NOVAS ÊNFASES PARA A UNIVERSIDADE PÚBLICA

Até a sua expulsão, em meados do século XVIII, no Brasil somente se estudava em colégios jesuítas. Toda a elite intelectual da colônia passou por essas escolas confessionais. Os raros brasileiros que queriam e lograram ir adiante nos estudos precisaram sair do País, para freqüentar escolas superiores em Portugal ou outros lugares. No século XIX, começaram a se instalar as faculdades de Direito, Medicina e Engenharia. O doutor formado em escolas brasileiras tornou-se figura proeminente na vida intelectual, econômica e política do Império.

O século XX assistiu o advento das uni­versidades públicas. Porém, a for­mação de doutores, os futuros pesqui­sadores e pro­fessores do ensino supe­rior, ainda depen­dia dos interes­sados partirem para o exte­rior por sua conta e risco. A partir da fun­dação do CNPq, na década de 50, come­çou um movi­mento sistemático de envio de doutores a universidades no exterior, assim como sua formação nessas instituições.

Ao final, o século passado assistiu a uma verdadeira explosão do ensino superior de graduação privado. Hoje, não é me­nor que 70% a participação das escolas particula­res na formação de profissionais no terceiro grau. Claramente, o ensino supe­rior para a maioria dos graduados não mais depende da universidade pública.

O papel do setor privado na transmissão do conhecimento existente parece consoli­dado. Será por isso que se esgotou o papel da universidade pública na liderança da formação dos recursos humanos de alta qualidade no País? Parece que não.

A competitividade de empresas e o pro­gresso social cada vez mais dependem de quadros intelectuais preparados para aplicar a moderna cultura científica aos problemas econômicos e sociais do País. Quando se chega próximo à fron­teira científica e se necessitam muitos qua­dros, só resta a alternativa de sua forma­ção no Brasil. É preciso ter qua­dros pre­parados para fazer a pesquisa científica de qualidade e o desenvol­vi­mento tec­nológico competitivo que a realidade atual exige. E a contribuição privada à formação de doutores e pesquisadores ainda é muito modesta. Por outro lado, com algumas exceções honrosas, a qualidade do ensino de graduação tem sido muito melhor na faculdade pública que na privada.

Com isso, desenham-se novas ênfases para a universidade pública brasileira. A formação de doutores e pesquisadores passa a ter um papel que, pelo seu enor­me custo e pela qualidade exigida, é hoje fundamental. De passagem, refor­ça-se a reali­zação de pesquisa científica e tecnológi­ca, haja visto que esses qua­dros só podem ser formados pela práti­ca. Ninguém vira doutor ou pesquisador sem fazer pesquisa científica. Na gra­duação, caberá à univer­sidade pública sinalizar o nível de quali­dade possível. Exigir que ele seja alcan­çado no setor privado dependerá da co­brança do mer­cado e da regulamenta­ção pública do en­sino privado, a exemplo do provão.

Mesmo no ensino profissional, hoje ca­da vez mais é essencial a formação con­tinuada. O profissional não pode mais contentar-se com o curso de graduação. Precisa complementar a sua formação com mestrados profissionalizantes, MBAs e outros cursos de extensão. Também aqui há um papel importante a ser desem­penhado pela universidade pública. O de mostrar caminhos e novos cursos neces­sários e indicar a qualidade possível.

Tudo isso enfatiza que o papel da univer­sidade pública continuará sendo o de li­derança na formação dos quadros inte­lectuais mais preparados do País. Não faz sentido ser contra o ensino privado. Talvez em algumas décadas também o setor privado contribua de modo signifi­cativo na formação das lideranças aca­dêmicas e tecnológicas do País. Até lá, oxalá persista a universidade pública no seu papel de formação dessas lideran­ças. Nós, engenheiros, devemos estar na linha de frente da luta pela sua preserva­ção e melhoria contínua.

Eng. Paulo Tromboni de Souza Nascimento
Presidente

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