| 
     US$ 22 bilhões engarrafados por ano  | 
|
| 
     Quando Júpiter transformou a ninfa Juventa em fonte termal, não imaginava o grande negócio que estava inaugurando. O comércio de água mineral é um dos que mais crescem no mundo atualmente. Em 2000, foram vendidos 84 bilhões de litros, segundo estimativas de Maude Barlow e Tony Clarke, autores do livro “Ouro Azul”. Ainda de acordo com eles, a brincadeira rende anualmente US$ 22 bilhões. Só
    no Brasil, em 2001 foram consumidos 4,3 bilhões de litros e o setor faturou Corrida
    às fontes Tal
    otimismo, contudo, não é compartilhado pelo presidente da Abinam, Walter
    Lancia, para quem o excesso de oferta vem derrubando os preços. Só a indústria
    nacional conta com 200 empresas, que produzem 240 marcas. Se
    a proliferação de concorrentes reduz o faturamento do setor, também gera
    outras preocupações: o destino do recurso natural. A exploração de água
    mineral no Brasil obedece ao Código de Mineração e ao Código de Águas
    Minerais, que data de 1945 e está sendo reformulado visando a sua atualização
    em relação à classificação. A atividade é autorizada pelo DNPM
    (Departamento Nacional de Produção Mineral), órgão do Ministério de
    Minas e Energia. Quem detém as concessões é obrigado a recolher a CFEM
    (Compensação Financeira sobre a Exploração de Recursos Minerais), que
    tem alíquota de 2% sobre o faturamento líquido. Risco
    de escassez A
    professora da Unicamp defende ainda que seja feito um gerenciamento
    coordenado entre a água explorada para o envase e aquela captada para
    abastecimento público ou de hotéis e outros estabelecimentos, o que se
    subordina a legislação e órgão público diferentes, no caso paulista o
    DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica). Da mesma forma, o uso e a
    ocupação do solo também afetam a vazão das fontes, tendo em vista que a
    maior impermeabilização reduzirá a infiltração subterrânea, que
    origina a água mineral. “Tudo isso já passa pelo crivo de órgãos públicos,
    basta que haja integração entre eles”, recomenda.  | 
|
| 
     Queda-de-braço
    em São Lourenço  | 
|
| 
     Uma disputa entre a Nestlé e o movimento “Cidadania pelas Águas”, no município de São Lourenço, em Minas Gerais, demonstra os conflitos que a explosão do comércio de água engarrafada pode causar. O pomo da discórdia é a produção da Pure Life, a partir da Fonte Primavera, no Parque das Águas. A marca pode ser obtida utilizando-se qualquer água e obedece a uma estratégia de comércio global. Aqui, nos Estados Unidos ou no Iraque tem o mesmo sabor. Em 1992, a multinacional comprou o grupo Perrier, que desde 1974 possuía a Empresa de Águas São Lourenço. Em 1996, iniciou sua saga para explorar água da Fonte Primavera, reduzindo o seu teor de ferro, considerado excessivo. Como esse tipo de tratamento é proibido pela legislação brasileira, a solicitação foi recusada pelo DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral). A saída encontrada pela empresa foi desmineralizar totalmente a água, que seria vendida com a classificação de “purificada adicionada de sais”. A autorização veio do Ministério da Saúde, em novembro de 1999, graças a uma resolução da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), datada de julho do mesmo ano. 
 Em
    dezembro de 2001, o promotor de Justiça Pedro Paulo Barreiros Aina
    ingressou com uma ação civil pública contra a empresa, ainda em tramitação,
    solicitando o fim da extração da água e da produção da Pure Life, o
    fechamento do poço e indenização equivalente ao lucro obtido. No
    processo, contesta a argumentação da Nestlé de que o teor de ferro da água
    da Fonte Primavera impedia o consumo humano 
    e critica o método adotado: “Deve ser ímpar no planeta o absurdo
    da utilização de uma água de alta mineralização, o que só ocorre em
    condições especiais na natureza, para produção de água comum adicionada
    de sais.” 
 Membro do Cidadania pelas Águas, o administrador Cássio Mendes acusa ainda a empresa de extração excessiva, acima dos 220 milhões de litros por ano, autorizados pelo DNPM, o que teria causado o desaparecimento da água magnesiana e alteração no sabor das demais. A Nestlé, por sua vez, afirma que a fonte em questão “não secou e apresenta dificuldades desde o final da década de 40”. 
 Em face da controvérsia, a Secretaria de Minas e Metalurgia determinou que se realizasse novo estudo geológico para apurar a real situação do Parque das Águas. A expectativa da empresa, de acordo com sua assessoria de imprensa, é que se garanta a continuidade de suas atividades. Já Mendes espera que o laudo acabe com as aspirações da multinacional em São Lourenço: “A Nestlé tem essa estratégia de dominar as águas do planeta. Pois que faça isso para lá, aqui não!”  | 
|
| 
     | 
|