A ONU coletou a promessa ambiental de 80 países e chegou à conclusão de que ainda falta muito para que o acordo feito em Copenhague, de evitar a todo custo que se chegue ao aumento de dois graus centígrados na temperatura do planeta, se materialize.
Editorial do Valor Econômico.
17/12/2010
"A continuidade das negociações internacionais para um acordo climático sobreviveu por um fio em Cancún e continua ameaçada"
Leia o editorial:
Após o desastre da reunião de Copenhague no ano passado, o ímpeto para atacar o problema do aquecimento global desvaneceu ao mesmo tempo em que as condições para que isso ocorra pioraram. Na ausência de avanços significativos na capital dinamarquesa, houve um retrocesso em toda a linha.
Alguns progressos obtidos no México, ainda que sejam mais expressão de intenções do que fatos, permitiram que a possibilidade de um entendimento ainda exista. Ela será testada em Durban, na África do Sul, em 2011.
Mas o espectro de um final melancólico para o protocolo de Kyoto e a pavorosa perspectiva de que seja substituído por um vazio diplomático continuam rondando as negociações do clima da Organização das Nações Unidas. O Japão, país sede do protocolo, agora se coloca explicitamente contra sua continuidade nos termos originais convencionados em 1997.
Ao enlaçar 40 nações industrializadas com cortes pífios de 5,3% das emissões em relação ao nível existente em 1990, o protocolo foi um marco na luta contra o aquecimento global. Com o tempo, porém, suas limitações tornaram-se evidentes, especialmente porque os principais atores não o subscreveram. EUA e China, os dois maiores emissores de gases de efeito estufa do planeta, não estão sob a influência de Kyoto.
Os países emergentes ficaram livres de compromisso e os EUA caíram fora do acordo. A Rússia, que permitiu a existência do protocolo mesmo sem a sanção dos EUA, hoje ataca sua permanência em uma segunda fase.
Os EUA continuarão perigosamente fora do jogo da diplomacia do clima provavelmente até 2013, quando poderá haver uma mudança no equilíbrio das forças internas no Congresso americano, que é quem detém de fato o poder de decisão. Os EUA estavam de mãos amarradas em Copenhague em 2009, à espera da votação de seu plano de combate às emissões de carbono, e sua atitude descompromissada foi uma das causas do fracasso da COP-15.
As coisas pioraram significativamente para o governo de Barack Obama depois disso. Os republicanos reconquistaram maioria na Câmara, avançaram no Senado e tornaram inviável qualquer iniciativa oficial na área ambiental até que os democratas recobrem força nas próximas eleições legislativas e Obama consiga se reeleger com folga.
É possível fazer um acordo climático sem a participação da maior economia do planeta e da segunda maior nação poluidora? Não, e por isso Kyoto, que expira em 2012, corre risco de acabar sem que um acordo o substitua tempestivamente. O cronograma até Durban marcará uma nova corrida contra o relógio para arrancar um compromisso eficaz para deter o aquecimento global.
Cancún entrou na lógica das coisas como uma ponte para que as negociações não fossem interrompidas. Desse ponto de vista, modesto nas intenções, a CoP-16 fez seu serviço. China e Índia, nações que vociferavam contra acordos legalmente vinculantes com metas de redução das emissões em Copenhague, parecem ter mudado de ideia.
Agora aceitam, pelo menos, a inspeção internacional dos cortes de emissões, um dos pontos amarrados em Cancún. Ainda que evitem ser restritos por metas, os chineses se movem rapidamente em direção às tecnologias limpas, das quais pretendem ser líderes de mercado em uma década. A retórica indiana tornou-se amena.
Ainda assim, os temas para os quais houve acordo, como Fundo Climático para financiar a adaptação dos países em desenvolvimento às mudanças climáticas e a aceitação de que a preservação das florestas (Redd, a redução das emissões por desflorestamento e degradação) precisa ser remunerada, consumiram longos dias de reuniões e não chegaram a definições cruciais para que se tornem operacionais.
A ONU coletou a promessa ambiental de 80 países e chegou à conclusão de que ainda falta muito para que o acordo feito em Copenhague, de evitar a todo custo que se chegue ao aumento de dois graus centígrados na temperatura do planeta, se materialize.
Não se avançou um milímetro em Cancún nas metas de cortes das emissões. Houve o progresso suficiente para indicar que um acordo internacional é até possível. É muito pouco para a urgência que o aquecimento global requer e é o máximo que se conseguiu após o naufrágio das esperanças em Copenhague.
(Editorial do Valor Econômico)
www.cntu.org.b