Fórum em Defesa do Consumidor de Energia quer barrar liberação de preços no setor

Lançado na Assembléia Legislativa de São Paulo, em 15 de agosto, o movimento, que congrega diversas organizações da sociedade civil, já nasce propondo-se a vencer uma árdua batalha jurídica.

Pretende impedir a realização dos leilões de energia das hidrelétricas estatais Copel, Cemig, Furnas, Chesf e Eletronorte, marcados para 20 de agosto, no caso das empresas estaduais, e 9 de setembro, no das federais. Na mesma data de sua instalação, ações com esse objetivo foram impetradas junto à Justiça Federal pela FNE (Federação Nacional dos Engenheiros), em Brasília, e Pro Teste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor), em São Paulo.

Esses leilões são o primeiro passo para a liberação de preços no setor elétrico, prevista para entrar em vigor a partir de 1º de janeiro de 2003. Essas operações de compra e venda realizadas ainda em 2002 teriam como objeto lotes de energia a serem fornecidos no ano que vem, quando, pelas regras do modelo atual, 25% da energia que estava prevista nos contratos entre geradoras e distribuidoras seriam comercializados livremente. Para os técnicos do setor, se o projeto for levado a cabo, ocasionará uma explosão tarifária, com aumentos superiores mesmo aos altos reajustes observados até aqui, que somam 167,18% desde 1995 contra 53,10% do IPC-Fipe no mesmo período. “Como os leilões partirão de preços mínimos maiores que os praticados hoje, o resultado será a majoração das tarifas cobradas do consumidor final”, alertou o presidente do SEESP, Murilo Celso de Campos Pinheiro, durante o ato de lançamento do fórum.


Explosão tarifária
Pelos cálculos do professor de Pós-graduação em Energia da USP, Ildo Sauer, o assalto ao bolso dos brasileiros pode representar mais R$ 15 bilhões ao ano no total – se o MWh subir dos R$ 50,00 atualmente cobrados pelas geradoras para R$ 100,00, estimativa corrigida do valor normativo estabelecido pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). “Não se sabe como esses preços serão manipulados e a energia pode cair nas mãos de atravessadores”, denuncia. Segundo Sauer, os riscos são diversos. Casos exemplares da inadequação dessa proposta são  a Copel e a Cemig, que  geram e distribuem sua energia e serão  obrigadas a vender no mercado lotes que  se destinam ao seu conjunto de consumidores. Elas  poderão ter que voltar ao mercado e recomprar essa energia de um comercializador, pagando preços mais altos.  Essa distorção decorre das regras definidas pela Aneel, que impedem que uma distribuidora comercialize mais que 30% de energia produzida por ela mesma ou proveniente do grupo empresarial a que pertence. Ou seja, precisa adquirir de terceiros pelo menos 70% do que fornece.


Insistência no erro
Para Carlos Augusto Ramos Kirchner, diretor do SEESP, a base dos problemas do setor está na adoção de um modelo que pretende transformar um serviço essencial em mercadoria. “Para que o sistema elétrico funcione, é preciso trabalhar com sobra de energia, é isso que garante a sua segurança. Quem defende o mercado quer que a capacidade instalada nacional fique no limite para elevar os preços. Por isso, essa idéia nunca dará certo e precisa ser revista”, enfatiza.

O novo desenho, encomendado à consultoria inglesa Coopers & Lybrand e implantado gradativamente desde 1995, determinou a separação, em diferentes empresas, das atividades de geração, transmissão e distribuição, dando fim à integração que caracterizava o sistema brasileiro de matriz hidrelétrica. Outro elemento essencial da receita foi a venda das companhias estatais, sem exigir que os novos proprietários investissem na expansão da geração. Para completar, as empresas que permaneceram em poder do Estado foram impedidas de ampliar sua oferta. Essa combinação, e não a falta de chuvas, deu origem à crise que resultou em racionamento entre junho de 2001 e fevereiro de 2002.

No início do ano, pressionado a apresentar solução à crise, o chamado Ministério do Apagão anunciou 33 “medidas de revitalização” do setor. Por fim, essas se reduziram a apenas 11, que, em vez de propor soluções, agravam o problema, posto que visam somente viabilizar a liberação de preços. “A sociedade não ganha nada com isso. Trata-se apenas de gerar especulação”, denuncia Sauer, da USP.  

Sociedade organizada

Se o Governo não tem demonstrado sensibilidade quanto à necessidade de rever os rumos do setor elétrico, a sociedade, por sua vez, está convencida da urgência e possibilidade de alterar esse quadro, a se julgar pelo Fórum em Defesa do Consumidor de Energia. O movimento é aberto à participação de todas as entidades interessadas e, além do SEESP, já conta com a adesão do Ceema (Centro de Estudos de Energia e Meio Ambiente); Comissão de Justiça e Paz de São Paulo; Fundação Procon; Ilumina (Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Elétrico); OAB (Ordem dos Advogados do Brasil); Pro Teste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor); Sindicato dos Eletricitários de São Paulo; Sindicato dos Energéticos de São Paulo; e Sindicato dos Gasistas de São Paulo.

Além dessas, o ato de lançamento contou com a participação de representantes da FNE (Federação Nacional dos Engenheiros), Fisenge (Federação Interestadual dos Sindicatos de Engenheiros), Sindicato dos Economistas, Sintaema (Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente de São Paulo), Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil, Federação Única dos Petroleiros, Federação dos Urbanitários e Abrace (Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia). Emprestaram apoio ao evento também o ex-presidente da Copel, João Carlos Cascaes, os deputados estaduais Nivaldo Santana (PCdoB) e Antônio Mentor (PT), esse último presidente da Comissão de Serviços e Obras Públicas da Assembléia, que convocou a reunião.

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