Analisados 100 canteiros de obras inicialmente em 12
estados do Brasil, incluindo São Paulo, constatou-se o tamanho do
desperdício na construção civil: em média, gastam-se em reais 3% a 8%
a mais em material do que o necessário em função das perdas, tanto
incorporadas na própria edificação – 2/3 desse volume – quanto sob
a forma de entulho. Esse foi o resultado da pesquisa intitulada
"Alternativas para a redução de desperdício de materiais nos
canteiros de obras", efetuada sob a coordenação técnica do PCC-USP
(Poli Construção Civil da USP), com a participação do ITQC (Instituto
Brasileiro de Tecnologia e Qualidade na Construção Civil), da Finep
(Financiadora de Estudos e Projetos do Ministério da Ciência e
Tecnologia), do Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e de
mais 15 universidades. "O mercado está muito competitivo e não se
consegue repassar essa perda para o consumidor final. Portanto, para uma
empresa construtora, acabar com esse desperdício pode significar dobrar o
lucro", enfatizou o professor Ubiraci Espineill Lemos de Souza, do
Departamento de Engenharia da Construção Civil da Escola Politécnica da
USP, um dos responsáveis pelo estudo que pretendeu, na primeira etapa, de
1996 a 1999, apresentar um diagnóstico para o setor. Ainda segundo ele,
tal perda representa algo superior a 200 quilos de material por metro
quadrado construído, um pouco mais de 20% do peso teoricamente
necessário para a obra, e o que mais se perde é argamassa, concreto,
aço, blocos, cerâmica, gesso e madeira.
A pesquisa feita não teve a premissa de fazer uma distinção por região
para saber em que parte do País o desperdício é maior, até porque, de
acordo com Souza, a construção civil é marcada pela variabilidade.
"Dentro dos estados mais desenvolvidos, você encontra desde uma
empresa com desempenho excelente, comparável às melhores internacionais,
até outra muito ruim. Em quantidade, não em reais, tivemos empresas que
perderam 3% dos seus blocos e outras, 48%. E embora tenham algumas piores,
o conjunto analisado é de boas construtoras brasileiras. Se formos
avaliar o mercado informal – a reforminha, o puxadinho, a
autoconstrução –, o qual representa 2/3 da construção civil, o
desperdício é muito maior." Vahan Agopyan, vice-diretor da Poli que
também participou do estudo, afirmou que em obras cuja alvenaria era
mal-feita, ao se tentar corrigir isso, a perda incorporada de argamassa
chegava a 80%, e onde precisava ter uma camada de 1cm dessa havia até de
3 ou 4cm.
CAUSAS E SOLUÇÕES
Conforme Souza, várias são as causas do desperdício. "Uma de suas
origens está na concepção, melhorar o projeto é um dos caminhos
importantes para reduzir perdas. Outra na aquisição de materiais, que
deve ser técnica e não apenas pelo preço da unidade. O envolvimento do
engenheiro nesse ponto é fundamental. Ajuda muito ainda ter uma
programação correta de quanto se consumirá de cada material. Tem
também os cuidados relativos à estocagem e à movimentação. Ambos
dizem respeito ao projeto do canteiro de obras, algo em que até hoje se
investiu muito pouco e talvez seja o diferencial para as empresas. Quando
tem-se um bem-definido, o trabalho a ser feito é o de ensinar as pessoas
a seguirem o que já foi pensado. Aliás, ter equipamentos adequados e
operários treinados e motivados é imprescindível. Ou seja, a gestão na
obra é essencial, precisamos ter o engenheiro assumindo seu papel, estar
diariamente, se possível boa parte do tempo, tomando decisões no local,
e não apenas ser responsável legalmente, no papel", destacou.
Solução especificamente para a questão do entulho é apresentada pelo
pesquisador e doutorando do Departamento de Construção Civil da Poli,
Sérgio Eduardo Zordan. "A primeira possibilidade é de as empresas
reaproveitarem o material na própria obra. Mas, para isso, teria que
haver um gerenciamento de resíduos", explicou. Ainda de acordo com
ele, o princípio é o mesmo da coleta seletiva de lixo: separa-se o
inorgânico (restos de tijolo, cal, terra), o qual poderia ser usado no
local, da parte a ser vendida para sucatas ou repassada a catadores ou
olarias. Segundo o pesquisador, viabilidade técnica existe para, por
exemplo, a reutilização em pisos de regularização de pavimentos,
preparando-se uma massa, como enchimento ou para fazer aterro na obra.
"Uma construtora pequena no Paraná aproveitou tudo o que produziu.
É possível não gerar nenhum entulho", concluiu.
CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL
Na visão de Agopyan, o ponto chave é evitar produzir tais resíduos,
que, em certas regiões, inclusive em São Paulo, são superiores ao lixo
urbano. "Na construção, consegue-se diminuir bem, otimizando-a,
melhorando os processos adotados e a gestão do canteiro. Porém, tem as
frações provenientes da reconstrução e reforma e da demolição, mais
difíceis de ser controladas", considerou. Para resolver o problema,
conforme o vice-diretor, o CIB (International Council for Research and
Innovation in Building and Construction) – que congrega mundialmente
especialistas de organizações ativas em pesquisas na área –, as
escolas e entidades de Engenharia e Arquitetura estão advogando que, ao
se projetar uma edificação qualquer, já seja feita uma previsão de
reaproveitamento dos materiais utilizados na mesma ou em outra obra,
reduzindo a agressão ao meio ambiente. "A idéia foi lançada no ano
passado na Agenda XXI para a Construção Sustentável, e é a
tendência." Agopyan avisou: "E se não avançarmos até 2010 ou
2020, vamos chegar ao colapso, não teremos mais matérias-primas para a
construção."
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