OPINIÃO | |
A Alca (Área de Livre Comércio das Américas), com início previsto para 1999, define a estratégia hegemônica dos Estados Unidos para a região, com impactos sobre os planos de integração do Mercosul. Um deles é o fato de que tem causado controvérsias entre os seus dois maiores parceiros, Brasil e Argentina. Os países do Mercosul têm feito grandes investimentos em setores de infra-estrutura, como transporte e energia. A rodovia do Mercosul, o gasoduto Brasil-Bolívia e a ferrovia Ferronorte são alguns exemplos. Esses investimentos são essenciais para ampliar a competitividade de produtos comercializáveis, como soja, cana de açúcar, têxteis, combustíveis, minérios etc. Uma real possibilidade de integração física e econômica desses países está sendo explorada por meio da navegação na Bacia do Prata, cuja densa malha hídrica permite o escoamento de produtos desde a cidade brasileira de Cáceres (MS) até Nueva Palmira, no Uruguai. Denominada Hidrovia do Mercosul, integrará Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Bolívia e um mercado com mais de 200 milhões de pessoas com renda per capita média anual de US$ 5 mil. Em 1996, foram transportados pelos rios da região 6,7 milhões de toneladas, principalmente de grãos e minérios (soja, ferro, cimento, combustíveis e outros). O principal benefício desse tipo de transporte refere-se à redução do custo do frete, uma vez que o rodoviário custa entre US$ 60 e US$ 90 a tonelada, e o hidroviário de US$ 30 a US$ 50. Por outro lado, organizações ambientais e a comunidade científica nacional e internacional vêm alertando para impactos de ordem social e ambiental decorrentes das obras necessárias à implementação efetiva da hidrovia. Essas obras — dragagens, retificação de curvas, remoção de rochas e balizamento —, avaliadas entre US$ 560 milhões e US$ 1 bilhão, poderão causar perdas irreversíveis ao maior ecossistema do gênero no mundo, o Pantanal. Do ponto de vista econômico, também ocorrem problemas. A produção do setor sucro-alcooleiro do Estado de São Paulo — uma das mais competitivas do mundo — tem impactado a produção da Província de Tucumã na Argentina, grande geradora de empregos no setor, obrigando o governo daquele país a estabelecer restrições à importação do açúcar brasileiro, alegando subsídios via Proálcool. Em contrapartida, o Brasil, que era grande produtor de algodão, passou a importá-lo da Argentina a partir de 1992, devido à eliminação de taxas, chegando a conta de importação desse produto a alcançar a marca anual de US$ 648 milhões. Assim, essa integração, da forma como vem sendo conduzida, tem trazido expressivos impactos sobre determinadas localidades, alterando atividades produtivas, ocasionando desemprego, com conseqüente agravamento de questões sociais e de impactos ambientais; pois, não basta simplesmente estabelecer-se uma zona de livre comércio e investir em infra-estrutura; a etapa anterior deve ser a de planejamento macrorregional, tendo a Bacia do Prata como unidade territorial. Os exemplos aqui apontados e outros mais evidenciam que chegou a hora dos países do Cone Sul atuarem como parceiros de fato, acordando diretrizes comuns no âmbito econômico, social e ambiental, para buscar o desenvolvimento sustentável para o Mercosul. Sueli do Carmo Bettine – engenheira civil, mestre em Hidráulica e Saneamento pela Escola de Engenharia da USP de São Carlos e professora adjunta da Faculdade de Ciências Tecnológicas da PUC - Campinas (Pontifícia Universidade Católica de Campinas). Antônio Carlos Demanboro – engenheiro civil, mestre em Planejamento de Sistemas Energéticos pela Unicamp (Universidade de Campinas) e diretor técnico da OSR - Projetos e Construções.
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