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29/11/2016

Entrevista - O olhar do engenheiro do futuro

Dinamismo. Essa é a palavra que define o engenheiro do futuro para o estudante de engenharia elétrica Fernando dos Santos Gil, 23. O jovem, que está no último semestre da graduação pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), teve a oportunidade de estudar na França por dois anos. Esteve nas melhores universidades do ramo – Université de Technologie de Compiègne (UTC) e École Polytechnique – cursando na área de biomédica, para ampliar seus conhecimentos nas diversas ramificações da engenharia, além de poder, futuramente, atuar com duplo diploma.


Foto: Rosângela Ribeiro Gil
Fernando Jéssica 
Fernando dos Santos Gil fala sobre perspectivas profissionais e como vê a engenharia.
 

De volta ao Brasil em agosto último, Santos Gil conta ao JE como foi a experiência “muito mais intensa” da vida universitária lá fora, como diz. “É muito interessante ver como as pessoas de fora pensam a engenharia, e como pensam a universidade”, salienta o estudante, que almeja trabalhar com o dinamismo que define o engenheiro do século XXI. “Somos dinâmicos e estamos conectados. Quero trabalhar em um local que eu possa continuar aprendendo, me desenvolvendo como profissional e também na vida pessoal”, diz.

Como chegou ao estudo no exterior e como foi a experiência?
Fernando dos Santos Gil - Comecei a faculdade em 2011. Em 2014, tive a oportunidade de participar do duplo diploma, que é uma parceria entre a Poli e as faculdades do exterior, por meio da bolsa Brafitec (programa federal de intercâmbio desenvolvido no âmbito de cooperação entre o Brasil e a França), voltada ao estudante de engenharia. Eu já havia feito uma pesquisa na área de biomédica e, depois, fiz uma matéria sobre e me interessei. Na hora de escolher (o intercâmbio), acabei optando pela área. E por ter feito um curso diferente do que eu via aqui no Brasil, foi uma experiência muito boa, muito proveitosa. É muito interessante ver como as pessoas de fora pensam a engenharia, e como pensam a universidade. Percebi como é diferente o papel da universidade fora do Brasil. Aqui, elas têm muito mais um papel social. Na USP, por exemplo, cheguei a dar aulas em cursinhos, lá tem curso de línguas, é voltado às pessoas. Na França, as universidades são fechadas entre elas, fechadas para o aluno ficar lá dentro e apenas estudar, a vida universitária lá é muito mais intensa. Tem aula de tudo. Se você quiser participar de uma orquestra, por exemplo, lá tem aula, te ensinam a tocar um instrumento. Aqui, temos cursos de extensão, mas só se você já demonstra certo gosto pela atividade. Eu estava numa faculdade para cinco mil pessoas que tinha muito mais atividades de extensão do que na USP, com 100 mil alunos.

Não teve vontade de ficar na França?
É bem tentador, realmente. Um professor da École Polytechnique, onde estava estagiando, convidou-me a ficar e fazer doutorado. Mas eu quis voltar ao Brasil. Além de ter que concluir o curso aqui, para conseguir o duplo-diploma, minha família está aqui e me sinto mais a vontade para morar e trabalhar.

Através da sua experiência, como você vê a graduação de engenharia nacional?
A fundamentação teórica é a mesma que vi lá fora, a base é a mesma. A maior dificuldade que tenho aqui é em conseguir um estágio. Eu não sei se não estou procurando direito (risos). A maioria das oportunidades que aparecem são em bancos, consultorias, em TI, programação. Tanto que, no momento, estou estagiando em programação. Não me sinto tão de fora, mas ainda não é a área correta para qual estou me formando. A maioria dos meus colegas está estagiando em banco ou consultoria. São raros os que conseguem em engenharia.  

Falta oportunidade para o novo engenheiro?
Particularmente, encontrei pouca oferta. Acredito que as crises que o País enfrenta recentemente tenham contribuído com isso, mas, desde que eu entrei (na faculdade) ouço esse papo (de ser difícil de conseguir estágio em engenharia). Muitos acabam ficando em um trabalho que não é na área pelos benefícios, pela estabilidade. Eu quero trabalhar com biomédica, o que é bem complicado, porque são poucas as empresas do ramo no Brasil. A segunda opção seria consultoria, que tem mais oportunidades.

Falando em crises, como a engenharia pode contribuir para a retomada necessária do crescimento do País?
Acredito que o ideal seria investir em infraestrutura. Eu morei lá fora e a diferença é gritante no transporte público, por exemplo. Em Paris, você consegue ir a qualquer lugar de metrô. E a outros países também. Fui à Barcelona pelo custo de dez euros, em torno de R$35,00. Aqui, é difícil de utilizar o transporte público para ir a bairros periféricos da cidade. Claro que o Brasil é muito maior que a França, talvez seja muito mais difícil. Mas sempre é possível melhorar. Eu vejo que aqui falta vontade de fazer.

Além do transporte, qual outra área sensível que você acha que seria necessário ter a intervenção da engenharia?
A comunicação. A diferença também é enorme. Na telefonia, por exemplo, eu pagava 20 euros, equivalente a aproximadamente R$75,00, por um plano de 50 gigas (de uso de internet no celular) por mês. No Brasil, nas maiores operadoras um plano de 30 gigas é em torno de R$ 1 mil. E além da internet, eu conseguia ligar para o Brasil, falar com meus pais. Isso aqui é praticamente impossível de se fazer dentro de um valor acessível. Para abastecer o carro também, citando outro exemplo, lá se tem tecnologia, é automatizado. São inovações voltadas para facilitar o dia a dia das pessoas. Estamos um pouco atrasados (em tecnologia) e não acredito que seja por falta de know-how, mas sim por um corporativismo, porque as pessoas não querem investir em tecnologia. Claro que isso demora, não é da noite para o dia. Mas se tivéssemos uma cultura de investir em tecnologia e as pessoas, desde a educação base, aprendessem algo a mais agregando conhecimentos e valores, elas poderiam trabalhar com a tecnologia, com a inovação.

Citando a tecnologia e a inovação, você acredita que máquinas como essa, que automatizam um posto de gasolina, não traria uma desumanização?
Acredito que não, é uma questão de mudanças de paradigmas. Na biomédica existe essa discussão, porque no futuro teremos um banco de dados imensamente completo. Um médico com 30 anos de experiência não conseguiria lembrar o equivalente ao que uma máquina programada pode armazenar de informação. Então, em alguns anos, a máquina consiga de certa forma fazer diagnósticos muito melhor do que o médico. Pode-se pensar como substituição, mas vejo isso como um auxiliar do trabalho humano. No Brasil hoje há um déficit de médicos, isso seria uma alternativa. Vejo a tecnologia em si como um agente facilitador. Estando fora do País, eu só conseguia falar com meus pais graças à tecnologia.

Como você define o Engenheiro do século XXI?
Somos mais dinâmicos com a informação, internet, tecnologia. Estamos conectados. Falo por mim e por meus colegas, temos algumas áreas de interesses, mas mais abrangentes talvez (do que engenheiros muito específicos). Dinamismo é a palavra ideal para descrevê-lo. Estamos mais interessados em aprender do que unicamente receber um salário. Quero trabalhar num local em que eu possa aprender e me desenvolver, como pessoa e como profissional, ganhando conhecimento além de dinheiro. 


Jéssica Silva
Comunicação SEESP







 

 

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