POLÍTICA NACIONAL DE SANEAMENTO BÁSICO: 
EMENDA SAI PIOR QUE O SONETO

Após meses de discussão em torno do projeto de lei que instituiria a Política Nacional de Saneamento, o relator da comissão especial que analisava os PLs 2.673/00 e 4.147/01, deputado Rodolfo Marinho (PSDB-CE), enviou ao plenário um substitutivo totalmente novo. O texto, de 30 de agosto último, difere conceitualmente das propostas originais e das dezenas de emendas a elas apresentadas. Além de inédita, a proposição foi considerada um retrocesso pelos técnicos do setor.

A emenda, além de se apresentar pior que o soneto, ainda tinha caráter de urgência, o que obrigava sua votação até 14 de setembro ou a pauta do Congresso Nacional ficaria bloqueada. Graças à mobilização das entidades ligadas ao saneamento, em 11 de setembro, decidiu-se que o projeto tramitaria normalmente. O SEESP, por exemplo, enviou aos parlamentares moção aprovada por 400 dirigentes da entidade durante o I Congresso Estadual Trabalho-Integração-Compromisso, realizado em São Pedro entre os dias 31 de agosto e 2 de setembro, reivindicando a mudança nesse regime de tramitação e indicando os problemas do texto de Marinho. Agora, a votação está prevista para 3 de outubro, na Comissão, e no dia 17 do mesmo mês, no plenário. Na última semana de setembro, o Plenário da Câmara se transformará em Comissão Geral para debater o assunto, que promete muita polêmica.  

Titularidade
Um dos pomos de discórdia será a titularidade do serviço. Nas regiões metropolitanas, o abastecimento de água e esgoto sanitário está a cargo do Estado há anos. Essa forma de gestão, segundo José Soares Pimentel, diretor do SEESP, tem propiciado o subsídio cruzado, possibilitando a busca da universalização. Ou seja, as atividades mais rentáveis propiciam o investimento nas mais onerosas. Diferentemente, o substitutivo do relator admite a titularidade partilhada do sistema de água e esgoto, fragmentando-o em nada menos que dez etapas, o que eliminará essa compensação. Além disso, propõe concessões por áreas delimitadas, o que pode deixar sem atendimento os locais mais carentes. “Esse modelo de fragmentação representa um retrocesso de pelo menos 30 anos”, lastima Pimentel. “Isso faz com que não se pense saneamento e tratamento como um todo, mas como coisas estanques”, critica Manuel Carlos de Moraes Guerra, outro diretor do SEESP.

Na sua opinião, o Estado deveria ficar com a titularidade nas regiões metropolitanas de uso comum. Essa, por sinal, tem sido a posição defendida pelo SEESP, que também propugna a existência de um conselho deliberativo para que os municípios decidam juntamente com o Estado sobre as necessidades da região. Ainda segundo essa lógica, processos de concessão ou terceirização demandariam decisão unânime dos municípios, definida em projetos de lei. “Lamentavelmente, o substitutivo diz que a titularidade é do município”, comenta Guerra. Na  avaliação de Pimentel, nesse contexto, empresas hoje rentáveis, como a Sabesp, por exemplo, poderiam perder a concessão dos serviços mais vantajosos, que passariam aos próprios municípios ou, pior, a uma companhia privada, sem qualquer compromisso com o interesse público. Sem essa receita, não haveria como investir nas outras áreas e a universalização do serviço estaria comprometida.  

Risco à saúde
Outro ponto apontado por Guerra é que o substitutivo continua não citando resíduos sólidos, drenagem urbana e controle de vetores, considerados importantes no saneamento e vitais à promoção da saúde pública. Segundo dados da OMS (Organização Mundial da Saúde), cada US$ 1 aplicado em saneamento representa economia de aproximadamente US$ 4 gastos com saúde pública. No Brasil, a falta de água potável e coleta de esgoto é responsável  por 80% das doenças e 65% das internações hospitalares.

Se por um lado o serviço público vê-se ameaçado por uma proposta ruim, por outro há o risco de que não se chegue a um consenso e a institucionalização do setor fique para depois das eleições de 2002. “Com isso, ficará adiada a retomada do desenvolvimento do setor”, afirma Pimentel.

Volta