Os pequenos, auxiliados pela técnica, contra a fome

Um dos pontos de destaque no programa Fome Zero, carro-chefe do Governo Lula, é o papel da agricultura familiar, desenvolvida em pequenas propriedades e voltada à cultura de itens que vão para o prato dos brasileiros.

O sistema de produção foi incluído entre as soluções estruturais para combater o drama que aflige os 44 milhões cuja segurança alimentar não está garantida – ou seja, não são famélicos, mas também não sabem quanto ou o que vão comer amanhã.

“Combater a fome no Brasil, que a  rigor não é um problema de oferta de alimentos, mas de distribuição de renda, implica várias providências. Uma delas é o incentivo à produção voltada ao consumo interno”, afirma o engenheiro agrônomo Maurício de Moraes, pesquisador do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada) da Esalq. Na sua opinião, é preciso estimular a cultura de subsistência e fazer com que ela se torne comercial. “Com isso, aumenta-se a renda das famílias que vivem disso”, explica.

A receita para vencer esse desafio leva alguns ingredientes básicos. “O agricultor precisa de crédito para investir, meios para agregar valor à sua produção com a transformação, além de apoio para comercialização  e garantias contra perda de safra. Tudo isso envolve recursos e depende de uma política agrícola preferencial a esse sistema”, resume o engenheiro agrônomo Jurandir Vieira Góis, da Fundação Itesp (Instituto de Terras do Estado de São Paulo), órgão ligado à Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania.

Além de dinheiro, o pequeno produtor precisa contar com assistência técnica adequada para que uma decisão errada não ponha tudo a perder. Nesse aspecto, terão papel fundamental num projeto de real incremento da agricultura familiar os engenheiros agrônomos. “Se a tônica do Fome Zero for a sustentabilidade, e não só o assistencialismo, será uma grande oportunidade para a categoria”, avalia Góis.

Essa atividade tem sido decisiva, por exemplo, para as 9.818 famílias assentadas no Estado, que se distribuem em 61 municípios, grande parte no Pontal do Paranapanema. A área total ocupada é de 200.800 hectares, com média de 20 hectares por família. Responsável pela política agrária e fundiária do Governo, o Itesp presta assessoria a essas comunidades, contando com um contingente de 100 agrônomos e 150 técnicos para atendê-las.


Apoio
Cada dupla assiste grupos de 100 famílias. “À medida que o assentamento se consolida, essa proporção diminui”, explica Góis. Esses profissionais, que contam com a ajuda de engenheiros civis e florestais, atuam desde a entrada dos beneficiários nos lotes, o que inclui as obras necessárias e a conservação do solo, considerada fundamental. “É prioritário, porque se ele perder aquela terra, perde tudo”, pondera.

O passo seguinte é viabilizar a sobrevivência do assentado, que além de todas as dificuldades do pequeno produtor, não dispõe de recurso algum. “Com raras exceções, as pessoas fazem parte do contingente de excluídos do País, então é preciso promover ações que gerem renda.” No primeiro momento, a família recebe R$ 12 mil do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) para investir no terreno que conquistou.  Cabe ao agrônomo aconselhá-lo sobre como aplicar a verba exígua da melhor maneira. “Ele é o grande articulador das ações dentro do assentamento. Nós discutimos as possibilidades e, junto com a comunidade, arriscamos acertar ou errar. Falamos sobre a situação do mercado, condições de crédito, características das explorações, para que possam escolher.”


Resultados
Diante dos obstáculos, para os técnicos do Itesp, a grande marca do sucesso desses pequenos produtores é a permanência nos assentamentos. “Eles têm conseguido sobreviver e a média de evasão é de 20%”, contabiliza Góis. Na safra 1999/2000, segundo dados do Grupo de Socioeconomia do Itesp, a renda total aferida no Estado ficou em R$ 32,3 milhões, distribuídos entre 7.848 beneficiários.

O gerente de Desenvolvimento Humano do Itesp, Arthur Francisco Marques, acredita que a experiência do instituto deve ser estendida a todos os pequenos produtores, não só aos assentados, tendo em vista que os problemas são comuns. “A diferença é a maneira como se deu o acesso à terra, mas só.” Para ele, a idéia corrobora a proposta de que a agricultura familiar seja o carro-chefe de uma política agrícola que pense na mesa dos brasileiros. “Queremos reforçar a participação dos produtos de autoconsumo porque, no conjunto, os excedentes podem prover o abastecimento da região.”

Posta em prática, a idéia poderia modificar o quadro absurdo vivido no Pontal, em que 95% dos hortifrutigranjeiros vêm do Cinturão Verde de São Paulo, a 600km de distância.

Produção nos assentamentos – Safra 1999/2000
(em 1.000)

Leite

36 mil litros

Mandioca

58 toneladas

Milho 28 toneladas
Feijão 2 toneladas
Frutas 3 toneladas
Horticultura 11 toneladas
Fonte: Grupo de Socioeconomia da Fundação Itesp.

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