Memória

Criado nos tempos de Cabral, porto de Santos é o mais moderno da América

Lourdes Silva  

São 13km de cais, com profundidade de até 14 metros, cerca de 500 mil m2 de armazéns, 980 mil m2 de pátios, extensa malha viária e linhas férreas. O atendimento é diversificado para operações com diferentes cargas e dispõe de equipamentos sofisticados para embarcação e transporte e um moderno terminal de passageiros. Hoje, o porto de Santos já ultrapassou a marca anual de 60 milhões de toneladas movimentadas e é o principal ponto de entrada e saída de mercadorias do continente latino-americano.

Até atingir essa marca, contudo, o terminal marítimo percorreu um longo caminho que remonta ao descobrimento. Existem relatos de 1507 sobre a existência de um “porto dos escravos” no local onde hoje está a ponta da praia. Segundo arquivos da antiga Companhia Docas, foi em 1531 que o navegador Brás Cubas, integrante da expedição portuguesa de Martim Afonso, teve a idéia de transferir o porto da baía de Santos para o seu interior, no sítio denominado Enguaguaçu, no acesso do canal de Bertioga. Ali, formaria-se um povoado que seria elevado à condição de Vila do Porto de Santos em 1546. Nove anos depois, seria instalada a alfândega. Pelos três séculos seguintes, contudo, o porto manteve-se com o mínimo de mecanização, exigindo muito trabalho físico. Além disso, as precárias condições de higiene e salubridade propiciavam o aparecimento de doenças de caráter epidêmico.

 

Café impulsiona melhorias O cenário começou a mudar a partir do século XIX, especialmente com o impulso dado pela cultura cafeeira nas terras paulistas – em 1845, registrou-se o primeiro grande embarque do produto para a Europa –, e com a chegada de navios a vapor que traziam centenas de imigrantes. O início das operações da São Paulo Railway, ligando a ferrovia do litoral ao planalto paulista em 1887, também contribuiu para aumentar a movimentação do porto, que não estava apto a atender essa demanda, devido às condições precárias de atracação e de operacionalidade.

A solução encontrada foi promover uma concorrência pública para entregar a concessão do porto, visando a sua modernização. Em julho de 1888, a Gaffrée, Guinle & Companhia, grupo vencedor, assinou um contrato de exploração de 39 anos e iniciou as obras sob a direção do engenheiro Guilherme Benjamin Weinschenck. Já sob o regime republicano, em 1890 a concessão foi ampliada para 90 anos e transferida, em 1892, à Companhia Docas de Santos. Nesse ano, ficou pronto o primeiro trecho de cais acostável, com 260 metros e o primeiro armazém – o que marcaria o surgimento do porto organizado.

De 1895 a 1898, foi erguida a faixa portuária com quase 2 mil metros e no ano seguinte começaram a ser derrubados os antigos trapiches. Para se ter uma idéia da evolução, em 1900 existiam 11 armazéns e toda a área tinha luz elétrica. Também foi construído um depósito com capacidade para 5 mil toneladas de carvão, incluindo uma ponte de desembarque em dois pavimentos, com trilhos e guindastes a vapor. E ainda a barreira do cais. “Era um grande muro de pedra e cimento, com 1,50m acima do nível da maré mais alta e sete metros de profundidade”, explica Álvaro Luiz Dias de Oliveira, diretor do SEESP na Baixada Santista.

Em 1909, o cais tinha 4.726 metros e foi equipado com duas estações geradoras de energia elétrica para iluminação das áreas portuárias. Também foram erguidos 12 armazéns internos. Continuavam em obra duas torres transmissoras dos fios condutores de energia da nova Usina Hidrelétrica de Itatinga, inauguradas em 1910, bem como toda a infra-estrutura dos armazéns e o edifício da seção controladora do tráfego e contabilidade, existente até hoje.

Na segunda metade do século XX, o desenvolvimento do Estado de São Paulo e a instalação do pólo petroquímico de Cubatão alavancaram a expansão do porto, resultando em terminais de combustíveis, graneleiros, concessões de terminais privativos e modernas instalações para contêineres.

 

Fim da concessão imperial Em 1980, com o fim da concessão da Companhia Docas de Santos, o Governo Federal criou a Codesp (Companhia Docas do Estado de São Paulo), empresa de economia mista, de capital majoritário da União, que passou a operar o cais do porto de Santos. Dos seus 13.013m, cerca de 11.600m são administrados pela Codesp. Os restantes 1.413m são operados por cinco terminais privados (Cosipa, Ultrafertil, Dow Química, Cultrale e Cargil). Nova fase de exploração viria com a Lei 8.630/93, com arrendamento de áreas e instalações à iniciativa privada, mediante licitações públicas. Para Oliveira, essa lei colocou os portos brasileiros, em especial o de Santos, diante de grandes desafios: reformular o sistema de gerenciamento das operações e da mão-de-obra, eliminando as interferências corporativas e burocráticas e aproveitando, de forma racional, os espaços e as instalações existentes. “A engenharia nacional desempenhou papel fundamental ao longo dessa história. Hoje, o desafio é a execução da operação portuária, dentro de uma melhor performance técnico-operacional”, avaliou.

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