FSM Viagem
ao Planeta Mumbai |
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* Antonio Martins |
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As
construções em Nesco Conventions Ground, o parque de exposições de
cerca de um quilômetro quadrado escolhido para sediar o IV Fórum Social
Mundial, realizado entre 16 e 21 de janeiro em Mumbai, na Índia, foram galpões
imensos e rústicos, que os organizadores reservaram para as grandes conferências
e painéis. Enganou-se, porém, quem imaginou que a energia do IV FSM seria
gerada ali. Ela brotou das ruas, mas também das mais de mil oficinas e
seminários – as chamadas “atividades autogeridas”, que qualquer
organização inscrita para o FSM pode propor e realizar. Em Porto Alegre,
elas ocorriam nas salas de aula da PUC. Em Mumbai, foi preciso improvisar.
Quatro áreas de Nesco Ground foram transformadas em corredores de debates.
Ao largo deles, ergueram-se os esqueletos das salas: troncos finos de
madeira, amarrados com sisal. Os organizadores contaram com o clima (quase
nunca chove nesta época do ano em Mumbai) e com a sorte (um incêndio
provocaria uma tragédia). Havia
140 instalações assim e o Fórum das oficinas e seminários foi diverso,
plural e colorido como os de Porto Alegre. Era possível encontrar debates
sobre o aborto crescente de embriões femininos na Índia (qualificado como
“feminicídio oculto”); a campanha internacional contra as bases
militares estadunidenses; um novo sistema de relações internacionais (a
partir de uma crítica refinada à falta de transparência e democracia na
OMC, FMI e Banco Mundial); o direito a moradias e cidades habitáveis; a
luta contra a monarquia no Nepal; e o impacto da globalização entre os
“intocáveis”, um exército de 160 milhões de pessoas condenadas à
total exclusão pela tradição indiana das castas. Os
debates no FSM, que neste ano sentiu na pele o que é a globalização da
desigualdade e da injustiça, ajudavam a compreender a miséria
vista nas ruas de Mumbai. Uma denúncia chocante foi feita por Sony
Kapoor, uma das atrações da oficina promovida pelos sindicatos de
auditores fiscais do Brasil e da França, para debater a necessidade de uma
nova arquitetura financeira internacional. Segundo ele, a atual é tão
injusta que, sob ela, é a Índia quem ajuda a sustentar o consumo e os
investimentos dos estadunidenses (inclusive sua corrida armamentista) – e
não vice-versa. Diante do espanto do público, ele comprova que o país,
onde é preciso às vezes fechar o coração para não entrar em desespero,
financia Manhattan e o Pentágono. Os Estados Unidos têm um déficit em sua
conta corrente com o exterior equivalente a 5% do PIB – ou seja, consomem
muito mais do que produzem, e portanto precisam atrair a riqueza de fora.
Como têm a moeda mundial e são o centro do sistema financeiro
internacional, podem fazê-lo vendendo ao mundo dólares ou títulos de seu
Tesouro. Seguindo as recomendações do FMI, a Índia ampliou fortemente
suas compras da moeda e desses papéis nos últimos anos. A parcela da
riqueza indiana emprestada aos EUA por meio desse mecanismo já chega a US$
100 bilhões.
A
proposta permitiria combinar a diversidade, uma das marcas principais dos fóruns,
com ação comum. Para participar, nenhuma organização ligada ao planeta
Porto Alegre seria obrigada a abrir mão de seus objetivos próprios.
Haveria grandes chances de sucesso. Um boicote internacional concentrado em
apenas duas empresas provocaria danos reais: quedas no faturamento e na cotação
das ações, fuga de investidores. Um primeiro êxito poderia, mais tarde,
estimular outros tipos de iniciativas conjuntas. O
avanço, adverte Roy, é inevitável: “O Fórum precisa fugir de um grande
risco. É o de absorver nossas melhores energias, mobilizar as mentes mais
generosas apenas para que, ao final de quatro dias, comecemos a pensar no próximo
encontro. Nesse caso, não incomodaria nossos inimigos. Continuaria a ser a
nossa música, mas nunca chegaria a ser a nossa luta.” Em
2005, o encontro dos que querem um novo mundo estará de novo armado no
Brasil. Há meses de trabalho
pela frente para garantir que a chama continue acesa.
*Membro
do Conselho Internacional do FSM e editor do portal Planeta Porto Alegre
(www.planetaportoalegre.net), no qual foi publicada versão original
deste texto. |
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