Quanto custa não investir em transporte

O transporte público necessita de melhorias drásticas e urgentes. A tese é consenso entre técnicos e governantes, mas sua execução emperra na alegada falta de verbas.

O Pitu 2020 (Plano Integrado de Transporte Urbano), elaborado pelo Governo paulista, por exemplo, exigiria investimentos de cerca de R$ 30 bilhões nos próximos 20 anos.

Tal justificativa cai por terra quando se considera quanto custa não aplicar esse dinheiro, afirmam os engenheiros Laerte Mathias de Oliveira e Emiliano Stanislau Affonso, respectivamente diretor do SEESP e presidente da Aeamesp (Associação dos Engenheiros e Arquitetos do Metrô de São Paulo). “De acordo com estudo do professor Adriano Branco (consultor na área de transporte), o prejuízo social decorrente da baixa oferta de transporte público na Região Metropolitana de São Paulo é de R$ 22 bilhões ao ano”, informa Laerte. Outros cálculos, como o do Banco Mundial, estimam esse custo em US$ 5 bilhões ao ano, só na cidade de São Paulo. A conta de Branco inclui desperdício de combustível (R$ 2,6 bi), poluição ambiental (R$ 1 bi), custo do transporte por ônibus (R$ 0,7 bi), perda de tempo das pessoas (R$ 5 bi) e de produtividade (R$ 12,5 bi).

Há ainda outros dados demonstrando o rombo que está sendo gerado pela falta de um sistema de transporte eficiente em São Paulo. Entre 1991 e 1999, a cidade perdeu 476.220 empregos (13,39%). O PIB brasileiro teve um crescimento per capita médio de apenas 1,1%, mas ainda assim maior em 38% do que o do Estado de São Paulo, de 0,8%. Um estudo do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos) também aponta essa tendência. O rendimento médio das pessoas ocupadas na Região Metropolitana de São Paulo caiu de R$ 1.336,00, em 1985, para R$ 874,00, em 2000 (valores de novembro).


Dinheiro carimbado
Uma esperança de alterar esse cenário está no Congresso Nacional, onde tramita o Projeto de Lei 6.770/02, que destina recursos da Cide (Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico) ao setor, criando o FNIT (Fundo Nacional de Infra-estrutura de Transportes).  

Cobrada desde o início deste ano, a Cide incide sobre petróleo, gás natural e seus derivados e álcool. Na prática, cada vez que se abastece um veículo, parte do preço corresponde a essa contribuição –  na  gasolina são aproximadamente R$ 0,28 por litro. Isso representa receitas anuais que podem chegar a R$ 10 bilhões. Segundo o projeto de lei, 25% desse montante deve ser revertido a programas de infra-estrutura de transporte urbano, obrigatoriamente. Ou seja, a receita não pode ser utilizada para outro fim.

Esse detalhe é um dos entraves para a votação do projeto, que encontra resistência da equipe econômica do Governo. “O Executivo é sempre contra a vinculação de recurso, mas temos convicção de que deve ser assim”, ponderou o deputado José Chaves (PMDB-PE), presidente da Frente Parlamentar de Transporte Público de Passageiros. Confiante, ele acredita que conseguirá colocar a proposta em pauta em agosto, antes das eleições, para que passe a vigorar a partir de 2003. “Temos acordo entre todos os partidos e vamos fazer um esforço concentrado na primeira e na segunda quinzena deste mês.”


Inversão de prioridades
Além do apoio maciço dos parlamentares, o PL 6.770 conta com o suporte de diversas entidades da sociedade civil – entre elas SEESP, Aeamesp, Simefre (Sindicato Interestadual da Indústria de Materiais e Equipamentos Ferroviários e Rodoviários), Abifer (Associação Brasileira da Indústria Ferroviária), ANTP (Associação Nacional do Transporte Público) e NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos) –, que vêm trabalhando pela destinação de verbas federais ao setor.  A ausência dessas é uma das grandes responsáveis pela situação atual. “De acordo com a política brasileira, o Governo do País não tem obrigações para com o transporte coletivo, sendo essas atribuições dos governos locais que não detêm recursos em quantidade suficiente para a sua solução e, por sua situação de endividamento, estão impedidos de contrair novos financiamentos”, explica Emiliano. Segundo ele, essa lógica está na contramão das tendências mundiais, tendo em vista que, da China aos  Estados Unidos, as metrópoles estão mantendo sua mobilidade por meio de investimentos federais a fundos perdidos nas malhas de metrôs e de trens metropolitanos que se integram aos demais modos de transporte público.

Mais uma inversão de prioridades na origem da crise no transporte foi  privilegiar o individual em detrimento do coletivo. A população urbana brasileira saltou de 31%, em 1940, para 78%, em 1996, sendo que as 13 metrópoles brasileiras (São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Belo Horizonte, Fortaleza, Brasília, Curitiba, Recife, Porto Alegre, Belém, Manaus, Goiânia e Campinas) comandam 111 centros urbanos onde reside 56% da população. Essas cidades, de acordo com Emiliano, foram transformadas em espaços para a circulação do automóvel. “A frota cresceu, alardeada como única alternativa eficiente de transporte para as pessoas com melhores condições financeiras. De bem imprescindível, o transporte público transformou-se em mal necessário. Em dez anos, a Capital ganhou 1 milhão de carros e apenas 11 trens de metrô”, lamenta. Um sintoma evidente desse quadro são os monstruosos congestionamentos que afligem o paulistano: a média nos horários de pico atinge 120km,  mesmo com a implantação do rodízio.

Esses assuntos estão em pauta durante a 8ª Semana de Tecnologia Metroviária, promovida pela Aeamesp entre os dias 13 e 16 de agosto, no Frei Caneca Convention Center, na Capital. Maiores informações pelo telefone (11) 3284-0041 ou no site www.aeamesp.org.br. 

Faça sua parte

Para que os recursos da Cide possam ser destinados às obras de infra-estrutura de transporte público a partir de 2003, o PL 6.770/02 deve ser aprovado ainda neste ano. Entre em contato com os parlamentares e manifeste sua opinião.

Lideranças partidárias
PFL
– Inocêncio de Oliveira dep.inocenciooliveira@camara.gov.br
PSDB – Jutahy Magalhães Jr. dep.jutahyjunior@camara.gov.br
PMDB – Geddel Q. Vieira Lima dep.geddelvieiralima@camara.gov.br
PT – João Paulo Cunha dep.joaopaulo@camara.gov.br
PPB – Odelmo Leão dep.odelmoleao@camara.gov.br
PTB – Roberto Jefferson lid.ptb@camara.gov.br
PDT/PPS – Miro Teixeira dep.miroteixeira@camara.gov.br
PSB/PCdoB – José Antônio Almeida dep.joseantonio@camara.gov.br
PL/PSL – Valdemar Costa Neto dep.valdemarcostaneto@camara.gov.br

Liderança do Governo
Arnaldo Madeira dep.arnaldomadeira@camara.gov.br

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