Construção de barragens no Brasil, do ápice ao retrocesso

Engenheiro hidroelétrico – como faz questão de se qualificar – aposentado, aos 77 anos Reolando Silveira analisa a situação atual e faz um retrospecto da engenharia nacional aplicada à construção de barragens, desde o início do século XX até os dias atuais. Segundo ele, o surgimento das barragens um pouco maiores no Brasil, em especial no Estado de São Paulo, data de 1922. “Nessa época, a Light trouxe para o País o engenheiro Billings, que iniciou os estudos de reversão do Rio Tietê para a vertente oceânica em Cubatão.” Quatro anos depois, foi inaugurada ali a Usina Henry Borden.

Todavia, conforme Silveira, somente a partir de 1934 o setor elétrico começou a deslanchar, com o advento do Código de Águas, quando o sistema passou a ser objeto não mais de concessão municipal, mas sim federal. Porém, apenas em 1945 foi construída a primeira grande usina do País, a de Paulo Afonso. Isso se deu “com a criação da Chesf (Companhia Hidroelétrica de São Francisco) para promover o aproveitamento da energia hidráulica entre estados do Nordeste”. A companhia teve, de acordo com Silveira, papel preponderante no desenvolvimento da engenharia e tecnologia nacionais em grandes barragens.

A segunda desse porte foi a de Três Marias, feita também no Rio São Francisco, mas a montante, segundo ele, com a criação da Cemig (Centrais Elétricas de Minas Gerais) em 1952. Oriunda dos escritórios técnicos dessa companhia é ainda a barragem de Furnas, no Alto Rio Grande.

Em São Paulo, nesse período, o governador Lucas Nogueira Garcez “criou a Uselpa (Usinas Elétricas do Paranapanema) à construção da Usina de Salto Grande, hoje Usina Lucas Nogueira Garcez”. Ele recorda que o Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica), fundado em 1951, passou a ter um setor de obras do Rio Pardo, que visava dar início aos estudos e projetos das barragens daquele rio.


Catullo Branco
É ainda dessa época a formação da Comissão Interestadual da Bacia do Paraná-Uruguai, que projetou o aproveitamento de Jupiá e Ilha Solteira. Instituiu-se também nos anos 50 o grupo do vale do Tietê. “No início, chefiava a equipe da qual fiz parte o engenheiro Catullo Branco, um pioneiro no Brasil na construção de aproveitamentos hidroelétricos, particularmente no Estado de São Paulo. Por volta de 1943, ele viajou para os Estados Unidos para visitar a obra no Rio Tennessee. Voltou empolgado com o aproveitamento do rio para fins múltiplos e lançou essa idéia no Brasil, no Rio Tietê. Principiou os estudos da Usina de Barra Bonita e também de melhoramentos do Rio Paraíba, através da construção de barragens regularizadoras (para controlar a vazão).” Ainda conforme Silveira, o plano quadrienal do Governo Garcez compreendia a execução das diversas barragens e eclusas ao longo do Rio Tietê. Previa ainda a construção de aproveitamentos hidroelétricos no Paranapanema. Prosseguimento às obras foi dado na gestão seguinte.


Avanço x desmonte
Os anos 50 e 60 representaram um salto em matéria de potência instalada. Datam dessa época empresas como Cesp (Companhia Energética de São Paulo) e Copel (Companhia Paranaense de Energia), que contribuíram para o avanço do setor. Na década seguinte, em 1975, teve início a construção de Itaipu, a maior barragem do mundo hoje, em operação desde 1984.

Já nos anos 90, o setor elétrico viveu o recesso. “E o Governo, ao invés de reformular o modelo eliminando os pontos negativos, promoveu a desregulamentação.” Conseqüentemente, as companhias federais e estaduais deixaram de construir usinas.

Na “orelha” do livro “Política energética e crise de desenvolvimento – a antevisão de Catullo Branco” – organizado por Adriano Murgel Branco e com análises de vários autores sobre as mudanças no setor –, Silveira lembra da máxima de Catullo Branco: “O que está errado como princípio não dá certo na prática.” E conclui: “Essa assertiva aplica-se, inteira e apropriadamente, à reestruturação do setor elétrico brasileiro, objeto de graves mutilações de princípios...”

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JE 198