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30/01/2015

Fórum Social Mundial fortalece movimentos na Tunísia

Enquanto entidades brasileiras debatem qual o significado atual do Fórum Social Mundial para o País, na África, especialmente na região do Magreb-Machrek (países árabes), ele tem desempenhado um papel fundamental no fortalecimento dos movimentos sociais locais e, consequentemente, da participação população no processo de democratização daqueles países. É o que contaram representantes dos comitês locais da Tunísia e Marrocos na mesa “O sentido do Fórum Social Mundial hoje”, ocorrida no “Seminário FSM Rumo a Túnis”, em Salvador (BA), na manhã de sexta-feira (23/1).


Foto: Deborah Moreira

mesa soraya


Fazer um fórum na Tunísia em 2013 foi algo natural diante do quadro sócio-político gerado pelos protestos ocorridos desde dezembro de 2010, que deflagraram a chamada Primavera Árabe. Na prática, significou a derrubada dos governos ditatoriais tunisiano e egípcio, mas ainda existem os partidos conservadores, de cunho religioso, corruptos e que exercem grande influência na política.

Agora, levar novamente o megaevento ao país – de 24 a 28 de março - é estratégico. Nos últimos quatro anos, apesar de alguns avanços, a situação econômica piorou muito no continente africano, que sente os impactos negativos da crise do capital no continente europeu. Desemprego crescente, principalmente entre os jovens, aumento do número de migrações, da violência – como os assassinatos em massa cometidos pelo grupo radical nigerianos Boko Haram -, das guerras, e a repressão aos movimentos sociais no Marrocos e Egito.

Segundo o marroquino Hamouda Soubhi, diretor executivo da Rede Marroquina das ONGS Européias e Mediterrâneas e co-fundador no Marrocos do Fórum das Alternativas do Sul, os grupos financiados pelos conglomerados que controlam o petróleo no Golfo Pérsico, “quer seja pelo Qatar, Arábia Saudita, quer seja por países europeus e americanos, continuam a agir contra a igualdade para as mulheres, contra qualquer forma de mudança”.

“Piorou muito a situação do imigrante subsaariano. O Mar Mediterrâneo se tornou um cemitério, milhares de pessoas morrem tentando atravessar para a Europa. O fórum é um espaço vital para os movimentos sociais, para a promoção dos direitos sociais, econômicos, ambientais, para encontrar alternativas ao neoliberalismo”, afirmou Soubhi.

Ele lembra que foi graças ao apoio de organizações sociais sólidas, de mulheres, de direitos humanos e sindicais estruturadas que os jovens na Tunísia e Egito saíram às ruas. E que foram essas novas mobilizações como occupys e indignados que geraram um contraponto ao poder dominante, e que só a unidade na ação é que poderá levar a novos avanços progressistas. O representante das entidades do Marrocos frisou a importância de fortalecer as lutas da região como a libertação da Palestina e dos saarauis, citando uma ação que existe desde 2006, chamada ‘Iniciativas para a paz no Saara Ocidental’, que envolve saarauis, tunisianos e pessoas da Mauritânia.

“Se não houver unificação das lutas não poderemos fazer isso. Venham para Tunis para trabalhar conosco em nossas aspirações, somos fracos mas somos fortes com nossas idéias”, exclamou.

Nova constituição
O antropólogo tunisiano Alaa Talbi, membro do Fórum Tunisiano de Direitos Econômicos e Sociais e um dos organizadores do comitê local do FSM Tunísia, elencou pontos positivos resultantes das mobilizações sociais, principalmente depois da crise que o país viveu em julho de 2013, quando foram assassinados o líder de um dos partidos de oposição, Mohammed Brahmi e, dias depois, oito militares.

Um saldo positivo concreto do FSM Tunísia de 2013 foi a mediação de integrantes do comitê de organização do evento na articulação por uma nova constituição, oriundos da central sindical Ação Central de Trabalhadores da Tunísia, da Liga Tunisiense para a Defesa dos Direitos Humanos e de uma organização de advogados (semelhante à OAB). “Eles construíram uma agenda política que conseguiu levar a formalização da nova constituição”, conta Talbi, que noticiou em primeira mão que quatro membros dessas organizações integram o novo governo – como ministros da Justiça, da Condição Feminina, da Cultura e das Relações com a Sociedade Civil - sendo duas mulheres e dois homens.

Foi em janeiro de 2014, após dois anos de debates, que o país ganhou uma nova constituição mais progressista, que tem o Islã como religião, mas estabelece a liberdade de crença e consciência. O texto constitucional institui a igualdade entre homens e mulheres, assim como a paridade de representação nas assembleias políticas, e a liberdade de expressão e de opinião, concede autonomia ao poder judiciário.

Outro avanço que ele chamou atenção foi a definição de que o povo é o detentor dos recursos naturais. A questão ambiental vem ganhando espaço nos debates e terá seu 1º Fórum Social Temático da Tunísia, no sábado (31/1) e domingo (1º de fevereiro).

“Estamos tentando construir e definir o papel dos movimentos sociais nestes últimos anos. Fazemos uma distinção entre os que são estruturados, administrados pelas centrais sindicais, e os espontâneos que não pararam em 2014. Mais de uma centena de movimentos na Tunísia estão passando da fase de contestação para a de proposição”, conta o antropólogo.

O representante tunisiano mencionou que a organizações da região têm consciência de que será preciso, muito em breve, aprofundar as mudanças sociais e econômicas. Essas questões vêm sendo tratadas de forma sistemática e acabaram resultando na primeira Assembleia dos Movimentos Sociais da Tunísia, ocorrida em 9 de janeiro, reunindo trabalhadores informais, mulheres operárias, principalmente do setor têxtil, e outros segmentos que se reuniram pela primeira vez.

“O fórum vai desempenhar um papel de extrema importância na consolidação da mobilização social, sobretudo, na próxima fase que denominamos como a descentralização do poder, nas eleições de associações locais previstas para outubro deste ano. E o poder político local dá um lugar muito importante a sociedade civil, não somente como mera observadora, mas com direito de voto”, concluiu, acrescentando: “A presença de vocês é um aporte real para o nosso processo de democratização na Tunísia e em toda África, para a aquisição de novas competências em justiça social, educação popular e educação ambiental.”

Brasil
A educadora Sheila Ceccon, do Instituto Paulo Freire, recuperou o histórico do processo brasileiro do FSM no último ano que resultou na realização do seminário em Salvador. Para ela, é importante que os debates que acontecerão em Túnis e nos próximos fóruns mundiais também ocorram em diferentes regiões, em fóruns descentralizados, temáticos, estaduais, latino-americanos, incluindo novos atores.

“Ficou muito claro para todos que estão discutindo que há um recrudescimento do capitalismo, mundialmente falando, desde que o FSM foi criado. É importante a sociedade civil do planeta dar uma resposta a isso. Então, foi consensual a importância em participar do fórum e planejar fóruns com formatos diferentes”, explicou.

As organizações do Brasil decidiram participar do FSM da Tunísia com quatro temas: mecanismos de construção da democracia participativa; enfrentamento ao racismo, xenofobia e reparações; sociedade civil planetária e pós-2015; e nos debates do Fórum Mundial de Mídia Livre.

A questão ambiental também foi uma tônica em sua fala: “É urgente que todos nós demos mais atenção às questões socioambientais. O fórum pode ser um espaço de enfrentamento da coisificação da vida. A gente vive hoje em um mundo onde comemos alimentos envenenados, veneno que é posto em nossa comida e parece que é visto como algo normal. Não há um enfrentamento, não há uma discussão nessa mídia, que não nos representa”.




Deborah Moreira
Imprensa SEESP






Enquanto entidades brasileiras debatem qual o significado atual do Fórum Social Mundial para o País, na África, especialmente na região do Magreb- Machrek (países árabes), ele tem desempenhado um papel fundamental no fortalecimento dos movimentos sociais locais e, consequentemente, da participação população no processo de democratização daqueles países. É o que contaram representantes dos comitês locais da Tunísia e Marrocos na mesa “O sentido do Fórum Social Mundial hoje”, ocorrida no “Seminário FSM Rumo a Túnis”, em Salvador (BA), na manhã de sexta-feira (23/1).

Fazer um fórum na Tunísia em 2013 foi algo natural diante do quadro sócio-político gerado pelos protestos ocorridos desde dezembro de 2010, que deflagrou a chamada Primavera Árabe. Na prática, significou a derrubada dos governos ditatoriais tunisiano e egípcio, mas ainda existem os partidos conservadores, de cunho religioso, corruptos e que exercem grande influência na política.

Agora, levar novamente o megaevento ao país – de 24 a 28 de março - é estratégico. Nos últimos quatro anos, apesar de alguns avanços, a situação econômica piorou muito no continente africano, que sente os impactos negativos da crise do capital no continente europeu. Desemprego crescente, principalmente entre os jovens, aumento do número de migrações, da violência – como os assassinatos em massa causados pelo grupo radical nigerianos Boko Haran -, das guerras, e a repressão aos movimentos sociais no Marrocos e Egito.

Segundo o marroquino Hamouda Soubhi, diretor executivo da Rede Marroquina das ONGS Européias e Mediterrâneas e co-fundador no Marrocos do Fórum das Alternativas do Sul, os grupos financiados pelos conglomerados que controlam o petróleo no Golfo Pérsico, “quer seja pelo Qatar, Arábia Saudita, quer seja por países europeus e americanos, continuam a agir contra a igualdade para as mulheres, contra qualquer forma de mudança”.

“Piorou muito a situação do imigrante subsaariano. O Mar Mediterrâneo se tornou um cemitério, milhares de pessoas morrem tentando atravessar para a Europa. O fórum é um espaço vital para os movimentos sociais, para a promoção dos direitos sociais, econômicos, ambientais, para encontrar alternativas ao neoliberalismo”, afirma Soubhi.

Ele lembra que foi graças ao apoio de organizações sociais sólidas de mulheres, de direitos humanos e sindicais estruturadas que os jovens na Tunísia e Egito saíram às ruas. E que foi todo essas novas mobilizações occupys e indignados que geraram um novo contraponto ao poder dominante e que só a unidade na ação é que poderá gerar novos avanços progressistas. O representante das entidades no Marrocos frisou a importância em fortalecer as lutas da região como a libertação da Palestina e dos saarauis, no Marrocos, citando uma ação que existe desde 2006, chamada ‘Iniciativas para a paz no Saara Ocidental’, que envolve saarauis, tunisianos e pessoas da Mauritânia.

“Se não houver unificação das lutas não poderemos fazer isso. Venham para Tunis para trabalhar conosco em nossas aspirações, somos fracos mas somos fortes com nossas idéias”, exclamou.

O antropólogo tunisiano Alla Talbi, membro do Fórum Tunisiano de Direitos Econômicos e Sociais e um dos organizadores do comitê local do FSM Tunísia, elencou pontos positivos  resultantes das mobilizações sociais, principalmente depois da crise que o país viveu em julho de 2013, quando foram assassinados o líder de um dos partidos de oposição,  Mohammed Brahmi e, dias depois, oito militares.

Um saldo positivo concreto do FSM Tunísia de 2013 foi a mediação de integrantes do comitê de organização do evento na articulação por uma nova constituição, oriundos da central sindical Ação Central de Trabalhadores da Tunísia, da Liga Tunisiense para a Defesa dos Direitos Humanos e de uma organização de advogados (semelhante à OAB). “Eles construíram uma agenda política que conseguiu levar a formalização da nova constituição”, conta Talbi, que noticiou em primeira mão que quatro membros dessas organizações integram o novo governo – como ministros da Justiça, da Condição Feminina, da Cultura e das Relações com a Sociedade Civil -  sendo duas mulheres e dois homens.

 Em janeiro de 2014, após dois anos de debates, o país ganhou uma nova constituição mais progressista, em que tem o islã como religião, mas estabelece a liberdade de crença e consciência. O texto constitucional institui a igualdade entre homens e mulheres, assim como a paridade de representação nas assembléias políticas, e a liberdade de expressão e de opinião, concede autonomia ao poder judiciário.

Outro avanço que ele chamou atenção foi a definição de que o povo é o detentor dos recursos naturais. A questão ambiental vem ganhando espaço nos debates e que terá  seu 1º Fórum Social Temático da Tunísia, no sábado (31/1) e domingo (1º de fevereiro).

“Estamos tentando construir e definir o papel dos movimentos sociais nesses últimos anos. Fazemos uma distinção entre os que são estruturados, administrados pelas centrais sindicais, e os espontâneos que não pararam em 2014. Mais de uma centena de movimentos na Tunísia estão passando da fase de contestação para a de proposição”, conta o atropólogo.

O representante tunisiano mencionou que a organizações da região têm consciência de que será preciso, muito em breve, aprofundar as mudanças sociais e econômicas. Essas questões vêm sendo tratada e forma sistemática que resultou na primeira Assembleia dos Movimentos Sociais da Tunísia, ocorrida em 9 de janeiro, que reuniu os trabalhadores informais, mulheres operárias, sobretudo no setor têxtil, e outros segmentos que se reuniram pela primeira vez.

“O fórum vai desempenhar um papel de extrema importância na consolidação da mobilização social, sobretudo, na próxima fase que denominamos a descentralização do poder e para as eleições de associações locais previstas para outubro deste ano. E o poder político local dá um lugar muito importante a sociedade civil, não somente como um mero observador, mas com direito de voto”, concluiu, acrescentando: “A presença de vocês é um aporte real para o nosso processo de democratização na Tunísia e em toda África, para a aquisição de novas competências em justiça social, educação popular e educação ambiental.”

Brasil
A visão sob o olhar das organizações brasileiras foi dada educadora Sheila Seccon, do Instituto Paulo Freire, que recuperou o histórico do processo brasileiro no último ano que resultou na realização do seminário em Salvador. Para ela, é importante que os debates que acontecem nos fóruns mundiais também ocorram em diferentes regiões, em fóruns descentralizados, temáticos, estaduais, latino-americanos, incluindo novos atores.

“Ficou muito claro para todos que estão discutindo que há um recrudescimento do capitalismo, mundialmente falando, desde que o FSM foi criado, e a importância da sociedade civil do planeta dar resposta a isso. Então, foi consensual a importância em participar do fórum e planejar fóruns com formatos diferentes”, explica.

As organizações do Brasil decidiram participar do FSM da Tunísia com quatro temas: mecanismos de construção da democracia Participativa; enfrentamento ao racismo, xenofobia e reparações;  Sociedade civil planetária e pós-2015; e nos debates do Fórum Mundial de Mídia Livre.

A questão ambiental também foi uma tônica em sua fala: “É urgente que todos nós darmos mais atenção às questões socioambientais. O fórum pode ser um espaço de enfrentamento da coisificação da vida. A gente vive hoje em um mundo onde comemos alimentos envenenados, é veneno que é posto em nossa comida e parece que é visto como algo normal. Não há um enfrentamento, não há uma discussão nessa mídia, que não nos representa”.
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