Dificuldades em 2003 serão grandes, mas tendem a ser superadas

Um dos desafios que o novo governo enfrentará logo no início de seu mandato será impedir a volta efetiva do dragão da inflação. O velho monstro já ameaça a população.

Em novembro último, a inflação medida pelo IGP-M (Índice Geral de Preços ao Mercado) foi de 5,19%, a maior taxa desde agosto de 1994, quando ficou em 7,56%. A alta culminou com um acumulado no ano de 20,77%. Na visão do professor titular do Instituto de Economia da Unicamp (Universidade de Campinas), Luciano Coutinho, a onerosa herança que será deixada pelo atual governo “problematiza” o ano de 2003. “A inflação no atacado está correndo a níveis muito altos, já chegando a 70%, e tensionando os preços no varejo. Tal pressão deve se propagar nos próximos dois ou três meses”, observa.


Operação complicada
Na sua concepção, o novo governo precisará impedir que a chamada grande conquista da “era FHC”, a estabilização de preços, caia por terra. “Há um desafio muito grande de evitar que se desmoralize completamente o atual sistema de metas de inflação, que vêm sendo estouradas por causa do choque nos preços provocado pela desvalorização cambial.”

Para brecar a subida do dólar e manter a inflação sob controle, será necessário, de acordo com Coutinho, conquistar a confiança dos mercados. “É uma operação muito complicada, a qual vai exigir grande clarividência e firmeza da nova equipe econômica. E acho que essa o terá. Eu diria até que pode haver ligeira apreciação da taxa de câmbio, hoje exageradamente depreciada”, constata.

O novo governo precisará também afastar o perigo da reindexação generalizada de preços, contratos e outros instrumentos. “Isso introduziria uma inflação renitente e seria um grave equívoco. A nova equipe terá que conviver por um período, até meados de 2003, com a inflação transitoriamente alta, de dois dígitos, chegando a 11%, 12%. Essa deve ser diminuída através de uma política que inspire aos agentes econômicos credibilidade que, de fato, tal taxa cairá mais à frente. E, com isso, possa se manejar a redução dos juros e apresentar uma saída menos custosa para a sociedade”, destaca Coutinho. E complementa: “A inflação ascendente tem um impacto muito negativo em termos de distribuição de renda e bem-estar social e, em decorrência, na criação de empregos, ainda muito aquém do necessário. Esses efeitos só começarão a se dissipar no final de 2003.”


Expectativa
O fato de o País estar sob um duríssimo programa de austeridade fiscal com o FMI (Fundo Monetário Internacional) representa, conforme Coutinho, dificuldade adicional ao crescimento econômico, mas não impeditivo. “Acho que o novo governo vai buscar criar mais eficiência no gasto público. Trabalhando com um orçamento apertado, que lhe foi deixado pelo atual governo, e ainda com a exigência grande de um superávit comercial, terá que realocar recursos de maneira mais racional e focada nas prioridades sociais básicas”, conclui.

Portanto, apesar do difícil cenário apresentado para 2003, na sua ótica, esse quadro tende a ser superado. Assim, deve se abrir caminho a um crescimento sustentado a partir de 2004, que pode ser superior a 4% – no próximo ano, a expectativa é que fique em torno de 1,5% e 2%. Sua previsão para daqui a dois anos se fundamenta na excepcional melhora da balança comercial brasileira. “Conseqüentemente, tem se reduzido a vulnerabilidade externa das contas ao se diminuir nossa dependência de créditos e recursos. Para 2003/2004, num Brasil que já terá um superávit comercial de grande escala, mantê-lo exigirá políticas industriais e de exportação. Desse modo, a economia brasileira poderá entrar nos trilhos.”

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