São Paulo, uma viagem média de automóvel consome 26 vezes mais energia do que a feita por metrô. Por outro lado, drenam-se todos os recursos disponíveis para o sistema viário e para o desperdício, pois as perdas da sociedade na RMSP (Região Metropolitana de São Paulo) ultrapassam os R$ 20 bilhões por ano, devido aos problemas de transporte e trânsito, pouco sobrando para o transporte coletivo organizado, principalmente o de massa. Resulta ainda desse descalabro que mais de um terço dos deslocamentos diários na RMSP se dão hoje a pé.

Tecnologia veicular e de obras para o bom transporte não faltam. O que escasseia é o bom senso: a tecnologia da gestão pública.

 

Adriano Murgel Branco
É consultor na área de transportes e em 2006 foi agraciado pelo SEESP com o prêmio Personalidade da Tecnologia

 

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