MERCADO DE TRABALHO | ||
Dados preliminares do Ministério da Educação e Cultura apontam para 13.245 graduandos no ano de 1999 em todo o País, nos cursos de Engenharia Civil, Elétrica, Mecânica e Química; apenas no Estado de São Paulo serão 4.745, isso sem considerar as outras 41 modalidades nessa área, cujos números não estão disponíveis no MEC. Esses futuros engenheiros logo estarão habilitados a enfrentar o mercado de trabalho, num quadro pouco alentador. Prova disso é a taxa de desemprego medida pela Pesquisa de Emprego e Desemprego na Grande São Paulo, que demonstra salto de 10,3% em 1990 para cerca de 18% em 1998. Não bastasse isso, as previsões econômicas indicam recessão para este ano (ver matéria nas páginas 6, 7 e 8). Mercado difícil Formado pela Universidade Mackenzie em Engenharia Civil no ano de 1997, Guilhermo Coelho Loza enfrenta as dificuldades típicas de quem entra no mercado de trabalho em plena crise ascendente. Desempregado há nove meses, ele estagiou durante os três últimos anos da faculdade em uma empreiteira especializada em concreto protendido, sendo efetivado como engenheiro de produção com um salário de R$ 1.000,00. Seis meses mais tarde, assim que concluiu o curso, já ganhando R$ 1.200,00, foi demitido. "Eles alegaram que não tinham muitas obras e começaram a diminuir os gastos." Nesse processo, a empresa optou pela sua dispensa e ficou com um estagiário para o lugar. "Achavam que só sua permanência daria conta do serviço e não havia necessidade de pagar um salário para um engenheiro", contou. Agora, ele se depara com a exigência do mercado de, no mínimo, um ano de experiência com registro em carteira. "Os anos de estágio não valem, além disso a empresa desenvolvia um trabalho especializado, não tão comum no mercado, e é a minha única experiência", lamentou. Como nesse período ele enviou 100 currículos e viu apenas um anúncio de emprego para engenheiro especializado em concreto protendido, já pretende se preparar em outros ramos da Engenharia Civil. Para isso, a idéia é a pós-graduação. "Só não o faço agora porque não tenho como pagar. Na USP, um curso de dois anos custa aproximadamente R$ 400,00 por mês. Se estivesse trabalhando, talvez pudesse fazê-lo." Além da vontade de se qualificar, Loza sabe que, na corrida pelos minguados empregos à disposição, isso conta pontos. "Nas entrevistas, eles perguntam se você não pensa em estudar no futuro", constatou. Apesar das dificuldades, predomina a vontade de vencer. "A cada dia que passa, sinto-me mais desesperado, mas também sei que não posso perder o pique, afinal foram cinco anos para me formar e não vou jogar para o alto. E talvez as coisas estejam melhorando, neste começo de ano fui chamado para várias entrevistas." Barco furado Engenheiro civil formado em 1997 pela Unesp-Guaratinguetá (Universidade Estadual Paulista), Cayo Júlio Freire Júnior está no time dos que encontram dificuldades. Ele fez estágio durante quatro meses, trabalhou em uma imobiliária e só em agosto último conseguiu um emprego como engenheiro em uma obra da Cohab, através da Habitat, uma empresa terceirizada que dá assessoria técnica aos mutirões. Exerceu a função por quatro meses sem receber qualquer pagamento, e saiu em dezembro último. "Atendi 408 famílias e só depois fui descobrir que era uma jogada. Agora, estou tentando resolver a questão judicialmente, por meio do Departamento Jurídico do SEESP." Desempregado, Freire acabou entrando em outra armação. "Fui procurar um emprego acreditando ser uma vaga para engenheiro e quando cheguei ao local — uma agência localizada em Pinheiros, na Capital — disseram-me que tinha que pagar R$ 90,00 para colocar meu currículo na Internet." Ele credita parte das dificuldades à faculdade, por não preparar melhor os alunos ao mercado de trabalho. "Faltou um curso de inglês ou espanhol, coisas paupáveis, não apenas teoria", reclamou. Para se qualificar, segundo informou, haveria até opções gratuitas, como um curso na área de eletricidade. "Mas não vou ter dinheiro para o ônibus", confessou. Apesar da maré brava, o engenheiro continua tendo fé na profissão e recusou cinco ofertas para assinar plantas esboçadas, cujo único objetivo era garantir alvará para construção junto à Prefeitura. "Meus amigos me aconselharam a aceitar, mas não vou me submeter a isso", assegurou. Bons ventos Em 1997, Cristiano Napoleone formou-se na Faculdade de Engenharia Civil da Unesp e amargou seis meses desempregado antes de ter a primeira oportunidade. Começou a trabalhar numa empresa de gerenciamento de projetos em julho do ano passado, quando já estava aguardando uma vaga na Sabesp, garantida pela aprovação em concurso público. Foi chamado no mês seguinte e efetivado em setembro para lidar com manutenção de adutores e interceptores. Embora o salário seja o mesmo — R$ 1.300,00 —, a nova ocupação aproxima-se mais de seu curso de pós-graduação em Gestão Ambiental, na Unicamp. "Além disso, o outro era pouco estável, o que me inclinou a ir para a Sabesp", considerou. Napoleone acredita que ajudaram na disputa por uma vaga os estágios que fez nos últimos três anos de graduação, quando passou por duas empresas. "Isso me deu mais segurança, até para enfrentar as entrevistas no processo seletivo." Também está a seu favor o fato de, assim que terminou a faculdade, ter ingressado na pós-graduação. "O curso custava R$ 5.000,00, mas eu consegui uma bolsa de 50% e parcelamento em dez vezes do restante." Aguardando resposta para duas novas propostas de emprego na iniciativa privada, ele vê a qualificação como fator preponderante. Com os ventos soprando a seu favor, recomenda aos colegas que estão encontrando dificuldades investir nos contatos. "Comprar o jornal de domingo e recortar anúncios é um método ultrapassado, o melhor é buscar uma colocação com professores, amigos engenheiros, entidades de classe como o SEESP, Internet e até em quadro de avisos." Falhas na avaliação Eduardo Pinheiro de Souza, formado no ano de 1997 em Engenharia Química pela Escola Politécnica da USP, fez o Programa de Estágio do Grupo Ultra, que lhe garantiu a efetivação em janeiro de 1998 como analista econômico-financeiro pleno, já promovido a sênior, com um salário de R$ 2.000,00. Convidado a participar da seleção de novos estagiários, o profissional percebeu nos candidatos falhas na avaliação das questões que envolvem um planejamento de carreira, emprego e vocação. "Eles precisam conhecer a realidade e não imaginar que tudo é maravilhoso. Uma empresa tem vários tipos de pessoas trabalhando, não só as ideais. Há processos antigos e modernos, é necessário saber que quando aparece um problema é uma oportunidade para se inovar." Segundo Souza, na hora da seleção essa percepção entra em jogo, porque a busca é por pessoas que saibam lidar com essas variáveis. Na sua opinião, o estágio na escola é a melhor ferramenta para essa preparação ao mercado de trabalho. "Mas se manter informado, com a leitura de jornais e revistas, ajuda a entender o que se passa no mundo e formar opinião." Além disso, ele acredita que a participação no Grêmio Politécnico, do qual foi secretário geral, tesoureiro e vice-presidente, auxiliou-o a entender uma organização e aprender a tomar decisões. Formação tardia José Tibúrcio Braga, engenheiro industrial mecânico, formado pela Faculdade Brás Cubas em 1994, é um caso atípico entre os novos candidatos ao mercado, pois tem 50 anos. Tecnólogo, ele ambicionava ocupar o cargo de engenheiro de processos na empresa em que trabalhava, daí a disposição em voltar aos bancos escolares na meia idade. Para sua decepção, quando concluiu o curso, a empresa extinguiu a vaga pretendida. Desde então, teve um único emprego no setor, e só conseguiu subempregos, que lhe renderam salários de R$ 800,00, como na última firma em que atuou, de onde saiu em dezembro último. Como era de se esperar, ao pouco tempo de profissão soma-se contra Tibúrcio a idade, mesmo já tendo experiência em uma área próxima. "Parece que o conhecimento que acumulei não serve para nada", indignou-se.
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