Rita Casaro
A partir de 5 de fevereiro passam a valer as regras da Lei 12.783, que visa reduzir na média em 20% as tarifas de energia elétrica fornecida pelo mercado regulado. Para as indústrias, o benefício deve atingir até 28% e para o consumidor residencial, 16,2%.
Segundo a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), responsável pelos cálculos na revisão extraordinária, economia de 7% será obtida com cortes nos encargos setoriais e de 13%, das tarifas médias de geração e transmissão. A União aplicará recursos anuais da ordem de R$ 3,3 bilhões na CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) para subsidiar programas como o Luz para Todos e a tarifa social destinada à população de baixa renda, hoje custeados pelo setor elétrico e rateados entre o conjunto dos usuários do serviço.
Sancionada em 11 de janeiro, a norma vigente originou-se do Projeto de Lei de Conversão 30/2012, aprovado no Senado e na Câmara em dezembro último, por sua vez, oriundo da Medida Provisória 579, editada em 11 de setembro, que causou polêmica no final de 2012 e foi objeto de amplo debate promovido pela FNE (Federação Nacional dos Engenheiros) em 26 de novembro, na sede do SEESP.
Para baixar o preço da conta de luz, a União ofereceu às empresas cujas concessões venceriam até 2017 a oportunidade de prorrogá-las, sem nova licitação, por mais 30 anos, desde que aceitassem o fim da atual até 31 de dezembro de 2012 e o novo valor calculado pela Aneel, que diminuiu a tarifa média de geração e a Receita Anual Permitida da transmissão, levando em conta a lógica segundo a qual as concessões renovadas não poderiam mais incluir ativos a depreciar e, portanto, não repassariam tais custos aos consumidores. Para quitar investimentos ainda não cobertos, as concessionárias receberão indenização do governo federal, anunciadas em cerca de R$ 20 bilhões e depois ampliadas conforme a Medida Provisória 591para atender a correções reclamadas pelas empresas.
Vencido o prazo para adesão ou não à proposta do governo em 4 de dezembro, os termos foram aceitos pelo Grupo Eletrobrás, apesar da oposição dos acionistas minoritários. Também optaram pela renovação Cteep (Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista), CPFL (Companhia Paulista de Força e Luz) e CEEE (Companhia Estadual de Energia Elétrica). Já Cemig, Copel e Celesc (companhias energéticas dos estados de Minas Gerais, do Paraná e de Santa Catarina) recusaram as regras apresentadas para a geração e aceitaram-nas para a transmissão. Também ficou de fora do pacote a Cesp, geradora de São Paulo. Com isso, as respectivas concessões ao final do contrato serão retomadas pela União e serão objeto de nova licitação.
Erro na dose
Durante o seminário realizado pela FNE, o secretário de Energia do Estado de São Paulo, José Aníbal, afirmou ser impossível aceitar as regras do governo. “No caso da Cesp, o MWh que eles estão nos oferecendo, R$ 7,42, não remunera operação e manutenção.” Para o diretor do SEESP e representante da federação na Frente de Defesa do Consumidor de Energia Elétrica, Carlos Kirchner, a modelagem adotada pelo governo tem pontos positivos, mas deixou de estipular valores justos para a geração, ao contrário da transmissão. A rigor, lembra ele, só as geradoras federais aceitaram a renovação.
Para o engenheiro, embora acerte ao buscar a redução tarifária, o governo errou na dose ao determinar o valor de geração, cujo corte não foi compensado pelas indenizações. “Cair de R$ 80,00 para R$ 9,00 o MWh, por exemplo no caso da UHE Três Irmãos da Cesp, foi muito drástico”, pondera.
Competitividade e crescimento
A medida adotada pelo governo responde à reivindicação do setor produtivo e foi comemorada. Para o presidente executivo da Abrace (Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres), Paulo Pedrosa, “resultado (da nova lei) é que os consumidores vão economizar algo próximo a R$ 20 bilhões em suas contas em 2013.” Ele lembra que há alterações positivas também para os clientes do mercado livre, que usufruirão menores taxa de transmissão e distribuição. Para esses, afirma, as contas cairão entre 9% e 16%.
De acordo com Pedrosa, a diminuição da tarifa certamente se traduzirá em desenvolvimento. “Estudos do ‘Projeto Energia Competitiva’ mostram que, em média, cada R$ 1,00 a menos pago pela energia resulta em R$ 8,6 a mais no PIB (Produto Interno Bruto) do País num ciclo de dez anos.” Ainda, informa ele, estimativas da FGV (Fundação Getúlio Vargas) indicam que uma redução média de 20% na tarifa permitirá incremento de 8% na expansão do PIB entre 2013 e 2020, além da criação de 5 milhões de empregos no mesmo período e ampliação de US$ 130 bilhões nas exportações.
Como os preços chegaram às nuvens
A Lei 12.783 recebeu críticas de técnicos com larga experiência no setor elétrico. Sem alterar a regra mercantil que foi imposta ao País nos anos 90 e não completamente modificada pelo modelo implantado a partir de 2004, a nova medida, além de penalizar as geradoras estatais, afirmam, não mexe nas raízes do problema que levou a tarifa de energia no Brasil às alturas. Entre os motivos para tanto, Carlos Kirchner, diretor do SEESP, aponta a manutenção de uma das disfunções criadas no modelo de privatização: o self-dealing. Por esse mecanismo, as distribuidoras podiam contratar, sem licitação, energia mais cara de geradoras do grupo econômico ao qual pertenciam, deixando de adquirir o insumo das estatais que ofereciam preços melhores. Pesquisa feita pelo engenheiro e publicada no livro de sua autoria, intitulado “Malogro no setor elétrico” (Seesp, 2005), demonstra a gravidade da situação. A AES Eletropaulo, por exemplo, abriu mão do preço de R$ 78,30/MWh da Cesp e optou por pagar R$ 109,94 à AES Tietê.
Outro grave fator foram os reajustes acima da inflação, calculados pelo IGP-M (Índice Geral de Preços do Mercado). Segundo Roberto D´Araújo, diretor do Ilumina (Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Energético), entre 1995 – ano que marca o processo de privatização no setor – e 2010, o aumento real para o consumidor residencial atingiu 75%; para a indústria, astronômicos 135%.
Por fim, o modelo privatista também trouxe as inúmeras taxas setoriais que, conforme estudo da Firjam (Federação das Indústrias do Rio de Janeiro), respondem por 17% da tarifa final.