SEU AMIGO, O PEÃO DE OBRA |
Não venha com esse papo arrogante que peões são
como crianças grandes. Peão de obra não é criança e nem tão crescido
assim. Está mais é para o sertanejo, de Euclides da Cunha, também
construtor: é antes de tudo um forte. E pode ser, como aquele, bruto e
meigo e, apesar da coragem, acreditar em assombração. Mesmo subalimentado, é alegre, cordial e respeitador;
sem dinheiro no bolso, é bom companheiro, amigo e humilde. Se você,
engenheiro de obra, é dos que não conseguem se compadecer ou se
desvencilhar dos preconceitos contra os menos favorecidos pela sorte, errou
na escolha da profissão. Principalmente, trate-o com respeito. Todo
relacionamento exige isso. Se você o tratar como “bicho”, ele responderá
com a única reação possível: portando-se como um bicho. Se o agradar, terá um amigo para todas as horas. Ele chegou à obra cedo. Bem antes das 7h, estava na
fila do ponto. Trabalhou pesado e merece um almoço decente. Capriche em sua
refeição. Não há nada que o irrite tanto quanto uma refeição
inadequada. Descubra seus gostos. Lembre-se que não há obra bem tocada se
o refeitório estiver desagradando. Ouça-o e oriente-se com suas críticas. Não há mais
sinceras e precisas. Principalmente se direcionadas à sua própria
administração. Mais que qualquer outro funcionário da empresa, ele saberá
sobre a produtividade da obra, que lhe é filtrada do próprio suor. Os
resultados da obra, aliás, não só dependem, mas são méritos dele. Faça-o
enxergar isso. Impressione-o com camaradagens e humor. O elogio, como
a nenhum outro indivíduo, cai-lhe como uma bênção. Seja mesmo astucioso.
Nessa relação de trabalho, ele nunca irá perceber que, entre os dois,
quem mais precisa do outro é você. Não o amedronte usando sua condição de chefe e
nunca lhe dê ordens diretas, atravessando seu organograma. Saiba que a
firmeza, a liderança, o humor e o caráter do chefe da obra estão entre as
notícias que mais se espalham, e sempre em manchete nas rádios-peões. Não se faça de ocupado para impressioná-lo.
Retribua-lhe seus bons-dias. Afinal, você está em campo, num local de
trabalho arejado, de respeito e educação, e não em um mofado escritório
na Avenida Paulista. O trabalho é pesado, mas não lhe negue. Não há
mais impróprio lugar para rixas e picuinhas que em uma obra. Se quer ser
admirado, não aceite bajuladores em sua sala. Preocupe-se em lhe dar condições
seguras de trabalho e cientificar-lhe disso. Jamais tenha medo do peão, até porque ele não é de
briga e não morde. Além de ofendê-lo gravemente, você perderá
autoridade e respeito. Nesse caso, o insucesso da obra e o seu serão
iminentes. Sobretudo, goste do peão, parte significativa de seu
ofício e que faz por merecer. Sua companhia é agradabilíssima, seu humor
irresistível, e ele dispõe-se, em troca de algum reconhecimento pelo seu
trabalho, a admirá-lo. Eng. Amado Gabriel da Silva |