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Burocracia e limitações emperram “Primeiro Emprego”

Soraya Misleh

Promessa de campanha de Lula, o Plano Nacional de Primeiro Emprego, sancionado em 22 de outubro último pelo presidente da República, conseguiu gerar até agora apenas 2.301 vagas, das quais somente 577 foram preenchidas.

Os resultados são pífios, como evidencia a Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) relativa a fevereiro, realizada em seis regiões metropolitanas. Segundo o estudo, de um universo de 2,5 milhões de pessoas desempregadas, 45,8% eram jovens. Desses, 19,4% estavam à procura do primeiro emprego. A taxa de desocupados abaixo dos 25 anos é ainda maior se considerados os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, também do IBGE, efetuada em todo o território brasileiro, exceto na área rural do Norte do País: cerca de 3,7 milhões ou quase metade do total, conforme aponta o secretário do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade do Município de São Paulo, Marcio Pochmann. Os estudos diferem em função da abrangência geográfica e período de referência.

Independentemente de qual se leve em conta, os números obtidos com o programa são inócuos e desafiam a previsão do Ministério do Trabalho e Emprego anunciada à imprensa de criar, com a iniciativa, 250 mil postos até o final deste ano. Embora o secretário de políticas públicas de emprego do Ministério, Remígio Todeschini, admita que foram detectados entraves na fase inicial do programa – que beneficia jovens entre 16 e 24 anos de baixas renda e escolaridade –, os quais “deverão ser retirados por meio de medida provisória a ser anunciada nos próximos dias”, entre as justificativas para o seu baixo desempenho estaria o fato de o emprego para os que se situam na faixa etária abrangida ser sazonal. “O período forte de contratação, historicamente, acontece entre os meses de abril e setembro.” Para Todeschini, ao mesmo tempo, inicia-se uma fase de revitalização da economia, “o que se espera que contribua para incrementar o número de vagas”. Pochmann reconhece que, dada a conjuntura desfavorável, “dificilmente outro programa teria algum êxito” e considera esse inovador e necessário. Porém, faz ressalvas: “Sua ótica é abrir espaço entre os empregos existentes. Dado o nível desses, como é possível privilegiar oportunidades para o jovem, partindo do pressuposto que as empresas não os contratam? Por isso, o Governo Federal subsidiaria parte do custo que essas teriam caso o fizessem. É um pressuposto adotado por diversos programas em que a experiência nacional mostra o pouco sucesso.” Além disso, a burocracia à companhia obter o incentivo representa dificuldade adicional. Segundo a assessoria de comunicação do Ministério, essa deverá ser atacada com resoluções da medida provisória.

 

Educação antes do emprego O programa conta com R$ 180 milhões de recursos da União e abrange não apenas a subvenção econômica às empresas, mas também responsabilidade social (quando as companhias contratam sem receber incentivos financeiros, principalmente as grandes), qualificação profissional, aprendizagem, estágio, trabalho comunitário e consórcios sociais, bem como empreendedorismo (com capacitação pelo Sebrae e linha de crédito de R$ 100 milhões ao auto-emprego e pequenos negócios). Da forma como está estruturado, Pochmann alerta que, mesmo simplificando o processo, é difícil de ser operado. “Acredito que tenderá a ter mais êxito ao se olhar a problemática do desemprego juvenil pelo lado da baixa preparação do jovem para lidar com os desafios no mercado de trabalho.” Assim, na sua opinião, seria necessário que o programa privilegiasse a educação antes do emprego. “No Brasil, temos 33,5 milhões de pessoas na faixa etária de 15 a 24 anos, metade estuda, a outra não. Do ponto de vista de renda, de cada dez filhos de ricos nove estão na escola, enquanto entre os pobres só quatro estudam e três estão fora da série referente à idade. Falta um esforço para retirar jovens do mercado de trabalho e conceder sobretudo aos sem ensino médio completo uma bolsa para que estudem e desenvolvam atividades comunitárias. Acredito que o Governo precisaria investir muito mais nisso”, salienta. A idéia inspira-se, destaca ele, no Bolsa-Trabalho Renda implantado no município de São Paulo, que hoje atende 50 mil jovens de baixa renda e pouca escolaridade.

Para o secretário municipal, além dessas alterações cruciais, o Primeiro Emprego poderia ser readaptado para abranger os que têm ensino médio ou curso universitário completo. Ele cita como exemplo o programa paulistano Bolsa Trabalho-Emprego, em que a Prefeitura paga a quem contrata um recém-formado em regime de CLT seu custo de aprendizagem por três a cinco meses. “Seria uma modificação para dar conta de uma realidade muito mais heterogênea no interior do mercado de trabalho juvenil. Contudo, necessitaria de recursos consideráveis e, portanto, da predisposição do Governo de abrir brechas orçamentárias, para atingir pelo menos 2 milhões de pessoas. Do contrário, vamos plantar trigo em vaso. Estou acreditando que esse é um plano piloto até para que sejam feitas as adaptações necessárias.”

A inserção no programa de recém-formados no ensino superior – prevista durante a sua concepção, segundo informou a assessoria de comunicação do Ministério ao Jornal do Engenheiro naquela oportunidade (veja edição 208) – não está nos planos do Governo. “É possível haver alteração na escolaridade, por meio da medida provisória, mas sem incluir aqueles com curso universitário. Precisamos atender prioritariamente os jovens mais pobres que estão entre a informalidade e muitas vezes na ilegalidade. O programa é uma ponte de solidariedade a esses”, enfatiza Todeschini. Até que outra mudança seja anunciada, os engenheiros recém-formados, como Leonardo da Silva Ignacio, continuarão sua luta solitária e desigual por uma vaga no mercado de trabalho. Formado na modalidade civil pela Unip (Universidade Paulista) em 2002, ele ainda batalha pelo primeiro emprego fixo. “A experiência pega muito e o incentivo governamental ajudaria bastante”, conclui.

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