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07/12/2010

Brasil deve fazer mudanças na matriz energética

"Ninguém tem dúvidas de que as energias renováveis vão dominar no futuro. É um processo muito demorado, mas irreversível", afirma o economista e engenheiro Edmilson Moutinho dos Santos, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP.

       Na atual disputa por uma economia de baixo carbono, o Brasil poderia estar no topo do pódio e permanecer nele por muito tempo devido ao seu vasto potencial de energias renováveis. Mas, segundo especialistas, o país vem desperdiçando oportunidades de explorar fontes de energia limpa - o grande motor para o desenvolvimento em tempos de mudanças climáticas.
       "Ninguém tem dúvidas de que as energias renováveis vão dominar no futuro. É um processo muito demorado, mas irreversível", afirma o economista e engenheiro Edmilson Moutinho dos Santos, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP.
       "Mas o Brasil, mesmo com todo seu potencial, pode ficar para trás se não investir mais nessa área de energia verde", alerta o coordenador do Greenpeace, Ricardo Baitelo.
       China, Estados Unidos e alguns países europeus estão aplicando bilhões de dólares para expandir suas energias verdes, especialmente eólica, solar e de biomassa (produzida a partir de lixo orgânico e sobras agrícolas, como o bagaço da cana). Na Europa, por exemplo, do total de novos mecanismos de geração de energia instalados no ano passado, 60% foram para renováveis.
       Um estudo do Pew Environment Group com países do G-20 mostrou que enquanto o investimento da China nessa área foi de US$ 34,6 bilhões em 2009, o do Brasil foi de US$ 7,4 bilhões.
       A culpa dessa "lentidão" do governo pode estar justamente na situação confortável do Brasil, com imenso seu potencial hidrelétrico, que faz com que 47% das fontes de energia do país sejam limpas. No entanto, para os especialistas, esse índice não pode ser visto como um motivo para se acomodar.
       "Até há alguns anos, o país ainda tinha um grande potencial hidrelétrico a ser explorado. E o governo alegava que a Europa só investia em fontes renováveis por não ter esse potencial", diz Baitelo. "Hoje, ele já percebeu as dificuldades ligadas a hidrelétricas e as vantagens de energias como a eólica."
       Para a professora de gestão ambiental da USP, Neli Aparecida de Mello, o problema não está nas hidrelétricas em si, mas na aposta que sempre se fez nas obras grandiosas, como Itaipu e Balbina, e também na sua localização.
       "Não é uma questão de banir o modelo, mas sim de mudá-lo. Em primeiro lugar, deveríamos construir hidrelétricas menores, mais locais", diz. "Também é preciso levar em conta que atualmente os novos projetos estão na Amazônia, como Belomonte. Além do impacto ambiental, temos de ver o grande problema de logística para controlar essas longas linhas de transmissão que trazem a energia para o Sudeste."
       Outro desafio passa pelas emissões vindas do setor energético. A meta do governo é permitir que esse tipo de emissão - que hoje representa 16,5% do total - dobre em dez anos. Segundo Baitelo, o governo usa a desculpa de que, como as emissões desse tipo são baixas, não há problemas em aumentá-las. "É um absurdo que se permita duplicar esse valor num país como o Brasil, com tantas alternativas energéticas", diz.
       Os especialistas também apontaram para outro motivo para esse certo atraso do Brasil em investir nas fontes verdes: o pré-sal. "No início do governo Lula, o etanol era prioridade. Com o pré-sal, houve um deslumbramento e ele acabou sumindo um pouco do discurso", afirma Baitelo, lembrando que o então ministro de Minas e Energia Edison Lobão chegou a dizer que queria ver carros de passeio a diesel.
       Santos destaca ainda que essa empolgação pré-sal acabou tirando o foco de uma questão essencial: o destino do gás gerado pela exploração desse petróleo. As projeções para essas emissões são tão altas que poderiam substituir as geradas pelo desmatamento, se esse fosse erradicado.
       "Para quem está pensando em sustentabilidade, é um absurdo não aproveitar bem esse gás", diz o engenheiro, acrescentando que, aliado a outras fontes, o gás poderia ajudar no abastecimento de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo.
       Outro contrasenso indicado por Santos é não se incentivar ônibus movidos à gás - e sim a diesel e etanol. "Para suprir frotas grandes como a de São Paulo seria preciso plantar muito mais cana, tirando espaço de outro tipo de lavouras."
       Segundo os especialistas, esses erros e políticas mal articuladas tiveram seu ápice há cerca de cinco anos. "O governo acabou sujando sua matriz energética ao incentivar as térmicas a óleo, que são baratas de se construir", lembra Baitelo.
       Mas essa tendência vem se revertendo, ainda que em um ritmo muito mais lento do que o esperado. "Governo viu que o foco estava errado e passou a investir um pouco mais em outras energias, como a eólica", diz o coordenador do Greenpeace.
       A participação da eólica na matriz elétrica nacional cresceu 5% em 2009. Mesmo assim, essa fonte corresponde a apenas 0,2% do total de energia gerada, enquanto tem potencial para gerar até três vezes mais do que o Brasil necessita.
       Para mudar esse cenário, falta mais incentivo do governo: "O BNDES, por exemplo, fica financiando apenas as grandes obras, como estádios para a Copa e Belomonte", afirma Santos.
       Os especialistas também criticam o baixo investimento sem ciência e pesquisa, que acabam ficando mais concentrado em áreas ligadas ao petróleo e a biocombustíveis. "O discurso oficial sempre pendeu mais para 'vamos esperar o preço cair' do que para criar legislação que incentive essas energias renováveis", diz Baitelo.
       Ele cita o fato de não haver produção nacional de painéis solares. "Se houvesse mais incentivos a esse tipo de negócio, poderíamos exportar essa tecnologia, como fazemos com o etanol."
       Tarifas especiais para quem poupa energia também são raras no Brasil. Em países europeus e asiáticos, essa iniciativa é corrente e vai além: o consumidor que usa energia solar pode vender de volta para o Estado o excedente, criando um ciclo virtuoso.
       "Incentivos e garantias ao consumidor é uma questão chave para se melhorar nossa maneira de usar energia", afirma a professora da USP, fazendo uma comparação com os carros a álcool. "Demorou um tempo para se embarcar nesse mercado. Mas se a política for mantida aos poucos, o consumidor vai vendo que é algo viável, vantajoso e passa a comprar equipamentos que economizam energia, painéis solares."

 

(BBC, G1, JC-Online)
www.fne.org.br

 

 

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