Rosângela Ribeiro Gil
O professor José Roberto Cardoso, do Departamento de Engenharia de Energia e Automação Elétricas da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) e coordenador do Conselho Tecnológico do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo – entidade que representa mais de 300 mil profissionais paulistas –, faz observações pertinentes, nesta entrevista especial, sobre o Currículo Lattes e o mercado de trabalho brasileiro.
Foto: Beatriz Arruda/SEESP
Professor José Roberto Cardoso, da Poli-USP.
Professor, recentemente o Currículo Lattes foi alvo de algumas polêmicas por causa de informações incorretas incluídas por algumas pessoas na plataforma pessoal. Por isso, vale a pergunta: como é o sistema?
Ele é um formulário criado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), na década de 1990, para padronizar o currículo Vitae dos professores universitários e pesquisadores, pois cada um adotava um modelo e complicava muito as avaliações quando era necessário consultar esse documento. Isso facilitou muito as análises de projetos e bolsas de estudo.
Quando o profissional precisa criar o seu perfil Lattes, como os engenheiros?
Como falei ele foi criado para ser dedicado à área acadêmica, quando os profissionais de engenharia e de outra área querem trabalhar na educação superior ou desenvolver pesquisas.
Isso pode mudar?
Creio que a plataforma está adquirindo uma visibilidade muito grande nos últimos tempos e tende a se expandir com relação ao mercado. Acredito que, muito em breve, as escolas e também as indústrias poderão ter um Currículo Lattes similar ou específico com as competências dos diversos segmentos industriais. Num futuro próximo isso se estenderá para todas as redes profissionais. São projetos que a gente ouve falar, mas até agora não tivemos nenhuma iniciativa nesse sentido. Espero que isso ocorra, porque assim nós podemos ter algum tipo de padronização e isso facilitaria muito as avaliações e contratações de profissionais pelas empresas para realizar algum trabalho de pesquisa que for necessário.
Como se dá a consulta ao formulário do CNPq?
O Lattes é consultado por diversas áreas. Por exemplo, por empresas para avaliar se o profissional da área acadêmica ou da área de pesquisa tem a competência que elas estão procurando para desenvolver algum projeto ou pesquisa. O Metrô de São Paulo quando precisa fazer um estudo especial levanta nomes de pesquisadores e verifica suas competências na plataforma do CNPq. Nela, vai encontrar se o pesquisador tem publicações naquela área, se já orientou trabalhos de formatura, de mestrado ou doutorado sobre o assunto e assim por diante. Acredito que o Lattes pode ser utilizado por recrutadores dessa forma.
Qual a credibilidade da plataforma?
O Currículo Lattes é um documento que tem fé pública. Isso quer dizer que o que está escrito lá tem que ser, de fato, a realidade. Se alguém incluir informações não reais está sujeito a punições civis. É importante destacar isso. Ou seja, precisa-se retratar exatamente aquilo em que você tem competência e mostrar como os saberes foram adquiridos de forma verdadeira. Além disso, ele deve ser bem organizado, sobretudo na parte em que indica projetos. Nessa parte, precisa-se relacionar os projetos realizados, e essa descrição precisa ser concisa e a mais precisa possível. A dica é tomar muito cuidado com o que se escreve e evidentemente retratar a realidade daquilo que é a sua vida acadêmica.
Histórico
No final da década de 1990, o CNPq contratou os grupos universitários Stela, vinculado à Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e C.E.S.A.R, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), para que, juntamente com profissionais da empresa Multisoft, e técnicos das Superintendências de Informática e Planejamento, desenvolvessem uma única versão de currículo capaz de integrar as já existentes.
Assim, em agosto de 1999, o Conselho lançou e padronizou o Currículo Lattes como sendo o formulário de currículo a ser utilizados no âmbito do Ministério da Ciência e Tecnologia e CNPq. Desde então, o Currículo Lattes vem aumentando sua abrangência, sendo utilizado pelas principais universidades, institutos, centros de pesquisa e fundações de amparo à pesquisa dos estados como instrumento para a avaliação de pesquisadores, professores e alunos.
Quem foi Lattes
A plataforma leva o nome de um dos maiores cientistas brasileiros, o físico Césare Mansueto Giulio Lattes (1924-2005). Mais conhecido como César Lattes, tornou-se um ícone na produção científica mundial e um símbolo, para o Brasil, que serviu de inspiração e estímulo para as gerações seguintes.
Lattes, no período da Segunda guerra mundial, iniciou pesquisas que contribuiriam para o avanço da ciência em relação à estrutura atômica. A descoberta do "méson pi"(partícula efêmera, com massa entre a do elétron e a do próton) foi essencial para os estudos sobre radiação. Para efetuar suas pesquisas, Lattes, com notável espírito empreendedor, montou o laboratório de Chaclataya, na Bolívia. Em parceria com outros pesquisadores, obteve importantes avanços como a reprodução artificial dos píons.
As contribuições de Lattes não se restringem ao meio acadêmico, no período de 1945 e 1956, houve uma forte interseção entre ciência e política. Em 1946, criou o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), o primeiro centro independente para pesquisa em física, agora ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia. Teve grande atuação em universidades como a Universidade de São Paulo (USP), na cátedra do Departamento de Física da Faculdade de Filosofia, em que implantou o laboratório de emulsões nucleares, e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), na direção do Departamento de Cronologia, Raios Cósmicos e Altas Energias do Instituto de Física, onde montou o laboratório de Síncroton.
* As informações constantes nos itens “Histórico” e “Quem foi Lattes” são do site do CNPq.