Venda de trabalho intelectual representará 40% das vendas externas da subsidiária brasileira.
Não é à toa que a direção da General Motors julga que a subsidiária brasileira estará em boas mãos se comandada por talentos da engenharia. Afinal, essa filial tem elevado a receita com a exportação de serviços de engenharia, seja de veículos completos ou partes deles. A venda do trabalho intelectual dos que projetam os carros no Brasil vai somar este ano US$ 500 milhões, o que representará 40% das exportações da montadora, segundo Jaime Ardila, presidente da GM na América do Sul. Os serviços de engenharia que hoje ocupam um espaço que tradicionalmente pertencia aos carros nas vendas externas, trazem um alento aos executivos, desanimados ao ver a valorização do real dificultar a venda de produtos fabricados no Brasil em outros países.
Já faz algum tempo que a filial brasileira passou a assumir parte dos projetos antes executados por engenheiros da matriz. A crise econômica nos Estados Unidos, que se seguiu aos problemas financeiros que quase levaram a GM à falência, acelera a transferência dos trabalhos de engenharia às filiais com essa competência.
Em São Caetano do Sul (SP), sede da empresa no Brasil, está um dos cinco centros de desenvolvimento da GM em todo o mundo. Os demais estão nos EUA, Alemanha, Coreia do Sul e Austrália. O trabalho em conjunto é feito por meio de teleconferências diárias - em horários que seguem um rodízio para variar a equipe que ficará acordada de madrugada. Dessa forma são distribuídos os papéis de cada um.
Um dos centros pode ficar com a missão de criar, por exemplo, apenas o parachoque de um carro que será vendido nos EUA. Outro pode assumir o projeto completo de um veículo destinado a um único mercado ou fazer o embrião do carro que será vendido em todas as regiões emergentes.
O centro de São Caetano foi o cenário usado ontem para apresentar à imprensa a executiva que acaba de assumir a presidência da filial brasileira. Sentada ao lado de Jaime Ardila, seu chefe, Grace Lieblein, mostrou desenvoltura, simpatia e esforço para tentar entender as perguntas em português. Com pai cubano, que trabalhou na GM, e mãe nicaraguense, a americana, que acaba de passar dois anos na presidência da GM no México, arriscou um portunhol,
Grace representa a segunda tentativa da GM para deslocar um de seus talentos da área de engenharia para o comando da filial brasileira. A primeira não deu certo. A também engenheira mecânica americana Denise Johnson voltou para os Estados Unidos menos de seis meses depois de assumir o cargo. Saiu sem dar muitas explicações e agora trabalha na gerência de uma fábrica da Caterpillar na região de Chicago.
Lieblein pareceu muito à vontade em seu quase habitat natural. A mesa reservada para a executiva dar a sua primeira entrevista no Brasil foi colocada no meio de um enorme galpão do centro de desenvolvimento onde o acesso de jornalistas só foi liberado por meio dos carros e motoristas da GM.
A área dos futuros projetos evidentemente ficou longe dos olhares e, principalmente, das câmeras da imprensa. Por ali também não passou nenhum dos 1.450 engenheiros que compõem a equipe de criação Os 650 que trabalham no desenvolvimento dos protótipos também estariam muito ocupados - ou escondidos.
Jaime Ardila e Grace Lieblein, antigos colegas de um curso de treinamento que a GM fez nos Estados Unidos há mais ou menos oito anos, segundo os cálculos da executiva, estavam no meio de dois protótipos que nasceram em São Caetano do Sul e acabam de retornar do salão do automóvel de Buenos Aires: o utilitário esportivo Colorado e o sedã Cobalt."Cuidado para não mexer demais nas peças internas, que ainda não são verdadeiras", avisou o vice-presidente da empresa, Marcos Munhoz.
Os dois veículos têm jeito de produtos prontos para o consumo. Mas, segundo a direção da montadora, poderá haver modificações internas e externas até a data do lançamento. A passagem pela feira em Buenos Aires foi uma maneira de começar a testar a opinião do consumidor.
Lieblein disse que nos próximos 18 meses a GM lançará nove veículos no Brasil. Trata-se do maior resultado do programa de investimento de R$ 5 bilhões, entre 2008 e 2012. Ao dizer que viverá "os momentos emocionantes" da conclusão do programa, a executiva revelou que está agora envolvida na elaboração do próximo plano de investimentos para cinco anos a partir de 2012.
A nova presidente da GM não arriscou muitos detalhes em suas respostas. Ela praticamente acaba de começar o trabalho. Assumiu o posto no dia 1º de junho. Mas desde então ainda retornou aos Estados Unidos para um rápido descanso e para providenciar a documentação necessária para tirar o visto de trabalho no Brasil. A profissão escolhida cerca a executiva por todos os lados. A filha ficou em Nova York para concluir os estudos universitários - em engenharia. O marido mudou-se com ela para o Brasil e já está trabalhando na GM - na engenharia, claro!
(Valor Econômico)
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