O Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio cogita de elevar a tarifa de importação de aço como forma de proteger os produtores locais e evitar o aumento das importações, especialmente as oriundas da China.
Não deixa de ser um contrassenso falar em proteção às importações quando, finalmente, se conta com uma taxa de câmbio considerada adequada para a produção local, bem ao contrário do cenário observado no último decênio, anterior a 2015, em que a valorização artificial da moeda provocava um incentivo às importações.
É certo que estruturalmente não houve alteração substancial na competitividade sistêmica, ou seja, todos os fatores, como custo do capital (juros), de logística e infraestrutura e burocracia, continuam maiores que a média dos nossos países competidores. O sistema tributário complexo e desequilibrado continua igualmente sendo desfavorável a quem produz no Brasil.
Especificamente para a indústria siderúrgica, há um problema adicional: o excedente da produção mundial, especialmente depois da crise nos países centrais e da desaceleração do crescimento chinês. A consequência é uma capacidade ociosa de produção, um excedente de oferta potencial estimado em 700 milhões de toneladas.
Para a indústria siderúrgica brasileira, cuja produção é da ordem de 33 milhões de toneladas ao ano, a situação de sobreoferta internacional representa um enorme desafio. Primeiro, porque não usufruímos de economia de escala, em razão da baixa participação no mercado global; segundo, porque ela padece dos mesmos problemas advindos do ambiente de negócios pouco competitivo no Brasil e que, consequentemente, afetam todos os segmentos industriais.
É nesse contexto que surgiu recentemente a proposta de elevação das tarifas de importação de aço, como uma forma de proteger a indústria siderúrgica local relativamente aos seus competidores internacionais. O excedente de oferta mundial também tem aberto espaço para práticas desleais de comércio por parte de competidores internacionais, inclusive o dumping, o que deve ser combatido com os instrumentos adequados de defesa comercial.
A proposta de elevar a tarifa de importação de aço, embora possa soar como benéfica para os produtores siderúrgicos, inviabilizaria segmentos relevantes da indústria de transformação brasileira. Como o aço é insumo de várias cadeias produtivas, o aumento de suas tarifas de importação criaria um "guarda-chuva" para a elevação dos preços dos produtores locais, onerando os fabricantes de produtos finais.
O quadro atual tarifário já revela uma distorção, uma vez que a alíquota de importação do aço é de 12%, enquanto a de máquinas e equipamentos, por exemplo, que utilizam o aço como insumo de fabricação de seus produtos, é de cerca de 8%. Isso denota a necessidade de uma ampla reforma tarifária que favoreça a geração local de valor, ou seja, tributando mais os produtos finais do que seus insumos de produção.
Um conjunto de 14 associações e sindicatos da indústria publicou recentemente um alerta em forma de manifesto apontando os problemas decorrentes da elevação tarifária no aço.
Embora todos os setores devam contar com condições isonômicas de competitividade, além de instrumentos contra as práticas desleais de comércio, a elevação de tarifas, no caso, não representa uma solução.
Isso porque, além de desfocada da questão principal, que é a canibalização do mercado provocada pelo excedente mundial de oferta, adicionalmente geraria elevação de custos e perda de competitividade para setores igualmente relevantes para o País, como os fabricantes de máquinas e equipamentos, eletroeletrônicos, automóveis, construção civil, entre outros.
A solução estrutural para o problema está em garantir condições de competitividade sistêmica para a indústria como um todo. Vale unir esforços na elaboração e na implementação de uma política industrial e comercial que leve em conta os desafios para reverter a desindustrialização em curso.
* Por Antonio Corrêa de Lacerda, professor-doutor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e consultor. Artigo publicado, originalmente, no jornal O Estado de São Paulo, em 8 de janeiro de 2016