Munidos de faixas, com o plenário lotado, os servidores públicos do município de São Paulo deixaram claro ao prefeito Fernando Haddad (PT), que a grande maioria dos trabalhadores rejeita o projeto de lei 312/2014 enviado à Câmara Municipal pelo executivo, que congela os salários de todo o funcionalismo público municipal, a partir da remuneração feita por subsídio. Diversas entidades sindicais estiveram presentes na audiência pública que discutiu o PL, ocorreu nesta terça-feira (13/8), entre 10h e 12h, no Plenário 1º de Maio, entre eles o Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (SEESP).
Os engenheiros e arquitetos, estes representados pelo Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo (Sasp), chegaram logo cedo ao plenário e demonstraram força ao lotarem os assentos do local. Para as categorias, tanto o PL312/14, quanto o Projeto de Lei Ordinária (PLO) 03/2014, que altera a Lei Orgânica do Município, para abrigar judicialmente o conceito do subsídio municipal, são inconstitucionais.
“Tem um nível de unidade muito grande das categorias, o que é bem importante. Um subproduto desse processo é unificar os trabalhadores públicos, aumentar seu nível de organização e participação política e, consequentemente, aumentar seu protagonismo na vida da cidade. É mais do que uma questão de salário, são os [servidores] que garantem a qualidade das políticas públicas na cidade”, declarou a deputada federal Luiza Erundina (PSB), que acompanhou a audiência na plateia.
Ao final, depois de ouvir os representantes dos sindicatos dos servidores, declarou: “Concordo inteiramente com as críticas feitas ao PL. Minha solidariedade [com os servidores] é total e plena”. Para Erundina, o PL 312/14 “não assegura uma política salarial, não assegura um plano de carreira e salários” e, o mais preocupante, “é o fato de mexer na constituição municipal que é a Lei Orgânica, de forma aleatória, o que não se faz dessa forma, gratuitamente, só para alterar a questão salarial. É um perigo isso. Pode dar margem para que outros governos façam o mesmo”.
Fotos: Beatriz Arruda/SEESP
Ex-prefeita Erundina acompanha audiência ao lado dos servidores
Há 23 anos, Erundina, então prefeita da cidade, fez um concurso público para engenheiros e arquitetos, o qual entre os aprovados estão a engenheira Denise Lopes de Sousa, da Secretaria de Habitação, que falou durante a audiência. Ela lembrou a justificativa dada pelo gabinete do prefeito para a adoção do subsídio que afirma pretender simplificar, dar transparência e monitorar a evolução das carreiras.
“Simplificação do quê? Tenho 23 anos de prefeitura, tenho gratificações e adicionais incorporados por conta do meu trabalho. Me dedico oito horas por dia ao serviço público, porque acredito no serviço público”, afirmou a engenheira, lembrando que o salário dos servidores tem um padrão (piso), gratificações por tempo de serviço e por cargos exercidos. “É a nossa vida, nossa experiência acumulada, que deve ser respeitada e valorizada. É justamente por conta desses adicionais por tempo de serviço que conseguimos sobreviver até hoje, por não termos reajustes salariais há anos”, completou Denise Sousa, referindo-se ao fato de que desde a aprovação da Lei Salarial 13.303, em 2002, os servidores vêm recebendo 0,01% de aumento, anual.
Inconstitucionalidade
O vereador Floriano Pesaro (PSDB), relator do PL, abriu a atividade enfatizando que é preciso “derrubar” tanto o PL 312/14, que institui o subsídio e uma carreira de “analista de generalidade”, quanto o Projeto de Lei Ordinária (PLO) 03/2014, que altera a Lei Orgânica do Município para abrigar judicialmente o conceito do subsídio municipal, e outros dois projetos que alteram negativamente a carreira dos servidores.
“Se conseguirmos vencer os projetos pela inconstitucionalidade, porque são inconstitucionais, ele será devolvido para o Executivo e, assim, serão obrigados a sentar novamente na mesa de negociação para enviar um projeto mais em sintonia com o servidor público”, declarou ao SEESP, o vereador Floriano Pesaro (PSDB), relator do PL 312/14, ao final da audiência.
Pesaro, que é da base oposicionista da Câmara, fez coro com os representantes sindicais que se pronunciaram durante a audiência sobre o PL 312: “O trabalho que a secretaria de Planejamento fez, comandado pela Leda Paulani, é muito ruim”.
Uma reunião que aconteceria durante a tarde desta quarta, na Comissão de Constituição e Justiça, foi cancelada por conta da morte de Eduardo Campos (PSB), que concorria como candidato à presidência da república. Nela, Pesaro iria se manifestar contrário ao PL e ao PLO, segundo explicou: “Se o governo mantiver maioria, vai tentar aprovar e fazer o projeto tramitar [e ser aprovado] enfiando goela abaixo. O diálogo nesse governo é uma farsa. A nossa preocupação é ter uma maioria de cinco, em uma comissão de nove, porque daí a gente consegue matar os dois projetos”.
Funcionários públicos acompanharam atentamente a audiência pública
O presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo (SindSep-SP), que é ligado à Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sergio Ricardo Antiqueira, também se posicionou contrário ao PL 312/14, lembrando que após a data de 1º de maio, tida como referência nas negociações salariais dos servidores, os trabalhadores de nível universitário não viram o cumprido do compromisso do prefeito Fernando Haddad com a reposição das perdas. “Mesmo sem ter concluído as negociações, o governo encaminhou, sem a anuência do Sindsep, o PL. Para piorar, encaminhou o PLO 03 e o PL 311/14 que sequer foram apresentados às entidades sindicais. Este último cria uma espécie de elite do nível superior com salários iniciais 50% superior ao que foi oferecido aos servidores na proposta de reestruturação”, disse Antiqueira.
A servidora Junéia Martins Batista, que é da direção executiva da CUT, disse estar aliviada com a fala do presidente do Sindsep e também cobrou de Haddad o cumprimento de sua promessa de campanha. “ Hoje estou aqui para defender meus princípios de classe e dizer que Fernando Haddad, para quem trabalhei na campanha, e esteve no meu sindicato para dizer que iria primeiro regularizar a questão dos reajustes salariais, mudando a Lei Salarial. Então, aqui, eu peço que ele cumpra o que ele falou. Primeiro queremos reajuste salarial. Depois, vamos brigar pela carreira”, exclamou.
A dirigente sindical aproveitou para alfinetar a secretária Leda Paulini, que apresentou demoradamente o PL no início da audiência. “Adorei que a Leda Paulani ficou com a gente mais de cinco minutos. Porque, eu recebo informes de que não é a primeira nem a segunda vez que ela chega em uma reunião, em mesa de negociação, com a chave do carro na mão, com pressa porque tem outra reunião e não tem tempo para nos receber”, disse em alto tom, sendo bastante aplaudida.
Durante sua fala de encerramento, a secretária foi bastante vaiada e não conseguiu expôr seu ponto de vista, que é favorável ao PL. Em um gesto simbólico, boa parte dos servidores presentes ficaram de costas para ela. Diante do fato, o vereador Antonio Goulart (PSD) precisou encerrar a audiência, que teve duas horas de duração e, para muitos presentes, foi considerada curta já que nem todos os dirigentes sindicais presentes tiveram tempo para falar. Congita-se a realização de uma nova audiência para discutir o assunto.
Posicionamento
Para o delegado sindical do SEESP, Sérgio Souza, foi uma audiência "extremamente proveitosa para os engenheiros e arquitetos e todo o funcionalismo público". "Mais de 90% dos presentes na assembleia eram contra o projeto que o governo quer implementar na cidade e são Paulo, inclusive setores da CUT. É um PL permissivo para todas as categorias, e em especial a engenheiros e arquitetos por terem suas especificidades e responsabilidades com a cidade”, observou.
O vereador Nabil Bonduke (PT), que integrou a mesa, também concorda que ficou evidente que a maioria dos servidores presentes é contrária ao PL. "Vou trabalhar para que a gente consiga construir uma alternativa que seja boa para todos e também para a prefeitura. É uma construção dificil, mas precisa ser feita porque os funcionários, novos ou mais experientes, são todos muito importantes para se ter uma boa gestão pública. Essa situação de confronto não é positiva e é preciso construir um consenso e chegar em uma proposta que atenda a grande maioria e que melhore a condição do serviço público", disse Bonduke.
Segundo justificativa encaminhada à Câmara pelo prefeito Fernando Haddad, a iniciativa propicia um “melhor controle pela população da remuneração dos agentes públicos. Demais disso, importa ressaltar que os valores da remuneração sob a forma de subsídio podem oferecer melhores condições para a atração e a retenção de mão de obra compatível com as necessidades locais, além de racionalizar as providências de gerenciamento da folha de pagamento da Prefeitura, hoje demasiadamente complexas em razão da enorme gama de rubricas e de situações funcionais peculiares e diferenciadas que foram se consolidando ao longo dos anos”.
Deborah Moreira
Imprensa SEESP