I Fórum Social Brasileiro


Outro Brasil é possível e necessário

Rita Casaro


Com esse mote básico, aconteceu em Belo Horizonte, entre os dias 6 e 9 de novembro, o I Fórum Social Brasileiro, que contou com a participação de 1,2 mil organizações, entre elas o SEESP. O evento dividiu-se entre seis conferências e cerca de 240 oficinas promovidas por ONGs, movimentos sociais ou sindicatos, que aconteceram no Ginásio do Mineirinho e nas dependências da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Somando-se a essas as atividades culturais, o acampamento da juventude, as tendas políticas e a marcha de abertura que percorreu as ruas da cidade, calcula-se que o esforço reuniu aproximadamente 40 mil pessoas.

Ao longo dos quatro dias de programação, nos debates principais, foram tratados os temas considerados vitais pela organização: “Alca, OMC e dependência externa: estratégias econômicas de dominação”, “Globalização armada e militarização na América Latina”, “Superação do neoliberalismo por meio de projetos democráticos, populares, não-sexistas e anti-racistas de desenvolvimento sustentável”, “Justiça social, direitos humanos, igualdade entre mulheres e homens, gerações e superação do preconceito racial no Brasil”, “Estado e movimentos sociais: repressão, cooperação, cooptação” e “A ação global dos movimentos sociais”.



Desejo de mudar
Além da difícil missão de tornar realidade um evento dessas proporções, os organizadores do FSB tinham ainda um obstáculo a superar: a expectativa ambiciosa do público habituado à gigantesca mobilização que foram as três edições do Fórum Social  Mundial, realizadas na capital gaúcha em 2001, 2002 e 2003. Embora as experiências não possam ser comparadas, a primeira versão nacional cumpriu o importante papel de mostrar “um caminho promissor para mudar o Brasil”. A opinião é do jornalista Antonio Martins, que integra o Conselho Internacional do FSM.

“Belo Horizonte expressou, por um lado, a perplexidade dos movimentos sociais brasileiros, que trabalharam durante anos pela vitória de Lula e, após sua chegada ao Governo, não compreendem porque o País não muda. Foi, assim, um fórum muito menos capaz de mobilizar, de despertar energias, de se transformar em fato político.”

No entanto, aposta Martins, “revelou algo novo e que está muito relacionado ao espírito de Porto Alegre, muitas vezes à margem do que é conhecido como esquerda”. Para ele, isso ficou demonstrado por atividades que indicam um novo espaço de ação, “aquele ocupado por pessoas que não estão dispostas a participar da vida dos partidos, mas desejam interferir no futuro da sociedade para mudá-la e acham que podem fazê-lo interpretando necessidades, dando respostas a elas, mobilizando gente, pressionando o poder, ou seja, fazendo política”.

E, se depender dos organizadores, o esforço voltado a essa meta continua. “Estamos encerrando um evento, não um processo, que apenas começou. Esse foi o primeiro de muitos outros que acontecerão em todos os estados do Brasil”, anunciava Salete Valesan Camba, membro do Conselho Brasileiro, ao final da maratona, na noite de domingo.

Erros revisitados: Governo tateia e repete FHC

O Brasil está cometendo sérios equívocos na condução de sua política econômica. E, pior, está repetindo os mesmos observados no nosso passado recente. A crítica é do economista Luiz Gonzaga Belluzzo, para quem o Governo Lula, que não tem um projeto claro, reproduz a linha de ação de Fernando Henrique Cardoso e, na busca pelo crescimento, “fica tateando para ver qual a melhor saída”.  “De maneira imprudente, deixou que a taxa de câmbio se valorizasse. Isso só não causou maior dano à economia porque o longo período com taxa de juros muito alta provocou a matança da economia real”, apontou. Para completar, diz o professor da Unicamp, não tem aproveitado o período em que há excesso de liquidez no mercado, ou seja, dinheiro barato, para comprar reservas, aumentando o parco saldo atual de US$ 18 bilhões. “Hoje, todos os países que se levam a sério acumularam reservas fortes porque sabem que, nesse estilo de articulação internacional promovido pelos movimentos de capitais, é preciso estar prevenido para não levar uma lambada. Não está se prevenindo contra a mudança de humor dos mercados financeiros, o que costuma ocorrer inevitavelmente”, sentenciou.

Mais um ponto central para Belluzzo é a insistência em manter a taxa de juros, atualmente em 18,85%, nas alturas. O anunciado objetivo de impedir a volta da inflação, garante ele, é falácia. “Na verdade, não cai porque tem a conta de capital aberta. É claro que se sabe que o problema está no fato de que, quando baixa a taxa de juros, há um deslocamento da riqueza de real para dólar. Isso é uma coisa que ninguém fala, porque é a questão central, então é preciso escondê-la com mais cuidado.”

O espinhoso tema também foi tratado por Belluzzo durante o I Fórum Social Brasileiro, no seminário “O controle de capitais na construção do Brasil que queremos”, promovido pela Attac (Ação pela Tributação das Transações Financeiras em Apoio aos Cidadãos) e pela Unafisco (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal). Ele enfatizou a necessidade de conter a especulação internacional  para que o Governo recupere a autonomia sobre a economia e denunciou o bloqueio ideológico, que  faz com que a medida não seja vista como uma opção.

Um caso emblemático, de acordo com o professor, é a China, que faz rigoroso controle e continua a receber investimentos diretos. “Seu superávit em relação aos Estados Unidos é de US$ 116 bilhões, metade garantida por empresas estadunidenses que estão lá.” Também evitam a volatilidade e seus males Malásia, Taiwan, Cingapura e Índia.

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