Privacidade e definição de como informações serão usadas são pontos exigidos pela nova lei.
Rosângela Ribeiro Gil
Oportunidades na Engenharia
Desde setembro de 2020, está em vigor a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) em todo o território nacional e obrigatória para todos os segmentos públicos e privados, que devem, até maio próximo, realizarem e formalizarem processos que garantam a proteção de informações coletadas. A nova legislação deve ser cumprida também pelos profissionais de Recursos Humanos, empresas e consultorias de recrutamento e seleção (R&S). A lei prevê diversas penalizações, conforme artigo 52, que vão desde advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas; multa simples, de até 2% do faturamento, excluídos os tributos, limitada, no total, a R$50 milhões por infração; multa diária, observado o limite total acima descrito; até suspensão do funcionamento do banco de dados e proibição parcial ou total do exercício da atividade de tratamento de dados.
O primeiro passo para o melhor cumprimento da lei é entender o que é a LGPD e quais as mudanças que ela impõe. Como explica a advogada Mayara Fonseca, que vem se especializando no assunto, a Lei 13.709/2018 veio para “regulamentar e proteger, de forma mais específica e eficaz, o tratamento de dados pessoais, tendo como um dos principais objetivos a garantia do direito fundamental à privacidade”.
O dispositivo legal determina que todos os dados pessoais somente poderão ser coletados mediante o consentimento expresso do usuário, esse é ponto crucial da nova legislação, ressalta a advogada. A lei está fundamentada em valores como “o respeito à privacidade; à autodeterminação informativa; à liberdade de expressão, de informação, comunicação e de opinião; à inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem; ao desenvolvimento econômico e tecnológico e a inovação; à livre iniciativa, livre concorrência e defesa do consumidor e aos direitos humanos de liberdade e dignidade das pessoas”.
Segundo Fonseca, quando se pensa em processos para recrutamento e seleção, “é necessário avaliar que, além dos dados pessoais como nome, documentos, profissão, as empresas também buscam, por meio de testes e dinâmicas as mais variadas, como a própria gamificação, formular o perfil do candidato. O que entendo ser um dado sensível por identificar de forma mais íntima essa pessoa”. Portanto, orienta Fonseca, todas as empresas e consultorias que trabalham nessa área “devem ter o maior cuidado no manejo desses dados pessoais sensíveis, uma vez que só podem ser tratados quando o titular ou seu responsável legal consentir, de forma específica e destacada, também para finalidades específicas”.
A preocupação jurídica é reforçada pelo CEO da Companhia de Estágios, Tiago Mavichian, ao afirmar que o principal ponto crítico para a área é a captação e armazenamento dos dados e o que as consultorias e empresas fazem com eles. “Se os dados, por exemplo, eram compartilhados com outras empresas, só poderá fazer isso se deixar claro nos termos de uso [junto ao proprietário dos dados]”, aponta.
Amanda Lee, diretora Jurídica da Automatic Data Processing (ADP) na América Latina, empresa de Gestão de Capital Humano, afirma que o mundo corporativo que mantinha dados de recrutamento ou quaisquer outros bancos de dados de pessoas antes da LGPD já precisavam ter garantias significativas de segurança da informação e privacidade para uma movimentação global, “após a lei esses procedimentos passam a ser regulamentados com mais critério. Portanto, as empresas precisam ser mais cuidadosas com o uso, principalmente respeitando a finalidade da manutenção de dados e exclusão das informações”.
Dilema: tecnologia e proteção
As tecnologias de informação e digitais transformaram substancialmente os processos do RH e de recrutamento. A inteligência artificial, o big data, o machine learning e a automação revolucionaram a coleta, o armazenamento e o tratamento de dados, influindo até em decisões. Mavichian também se preocupa com esse cenário, porque a área de seleção é uma das que mais capta dados com essas ferramentas, inclusive os chamados dados sensíveis. Fonseca explica que esses se referem, por exemplo, à convenção filosófica, credo religioso, preferências políticas, filiação partidária ou a sindicado, estado de saúdem entre outros, “questões que atingem mais profundamente a intimidade do cidadão”.
A LGPD criou mais regras e deu possibilidades aos usuários. Por isso, o CEO da Cia de Estágios indica que as empresas devem deixar claro para qual finalidade elas pedem e para que irão usar os dados, além disso, “devem dar a possibilidade do usuário saber quais dados a empresa tem dele, deve também permitir que ele exclua os dados dele a qualquer momento desde que não infrinja outra lei”.
Para Lee, a nova legislação “não pode ser entendida, de nenhuma forma, como um problema”. Por isso, ela reforça: “Todos os pontos da LGPD são relevantes, porém, o correto mapeamento das informações para identificar quais são os dados coletados e qual é o fluxo deles ajuda a abranger os requisitos da lei [com relação à privacidade]. Após esse mapeamento, se torna mais clara a finalidade do tratamento de dados e auxilia no enquadramento da base legal a ser utilizada para o tratamento.”
Para Mavichian, o desafio das empresas é ter sistemas que atendam ao que a legislação estabelece e, principalmente, que seus colaboradores sigam as normas de segurança, para que não haja violação dos dados causados por descuidos ou não cumprimento dos protocolos de segurança. A preocupação é endossada pela diretora Jurídica da ADP: “O tratamento de dados de forma segura e confidencial, mas com um procedimento robusto e transparente traz mais segurança e confiabilidade para as operações das companhias não apenas para recrutamento, mas para qualquer empresa que realize tratamento de dados pessoais.”
A utilização indevida de dados pessoais ou sensíveis, sem o consentimento expresso ou específicos, podem acarretar multas altíssimas à pessoa física ou jurídica. “Por esse motivo, as empresas têm cada vez mais investido em uma estrutura de compliance digital, que de uma forma objetiva, pode-se entender como um programa preventivo, para evitar abusos na utilização de dados pessoais”, orienta Mayara Fonseca.