Campanhas salariais acontecem em clima de “euforia”, mas dificuldades permanecem

A conjuntura econômica atual foi apresentada a uma platéia aproximada de 100 pessoas, incluindo representantes de 17 empresas e entidades patronais que negociam com o SEESP e dirigentes desse em todo o Estado de São Paulo, durante o “Seminário Campanhas Salariais”. Promovido pelo Sindicato no dia 10 de abril, o evento marca o início do processo com vistas às convenções e acordos coletivos de trabalho dos engenheiros.

Em sua preleção, Sérgio Mendonça, diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), salientou que o panorama econômico se modifica rapidamente e a guerra no Iraque acelerou ainda mais esse processo. Todavia, ainda conforme ele, surpreendentemente o Brasil passou ao largo dessa crise e os próximos meses devem ser marcados por um período de euforia, o que considerou “preocupante a médio e longo prazos”. O diretor do Dieese relaciona essa tendência ao fato de o novo Governo ter mantido a política econômica implementada pela equipe de FHC. “Os temores quanto ao calote das dívidas interna e externa foram afastados e criou-se um clima favorável entre os mercados. Os primeiros resultados que começam a aparecer indicam queda da inflação mensal e da taxa de câmbio, superávit nas contas públicas acima das expectativas e diminuição do déficit externo do Brasil de mais de 4% do PIB (Produto Interno Bruto) no início de 2002 para algo em torno de 1%.”

Mendonça lembra, contudo, que essa política econômica não consegue colocar o País na rota de crescimento. “Em oito anos, a taxa média foi de 2,3% do PIB e há pelo menos cinco anos o rendimento médio do trabalhador vem caindo. A população está cada vez mais pobre. E é uma política que depende da não-existência de choques externos, o que é absolutamente ingênuo imaginar. A contrapartida do fim da guerra é favorável, entretanto, o cenário econômico internacional não”, destacou.


Sem ilusões
Portanto, na sua análise, a euforia que se configura não é, necessariamente, tranqüila ao sindicato que vai negociar. Apesar da tendência de queda da inflação ainda em 2003 – a taxa acumulada deve situar-se em 12% e cair para um dígito nos próximos 12 meses –, no último ano o índice ficou em 18%. “Vejo um cenário positivo no segundo semestre e em 2004, quando pode haver um crescimento do PIB de 3 a 4%. Mas não nos iludamos com os resultados de curto prazo”, avisou Mendonça. Para ele, a solução breve não está nas reformas tributária, previdenciária ou trabalhista, até porque serão feitas dentro do possível, “parcialmente”. A alternativa é “o Brasil aprender a andar com as próprias pernas, relacionando-se com o mundo, mas não dependendo excessivamente de capitais externos”.

O assessor sindical e político do SEESP, João Guilherme Vargas Netto, concordou. E acrescentou: “Hoje (dia 10) completam-se 100 dias do primeiro governo em que um operário assume a Presidência, o qual está muito prestigiado. É preciso aproveitar esse tempo para ir construindo nossa estabilidade.” Nesse contexto, na sua análise, alguns sindicatos estão buscando corretamente a recomposição salarial até mesmo antes da data-base, para impedir a volta do fantasma do gatilho ou da reindexação. Mendonça dá a receita nessas campanhas salariais para evitar tal caminho, em especial à maioria dos engenheiros, cuja data-base é 1º de maio e a negociação ocorrerá ainda neste semestre.  “Durante o nevoeiro vai se levando o barco devagar. Uma opção é tentar abonos complementares, um mix com PLRs (Participações nos Lucros e Resultados).” A partir daí, pode-se, ainda de acordo com ele, voltar a negociar no segundo semestre.


Conselho Sindical
Na ótica de Vargas Netto, a participação da sociedade e do movimento sindical para impulsionar as ações do Governo, cujo grande mérito foi incluir a pauta social no debate, é fundamental. Nessa linha, o delegado regional do trabalho no Estado de São Paulo, Heiguiberto Guiba Della Bella Navarro, entregou ao SEESP, durante o seminário, sua proposta de formação do Conselho Sindical na DRT/SP, previsto para ser lançado no dia 13 de maio. Baseado nesse prazo, ele solicitou à entidade o envio de suas sugestões até o dia 25 de abril. A iniciativa visa fortalecer a relação entre os representantes dos trabalhadores e o Governo, por meio da Delegacia. A proposta abrange como diretrizes de ação o combate à fome, ao trabalho infantil e a todas as formas de discriminação, bem como à precarização nesse campo, discussão ampla com os vários setores da sociedade sobre o primeiro emprego, formação, qualificação e geração de renda. “Os desafios colocados hoje requerem soluções cada vez mais duradouras e transparentes, que somente serão alcançadas com o reconhecimento de que colocar-se nesse caminho é parte fundamental do processo de retificação das relações entre capital e trabalho”, afirma o documento. “Na segunda feira (dia 14) estaremos lançando o Fórum Nacional do Trabalho. Esse governo colocou no eixo da questão a necessidade de se participar socialmente para termos um país mais igualitário. Com o Conselho Sindical vamos encurtar a distância com os empresários e os órgãos públicos. Queremos fazer uma ação integrada”, assegurou Guiba. O assessor Vargas Netto recomendou aos presentes a criação de um Fórum Nacional da Engenharia, do qual participariam os envolvidos. No espaço, seriam discutidas as questões de interesse da categoria e encaminhadas suas conclusões e reivindicações ao Fórum Nacional do Trabalho.

O presidente do SEESP, Murilo Celso de Campos Pinheiro, concluiu: “Vamos ter anos de muita luta conjunta. Nossa relação sempre será de forma a valorizar cada vez mais a engenharia e o campo de trabalho. Devemos estar unidos.” Esse foi, na opinião de Vargas Netto, o espírito da reunião: construir pontes e não aprofundar as diferenças.


Parceiros, não rivais
Ao menos no seminário, o tom do empresariado foi da busca da negociação e de pontos de convergência entre o que desejam os trabalhadores e o que as companhias têm a oferecer. A unanimidade dos presentes do lado patronal adotou o discurso da parceria com o SEESP e se mostrou aberta à sua atuação junto aos engenheiros. A entidade representa, segundo salientou o seu presidente, 170 mil desses trabalhadores no Estado de São Paulo e é o maior sindicato de profissionais liberais da América Latina.

Embora durante o evento tenha prevalecido o espírito de cooperação, muitos alertaram para as dificuldades que devem ser encontradas no processo e a necessidade de se negociar de forma realista, tendo em vista a conjuntura econômica não lhes inspirar segurança, apesar do clima de euforia. Alguns enfatizaram que sua política de recursos humanos dá prioridade à saúde e segurança no trabalho, qualidade de vida, desenvolvimento profissional e educação corporativa. Estavam presentes representantes da Elektro, Telefônica, CPFL, CDHU, AES-Tietê, Cesp/Emae, SPTrans, Cetesb, Cosipa, CTEEP/EPTE, CPTM, Sabesp, Codesp, além de Fiesp e Sinaenco.

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