ECONOMIA


Crise atinge siderúrgicas paulistas

A Cosipa anunciou planos para recuperar a empresa. Já a Villares optou por conceder férias coletivas na Usina de Mogi e rever os turnos de produção nas demais unidades industriais.

"A crise da economia mundial, que também atinge as atividades produtivas no Brasil, vem afetando seriamente o comércio internacional de aço, com reflexos imediatos no processo operacional das Usinas Siderúrgicas." A notícia dada pela diretoria da Cosipa (Companhia Siderúrgica Paulista) foi confirmada pela Aços Villares, demonstrando a situação das empresas paulistas do setor. A última delas divulgou o seguinte comentário sobre o seu desempenho no terceiro trimestre de 1998: "O mercado de atuação da companhia tem forte correlação com o desempenho da indústria automobilística local, através do segmento de autopeças, com exceção dos cilindros para laminação, basicamente destinados à siderúrgica. O clima de incertezas decorrente da crise das economias asiática e russa e seus efeitos nos mercados internacionais forçaram a elevação das taxas de juros internas a partir do mês de agosto, com impacto na demanda da indústria automobilística, e mais de imediato no segmento de veículos leves."

Segundo garantiu Valmir Scarpare Esteves, do Departamento de Relações com o Mercado da Villares, apesar do exposto, não houve redução de pessoal em função disso, e vem sendo implantado desde 1995 um plano de investimentos que irá até o ano 2000. A alternativa encontrada pela companhia para adequar seus níveis de produção, face à retração verificada em setembro de 1998, foi conceder dez dias de férias coletivas na Usina de Mogi das Cruzes a partir de 5 de outubro e rever os turnos de produção nas demais unidades industriais. Devido aos fatores conjunturais, a Aços Villares obteve resultado negativo em R$ 15 milhões naquele trimestre, comparativamente a R$ 8,9 mi no anterior.

Quanto à Cosipa, após informar a situação atual, em uma fatídica sexta-feira 13 de novembro último, ela surpreendeu seus funcionários, em especial porque simultaneamente houve o anúncio de uma série de determinações com influência direta sobre o seu emprego. Segundo a companhia, tais decisões objetivavam "enfrentar a conjuntura difícil de forma a assegurar o atendimento de nossos clientes com plenitude e qualidade, manter nossa expressiva participação no mercado interno e buscar novas oportunidades para contornar a crise externa". Entre elas, estavam inseridos a desativação da linha 1 de produção de aço a partir de janeiro de 1999, uma reestruturação patrimonial, econômica, societária e financeira, bem como a abertura de um Programa de Demissão Incentivada. O plano abrangeu todos os trabalhadores, afastados e detentores de estabilidade, inclusive em licença-maternidade e amamentação, embora a alegação fosse de que objetivava o enquadramento dos pré-aposentáveis – 75% dos inseridos. Conseqüentemente, o programa terminou com 1.326 adesões, feitas até a data-limite de 27 de novembro último, sendo 47 dessas por engenheiros, os quais totalizam atualmente 467, incluindo os terceirizados (115). O desligamento está previsto para ocorrer nos próximos três meses. E há dúvidas se a empresa vai parar por aí. Embora assegure não haver nenhuma perspectiva de se implementar o corte de funcionários, seu superintendente de Comunicação, Marcelo D'Ângelo, deixou claro que "a posição da Cosipa é de análise de qualquer hipótese de redução de custos sobre competitividade".

Mobilizações e pressões

Os representantes dos trabalhadores tentaram inutilmente negociar com a empresa planos para evitar as demissões e compor melhor o incentivo – o trabalhador inscrito receberá, além das verbas rescisórias, 30% do salário-base por ano, limitados a seis; assistência médica e seguro de vida em grupo por seis meses após o desligamento, mais adicional aos aposentáveis, variável conforme tempo de serviço. O SEESP e o Sindicato dos Metalúrgicos promoveram assembléias em conjunto, muitas delas resultando em atos e passeatas. Também foram feitas mobilizações junto às Prefeituras Municipais e Câmaras – as quais, inclusive, fecharam suas portas por um dia em protesto contra dispensas na Cosipa. Além disso, deputados pressionaram a diretoria da companhia, uma das grandes geradoras de recursos e emprego da Baixada Santista.

E ainda, o SEESP reuniu-se com os secretários de Estado da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento, Flávio Fava de Moraes, e do Trabalho, José Luiz Ricca, para tentar reverter o quadro, sem obter êxito. O primeiro deles demonstrou estar ciente da importância daquela companhia para a região. Contudo, por intermédio de sua Assessoria de Comunicação, informou que seu papel nesse encontro foi de auxiliar em um diálogo, uma vez que o Estado não assume postura quanto às siderúrgicas, pois "a empresa privada é livre para tomar suas próprias decisões".

A luta na Cosipa culminou com um levante geral na região em prol do emprego. O ato de protesto, realizado em 15 de dezembro último, teve o envolvimento de todos os sindicatos locais, câmaras municipais, prefeitos, parlamentares e partidos de esquerda e reuniu aproximadamente mil manifestantes – o equivalente a 30 mil em São Paulo. Esse movimento originou a criação de uma comissão para estudar, junto aos órgãos governamentais, ações de modo a evitar o desemprego na Baixada Santista.

Cisão na Cosipa

Não bastasse o Programa de Demissão Incentivada, a Cosipa apresentou, juntamente, um plano de cisão visando recuperar a empresa, em princípio falindo. O Sindicato dos Metalúrgicos e o SEESP estiveram, na própria sexta-feira 13 (novembro último), reunidos com a diretoria e a presidência da companhia visando o entendimento sobre o assunto e o que iria ocorrer posteriormente. Os argumentos da empresa tiveram como premissas a necessidade de reestruturação da Cosipa, face a sua dívida estar na faixa de US$ 2,4 bi, embora tenha obtido bons resultados operacionais, visto haver quebrado recordes de produção; ser essa a única siderúrgica cujo débito não foi pago pelo governo, como o fez nas demais do extinto grupo Siderbrás; elevação da taxa de juros, maiores que seu investimento; e o fato da companhia não possuir 100% do processo de fabricação em lingotamento contínuo, o que onera o custo de manufatura. "No ano de 1998, a crise se agravou de maneira gritante, especialmente no tocante às exportações, a que a empresa destina 45% de sua produção. Os preços se degradaram de maneira abismal e a reestruturação hoje é condição quase obrigatória de sobrevivência", declarou D'Ângelo. Conforme informou ele, em decorrência disso, vem sendo feito tal ajuste para "preparar a Cosipa ao futuro", de modo que no ano 2001 ela seja a "maior produtora de aços laminados planos do Conesul".

Dependência empresarial

Na realidade, a situação na Cosipa agravou-se desde que a empresa foi privatizada. Antes, integravam seu quadro de pessoal 12 mil funcionários. Hoje, há 7.500. Após cinco anos da desestatização, sua dívida aumentou em quase 100%, passando de U$ 1,3 bi para os atuais US$ 2,4 bi (conforme sua Assessoria de Comunicação, devido à explosão de juros). Visando "salvar" a companhia, o único acionista que dispunha de capital, a Usiminas, injetou R$ 1 bi, levando o porto – entrada e saída de insumos e produtos acabados –, uma fábrica de oxigênio e o gás que alimentará a futura central termoelétrica da usina, os quais serão terceirizados para venda à Cosipa. Assim, questões estratégicas deixaram de ser dessa companhia, instaurando-se dependência empresarial.

A proposta foi a criação da "nova Cosipa", a qual, na visão de seus dirigentes, com uma dívida menor, pode captar recursos ao investimento em modernização da linha 1, que está sendo desativada. O grupo Usiminas-Cosipa teria a capacidade de produção de 9 milhões de toneladas, tornando-se o mais forte da América Latina. Essa solução foi apresentada pelo Banco Fleming/Graphus, dois escritórios de advocacia, Price Westinghouse e Busalem, que estudaram o assunto por mais de dez meses, em sigilo absoluto.

Está sendo feito novo investimento para modernização na faixa de R$ 500 milhões (o antigo foi de R$ 691 milhões, sem sucesso, pois não houve um plano de recursos de longo prazo para saldar a dívida). Para o presidente da Desibas (Delegacia Sindical do SEESP na Baixada Santista), Newton Guenaga, alguns questionamentos são suscitados: "Será que daqui a cinco anos não estaremos novamente com uma dívida enorme e a Usiminas virá 'salvar' a Cosipa, levando em troca mais equipamentos seus e assim sucessivamente, até a sua total extinção? Isso é bom para o Estado de São Paulo, já que a sede daquela siderúrgica é em Minas Gerais?" A resposta é dada por Marcelo D'Ângelo: "A CST e a Acesita foram vendidas para os franceses, sem nenhuma perda para os estados. O mesmo ocorre nesse caso. A velha Cosipa é uma empresa descapitalizada, e o grupo vai poder expandir, dar uma injeção de investimentos em São Paulo."

Na opinião de Guenaga, o fato é que há muitos pontos obscuros, quiçá até obtusos sobre o tema, e os reais interesses são desconhecidos. "Uma certeza já foi demonstrada. A preocupação com a geração de empregos na região e com os profissionais é inexistente. Oxalá serem esses exemplos um caso isolado, mas são os caminhos das privatizações e do capital neoliberal, sem sequer se preocupar com o social. A mancha contra o desemprego e arranjos do capital precisam aumentar, e a Baixada Santista já deu o primeiro passo", concluiu o presidente da Desibas.

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