As
18 medidas de revitalização do
setor elétrico, anunciadas pela Câmara de Gestão da Crise de Energia em 9
de janeiro – acrescidas por mais 15 no dia 1º de fevereiro – deixaram
mais dúvidas que certezas quanto ao futuro energético brasileiro. Duas
delas, que dizem respeito a preço da energia, já foram regulamentadas
pela Portaria 109 da Câmara de Gestão da Crise e as demais seguem ainda
sem valor efetivo — todas estão disponíveis no site
www.energiabrasil.gov.br. Debater essas regras foi o objetivo do seminário
“Avaliação das Mudanças do Setor Elétrico”, promovido
pelo SEESP em 29 de janeiro, com a participação de engenheiros e técnicos
da área. Ao fim da discussão,
ficou claro que, sem alterações profundas no modelo, o País não ficará
livre do risco de apagões. Assim, a idéia é encaminhar proposta nesse
sentido ao Governo. Para Murilo Celso de Campos Pinheiro,
presidente do SEESP, “é
preciso juntar forças e ir direto ao problema, não bastam alternativas
paliativas, temos a responsabilidade de buscar a melhor saída”.
Críticas às novas regras
Na opinião de Walter Merlo, presidente da Associação dos
Aposentados da Cesp e ex-presidente da Eletropaulo, está havendo
uma seqüência de erros do Governo, desde 1995. “Desmontaram um
modelo e puseram outro que sequer foi implementado. Conseqüência: o
sistema operando no limite da estabilidade”, criticou. Para mudar esse
quadro, Francisco Wagner Monteiro, o Chicão, diretor do Sinergia-CUT
(Sindicato dos Energéticos do Estado de São Paulo), defende rever a
desregulamentação e o processo de privatização. Marco Antonio Kappel,
representando a FNE (Federação Nacional dos Engenheiros), sugeriu
encaminhar proposta aos gestores de Brasília visando uma vaga aos
engenheiros no Conselho Nacional de Política Energética.
Na opinião de Carlos Augusto Ramos Kirchner, diretor do SEESP em Bauru, um
dos grandes equívocos do modelo confirmado nas novas regras é continuar a
tratar energia como mercadoria. Fernando Palmezan, também do SEESP,
criticou a diferenciação entre “energia velha”, oriunda das usinas
antigas, e “energia nova”. Num primeiro momento, os preços das
primeiras seriam mais baixos para evitar a explosão tarifária. Agora,
geradoras estatais cobrarão o mesmo, mas subsidiarão empresas privadas.
Outro ponto duvidoso, segundo Kirchner, é a universalização do atendimento
anunciada, já que o Governo não explica quais serão os meios à sua
viabilização. Sobre isso, para Antônio Carlos Reis, o Salim, presidente
da CGT (Confederação Geral dos Trabalhadores) e do Sindicato dos Eletricitários
de São Paulo, não há dúvidas: “Pagaremos a conta e não será colocada
energia nos lugares mais longínquos do País.”
Também criticado pelos debatedores foi o anúncio de que, até maio, Furnas
e Chesf estarão desverticalizadas, ou seja, terão a área de geração e
transmissão separadas. Esse é justamente
um dos grandes defeitos do modelo, porque fragilizou as transmissoras, que
ficaram sem capacidade de investimento e tiveram seus custos aumentados.
Consumidor
em apuros
O SEESP acredita que os contratos de longa duração, hoje definidos
pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) em dois anos, devem ser
ampliados para garantir os investimentos na geração. Para a entidade,
também deve ser revisto o prazo de validade dos contratos dos
consumidores livres. Em princípio, esses seriam assim chamados porque
poderiam escolher de quem comprar energia. Contudo, correm o risco de ficar
sem fornecedor, já que a distribuidora pode decidir não vender mais a
eles. Com isso, os grandes consumidores, em
geral indústrias, ficariam a mercê do mercado especulativo —
mantido nas novas medidas, já que o MAE (Mercado Atacadista de Energia)
continua existindo, tendo sofrido apenas pequenas alterações.
Entre as novas regras, Kirchner considera o chamado seguro contra
racionamento “a mais diabólica”. Trata-se da contratação de termelétricas
para os momentos de escassez. Elas não produzirão regularmente, para não
baixar o preço no mercado, mas representarão custo permanente. A conta será
rateada entre os consumidores de energia, exceto os residenciais e rurais,
com consumo inferior a 350kWh. Sua implementação efetiva será decidida em
consulta pública, contudo, “tudo indica que já foram contratadas
geradoras térmicas para ficar paradas”, afirmou Kirchner. Um gasto de R$ 4 bilhões já está autorizado para esse fim.
Mais um vício nesse ponto é o subsídio ao transporte do gás importado.
“É um absurdo jogar água fora de nossas hidrelétricas e comprar gás em
dólar.”
Junta-se às grandes incoerências o financiamento de R$ 15 bilhões
concedido pelo BNDES às distribuidoras, para cobrirem prejuízos com o
racionamento. Agora, o Governo pretende eliminar os subsídios cruzados e
repassar aumentos maiores para o setor industrial.
Participaram também do seminário José Paulo Vieira, professor da USP; José
Eduardo de Paula Alonso, presidente do Crea-SP (Conselho Regional de
Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado de São Paulo); Oswaldo
Passadore Júnior, presidente da Associação dos Engenheiros da Cesp e
diretor do SEESP; e Airton Ghiberti, secretário de Políticas Educacionais
da CGT.
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