Em maio de 2004 o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, Eleno José Bezerra, já falecido, encaminhou uma “Carta aberta ao companheiro Lula”, então presidente da República. Trechos dessa carta estão reproduzidos no livro de Evaldo Vieira, “A República Brasileira 1951-2010”, de 848 páginas, recentemente publicado pela Cortez Editora.
Depois de criticar supreendentemente a nomeação de dezenas de sindicalistas para cargos operacionais importantes nos ministérios (por falta de conhecimento deles da máquina administrativa), Eleno continuava: “Entendo também que herdamos uma situação muito difícil do governo anterior. Passamos boa parte do segundo mandato do governo passado criticando a política econômica ortodoxa, baseada em juros altos para supostamente manter a estabilidade econômica e pagar os juros da dívida, conforme determinado pelo FMI (...) Mas cadê a nova política econômica anunciada em seu programa de governo? Seu ministro da Fazenda, um médico honesto e tranquilo, parece refém de uma equipe econômica mais radical e ortodoxa do que a que foi derrotada nas urnas. Seu presidente do Banco Central é um ex- banqueiro extremante talentoso e competente – mas para garantir ganhos para os bancos, não para os cidadãos trabalhadores”.
A história, desde 2004 é conhecida por todos, com suas marchas, contramarchas e reviravoltas. Havia razões nas críticas de Eleno? E quais? Mas, quero ressaltar duas coisas.
Em primeiro lugar a persistência do poder dos rentistas de 2004 até hoje, afirmado seja como resistência, seja como imposição.
Em segundo lugar, e isso deve nos servir de lição, o tom elegante da carta de Eleno, firme nas críticas, mas sereno na forma. Para ser contundente não é preciso “perder la ternura”.
* João Guilherme Vargas Netto, consultor sindical