SEM CONCLUSÕES QUANTO À P-36, PAIRAM DÚVIDAS 
SOBRE SEGURANÇA DA PETROBRÁS

Há um mês, o País pergunta-se perplexo de quem é a responsabilidade pelo acidente ocorrido em 15 de março, que culminou com o afundamento da P-36 e 11 vítimas fatais. Aparentemente, a única conclusão até agora é que a Petrobrás não vem recebendo o cuidado devido. Membro de uma comissão externa pluripartidária composta por 20 parlamentares para analisar as causas do acidente com a P-36, bem como a situação geral das demais plataformas, o deputado federal Luciano Zica (PT-SP) entrou no dia 11 último com uma representação no Ministério Público em Brasília contra a ANP (Agência Nacional de Petróleo) por "crime de omissão". Segundo ele, a ANP tem como uma de suas atribuições fiscalizar as plataformas de petróleo, mas nunca o fez, embora tenha recursos para tanto. Nenhum dos seus diretores havia se pronunciado sobre o assunto até o fechamento desta edição.

A Petrobrás tem atualmente 94 plataformas em operação, sendo 69 fixas e 25 flutuantes. Do total, 41 situam-se na Bacia de Campos, onde estava a P-36. Embora sua atividade seja potencialmente de risco, impedir manchas como essa no mar e na imagem da empresa é fundamental. O professor da Coppe/UFRJ (Coordenação de Programas de Pós-graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro), Segen Estefen, dá a receita: "Cada plataforma tem uma planta distinta, dificilmente se acharão duas idênticas. É necessário realizar análise de risco em cada uma delas para ver quais são os pontos vulneráveis. A Petrobrás precisa efetuar grande investimento em automação e controle." Irani Carlos Varella, gerente executivo de Segurança, Meio Ambiente e Saúde da companhia, assegurou que a manutenção em plataformas é feita diariamente "pela própria equipe local". Medida que, pelos últimos acontecimentos, não parece suficiente.

A sucessão de episódios alcançou tal monta que o presidente da Aepet (Associação dos Engenheiros da Petrobrás), Fernando Siqueira, não descarta a hipótese de sabotagem "pelos defensores da privatização". "Acidentes podem levar a uma depreciação da imagem da empresa e à aceitação do seu desmonte." E foram diversos nos últimos dois anos. Além dos propalados desastres ambientais que mancharam o nome da Petrobrás em 2000, neste ano, de janeiro até agora, constam, além do ocorrido com a P-36, outros vazamentos de gás em menor proporção, como os nas plataformas de Namorado I e P-37 – nesse último, o saldo foi de duas vítimas fatais, ambos prestadores de serviços.

No rol dos descuidos com a petroleira, aliás, está também a terceirização. Atualmente, segundo o gerente da Petrobrás, 2/3 dos 34.320 profissionais que atuam junto à companhia encontram-se nessa situação – na Bacia de Campos, onde trabalham 6.900 deles, a proporção se mantém. "E os treinamentos, inclusive os de salvatagem (de combate a incêndio e segurança), são terceirizados", complementou Zica. Varella nega e assegura que essa preparação é feita internamente. Apesar de salientar que a contratação não abrange "áreas essenciais", ele admite haver engenheiros e demais profissionais especializados entre os prestadores de serviços.

O vice-presidente do SEESP e engenheiro de Segurança do Trabalho, Celso Atienza, apontou a necessidade de a Petrobrás "assumir suas responsabilidades" e implantar política de condições de trabalho. "No caso da P-36, houve desleixo, omissão e negligência", acredita. No dia 20 próximo, a comissão de sindicância instalada para apurar as causas desse acidente deve apresentar suas conclusões ou, no mínimo, segundo Varella, hipóteses mais prováveis de suas causas. Ele afirmou ainda haver política de segurança "que segue padrões internacionalmente aceitos" e estarem sendo investidos US$ 1 bilhão até 2003 nessa área e em meio ambiente.


TRAGÉDIA INEXPLICADA
A plataforma flutuante, avariada por três explosões devido a um vazamento de gás, era a maior do mundo em capacidade de produção – 180 mil barris por dia provenientes de 21 poços submarinos. Segundo o professor da Coppe/UFRJ, Estefen, uma das prováveis causas da primeira explosão é o fato de que o tanque de resíduos estava dentro da coluna. "Se isso se confirmar, configurar-se-á uma má-prática da Engenharia. Esse tipo de acidente (vazamento) pode acontecer numa plataforma de produção de petróleo, mas não numa região como aquela. Além de ocorrer em local crítico, foi detectado problema na válvula de alívio dessa pressão. Houve explosão porque o gás armazenado ali não teve como sair. Isso, contudo, não justificaria seu afundamento. Devemos ter compartimentos estanques para que a água não entre em todos os espaços. Ao que parece, não teve essa reserva de flutuabilidade e portanto a plataforma veio a pique. Geralmente, grandes desastres são originados por causas várias que se conjugam num determinado momento. Esses problemas deveriam ser verificados na fase de projeto e construção, na análise posterior e, por fim, na operação e manutenção."

Construída na Itália, a P-36 sofreu adequações em seu projeto no Canadá, com o objetivo de torná-la produtora de petróleo. Para Zica, tal transformação pode trazer problemas sérios se não forem respeitadas normas óbvias de segurança e houver "atropelo" na pré-operação – período de análise cuja duração normalmente é de cerca de dez meses. Ambas as situações adversas ocorreram nesse caso. "Na pressa de botá-la em funcionamento para atender à política de exploração predatória adotada pelo Governo, visando a auto-suficiência da Petrobrás, essa análise foi feita em apenas metade do tempo necessário e as adaptações foram mal-projetadas", confirmou.

Fernando Siqueira concorda e aponta outra agravante: o fato de essa avaliação ter sido feita no exterior, "sem o acompanhamento devido". Varella refutou as afirmações. "Grande quantidade das plataformas flutuantes de produção no Brasil e no mundo são adaptadas. Não há nenhum risco nisso. E a equipe que esteve no Canadá é de altíssimo nível. Ninguém coloca em operação uma estrutura como essa se não houver mínimas condições de segurança." Resta, então, a pergunta: o que terá saído errado?

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