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20/09/2021

A dimensão humanista dos profissionais da engenharia

Álvaro Rodrigues dos Santos*

 

A Técnica e a Tecnologia não podem ser frias e estanques diante da vida humana. Há muitos riscos no exercício dessa dissociação, e que já trouxeram desgraças imensas à sociedade humana.

 

Choca-me e consterna-me perceber colegas de profissão incapazes de se encantar diante de uma música, de uma pintura, de um livro, de um poema, alguns até achando que esse sentimento do deslumbramento diante do belo seja mais próprio a intelectuais, gays ou malucos. Sem essa dimensão humana da Vida a quem dedicarão suas habilidades, por que crivos de julgamento submeterão suas decisões técnicas?

 

Vejo a Técnica e a Tecnologia como instrumentos do processo civilizatório maior da espécie humana, assim nunca podendo ser utilizadas com objetivos alheios a essa maravilhosa dimensão. O próprio equacionamento físico das soluções tecnológicas adotadas responderá sempre às visões que o profissional tenha sobre o mundo e a sociedade dos Homens. E essas soluções deverão servir, não limitada e falseadamente a interesses locais de lucro ou qualquer outra mesquinhez, mas sempre a uma entidade impessoal e maior, a Humanidade.

 

Em resumo, o que nos falta hoje é justamente o que por aí andam pregando como desnecessário (ou adjetivações mais agressivas e estúpidas), qual seja a reimpregnação de valores humanistas ao nosso ensino de ciências exatas. Um engenheiro, um físico, um geólogo, um arquiteto, um agrônomo, um médico, etc., devem sair da Universidade sabendo exatamente que sua ação profissional interferirá inexoravelmente com a vida de seus semelhantes. Deverá saber, mesmo nos pequenos espaços profissionais que lhe sobrem, que a ele se apresentarão opções de escolha sobre essa ou aquela abordagem profissional que seja melhor ou pior frente aos referenciais de uma sociedade que tenha como pilares os valores da dignidade espiritual e material de todos seus cidadãos. Ou escolhas que se definirão pelo exercício da compaixão humana, atributo maior do Homem civilizado.

 

Não é apenas sua competência de profissionalização técnica dos alunos que caracteriza uma verdadeira Universidade, mas também sua capacidade complementar de provê-los de uma formação critica e de uma visão humanista sobre o horizonte maior de suas profissões.

 

Ou seja, caros amigos, as coisas devem se colocar justamente no caminho inverso dos apelos pragmáticos e tecnicistas que hoje são lançados pelo atual governo e seus apoiadores sobre o mundo da Educação. Na verdade, poderíamos dizer que hoje no Brasil o campo educacional das ciências exatas pede socorro ao seu campo complementar das ciências humanas, é preciso que os valores humanistas e iluministas voltem a fazer parte e dar sentido humano, social e civilizatório às carreiras profissionais tidas como do mundo das exatas. A separação entre esses dois mundos somente interessa àqueles que vêem a sociedade humana a partir de seus próprios umbigos e, egoistamente, a partir de seus interesses pessoais, sem qualquer preocupação de ordem humana e social. Se, ao contrário, alimentamos uma visão social de integração e felicidade entre os seres humanos, não poderemos nunca admitir a dicotomia e a independência entre o mundo das ciências exatas e o mundo das ciências humanas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

*Álvaro Rodrigues dos Santos (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.), é consultor em Geologia de Engenharia, Geotecnia e Meio Ambiente. Foi ex-diretor de Planejamento e Gestão do IPT e ex-diretor da Divisão de Geologia. Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Diálogos Geológicos”, “Cubatão”, “Enchentes e Deslizamentos: Causas e Soluções”, “Manual Básico para Elaboração e Uso da Carta Geotécnica”, “Cidades e Geologia”.  

 

 

 

 

 

 

 

 

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