Engenheira ambiental destaca conexão da profissão com a preservação do maior recurso do mundo, a água.
Rosângela Ribeiro Gil
Oportunidades na Engenharia
Em 22 de março de 1992, a Organização das Nações Unidas (ONU) criou o Dia Mundial da Água, como um esforço da comunidade internacional para colocar em pauta questões essenciais que envolvem os recursos hídricos. Na comemoração da data, em 2021, a ONU lançou a pergunta: “O que a água significa para você?”. Uma pergunta importante para toda a sociedade – governos, cidadãos e economia – que se conecta ao modo de vida da civilização humana baseada no desenvolvimento econômico. “Mas de qual desenvolvimento falamos?”, questiona a engenheira ambiental e sanitarista Marcellie Dessimoni, coordenadora geral do Núcleo Jovem Engenheiro, do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (SEESP).
Ela mesma responde e ensina: “Só existe um tipo, o sustentável. Nesse sentido, a engenharia está totalmente comprometida com esse princípio, pois está na lei que regulamenta a nossa profissão [5.194/1966], já no artigo primeiro, que devemos realizar as nossas atividades pensando no interesse social e humano, como o aproveitamento e utilização de recursos naturais.” Por isso, reforça ela, se sente muito à vontade em falar sobre o Dia Mundial da Água e salienta o comprometimento do próprio sindicato dos engenheiros, que tem a bandeira da sustentabilidade muito forte em suas ações, “até porque abriu suas portas para uma engenheira ambiental e sanitarista como eu para estar à frente de um projeto criado em 2015, que foi o Núcleo Jovem Engenheiro”.
Dessimoni, que tem especialização em gerenciamento de resíduos sólidos, nasceu em Itacoatiara, no Amazonas, estado com a maior floresta tropical da Amazônia. O município – que no vocábulo indígena significa pedra pintada ou pedra escrita – fica na Região Metropolitana de Manaus, capital amazonense que marca o "Encontro das Águas", onde o rio Negro, de água negra, e o rio Solimões se juntam para formar o rio Amazonas. Por isso, diz ela, é muito gratificante poder falar sobre o Dia Mundial da Água, “vivi às margens do maior rio em volume de água do mundo e o segundo maior em extensão territorial [Rio Amazonas], acredito que consegui entender a importância da água para as pessoas e para a natureza. Cuidar das fontes de água é fundamental para a nossa sobrevivência. Não existe vida sem água. Espero que todos entendamos isso de uma vez por todas”.
Muito se fala em falta de água e que, num futuro próximo, teremos uma guerra em busca de água potável. O Brasil é um país privilegiado, pois aqui estão 11,6% de toda a água doce do planeta. Aqui também se encontram o maior rio do mundo – o Amazonas – e o maior reservatório de água subterrânea do planeta – o Sistema Aquífero Guarani. Como a engenharia pode atuar para cuidar dessa patrimônio?
A guerra em busca de água potável já ocorre em diversos lugares do planeta, até mesmo em algumas regiões do Brasil. Não é questão de faltar no futuro, e sim no presente. O Brasil realmente tem suas reservas hidrológicas e hidrogeológicas, mas até que ponto cuidamos e protegemos desse recurso?
É necessário ter um olhar mais amplo e holístico quando o assunto se refere à água doce, potabilidade e águas subterrâneas. Sim, o Rio Amazonas é considerado o maior em extensão e volume, mas quais cuidados estamos oferecendo para preservá-lo como deve e merece?
Conseguimos implementar políticas públicas de fato e de direito em toda extensão do Rio? Não podemos ver apenas como um recurso hídrico à nossa disposição; mas em toda a sua cadeia ecossistêmica e multidimensional. Necessitamos enxergar como ciência da vida: suas microfaunas, flora, população ribeirinha, povos tradicionais, comunidades, animais, ou seja, tudo que existe dentro do recurso Rio e por onde ele passa, alimentando a terra, pessoas e tudo mais. Estamos falando de vários tipos de vidas.
Sobre o Aquífero Guarani, que parte de sua área corre risco de contaminação? Temos outros aquíferos importantes no Brasil, na região do Pará, como o Aquífero Alter do Chão, que também merecem cuidados e atenção urgentes.
A engenharia ambiental e sanitária tem a oportunidade, junto com outros profissionais, de buscar o respeito pela natureza e compor trabalhos inovadores de desenvolvimento sustentável para evitar os inúmeros desastres que acabamos por vivenciar no dia a dia. Vemos, hoje, como o prejuízo das reservas de água doce, dos rios, dos igarapés, dos mananciais entre outros, além do excesso de poluição, contaminação, queimadas, impactos de urbanização desordenada, degradação dos ambientes naturais e muito mais.
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), 50% da taxa de doenças e morte nos países em desenvolvimento ocorrem por falta de água ou pela sua contaminação. Assim sendo, o rápido crescimento da população mundial e a crescente poluição, causado também pela industrialização, torna a água o recurso natural mais estratégico de qualquer país do mundo. Você poderia comentar as afirmações acima como engenheira ambiental?
O que falta é saneamento básico urgente e a nova Lei do Marco do Saneamento nº 14.026/2020, de 15 de julho de 2020, faz referência aos serviços públicos de saneamento ambiental, com melhoria das condições estruturais. A legislação aborda o atendimento de 99% da população com água potável e de 90% com tratamento de esgoto até 2033. Apresenta a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (Ana), como o órgão regulador, competente para instituir as normas referentes à regulação dos serviços públicos de saneamento básico.
Um fator prioritário são as peculiaridades de cada território e suas potencialidades também, sendo que na questão econômica: a cada R$1,00 investido em saneamento existe a geração de economia de R$ 4,00 com a prevenção de doenças causadas pela falta dos serviços que são de fundamental importância, conforme a Organização Mundial da Saúde [OMS].
Serviços de água e esgoto são urgentes. Não dá mais para deixar de fazer. Estamos falando de qualidade de vida e saúde à população. Nossos governantes juntamente com todos os setores da sociedade precisam colocar como pauta prioritária e estratégica este recurso natural vital para a população.
Água que nasce na fonte
Serena do mundo
E que abre um profundo grotão
Água que faz inocente
Riacho e desagua
Na corrente do Ribeirão
(Música Planeta água, de Guilherme Arantes)
Como o Dia Mundial da Água – data instituída pela ONU em 22 de março de 1992 – entra em todo esse contexto?
Bem, antes de comentar sobre o Dia Mundial, é necessário fazermos uma reflexão no contexto sobre as múltiplas funções da água. Tem a água como recurso hídrico, como elemento da vida e da saúde, ou mesmo como o solvente universal para a humanidade. No entanto, é primordial para toda a vida planetária, mas muitos ainda não perceberam seus valores e profundos significados. Infelizmente, enfrentamos ainda muitos descasos e desperdícios.
O ano da instituição pela ONU tem uma sincronicidade comigo, pois, também nasci em 1992 e hoje, como engenheira ambiental e sanitarista, sinto a urgente responsabilidade de orientar as pessoas, pautar os projetos e os trabalhos desenvolvidos com maior sensibilização sobre tudo que envolve a questão sobre a água, seus caminhos, valores nos diversos ambientes que ela circula.
A Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou, novamente, um novo período, de 2018-2028, como a década internacional para ação dos cuidados com a água.
Nesse sentido, engenheira, como atuar em diversas frentes na conscientização de que os recursos hídricos precisam ser preservados?
Como engenheira e educadora ambiental, digo sempre que um dos caminhos é sensibilizar as pessoas, órgãos e instituições corporativas, mostrando de fato que dá certo trilhar por esse caminho da proteção ambiental do recurso hídrico e do elemento água.
Integrar e interagir os diversos setores da sociedade, juntamente com a Agenda 2030 que em seu núcleo trás vários Objetivos de Desenvolvimento Sustentável [ODS], com suas metas e indicadores reais a serem alcançados pelos países signatários. Se as empresas que necessitam muito do uso da eficiência hídrica em seus negócios, perceberem a importância de reaproveitar e melhorar seus indicadores de maneira clara e objetiva em parceria com instituições que já fazem isso, é um dos caminhos para atenuar os desperdícios, que são de várias ordens.
Assim como sensibilizar as novas gerações para desenvolver o sentimento de pertença e cuidado por este recursos, por meio da educação ambiental ativa e transversal.
Águas escuras dos rios
Que levam a fertilidade ao sertão
Águas que banham aldeias
E matam a sede da população
(Música Planeta água, de Guilherme Arantes)
Você considera que a sua profissão está conectada à data, por quê?
Totalmente. A engenharia está de corpo e alma comprometida com o desenvolvimento sustentável, e sustentabilidade significa respeitar meio ambiente e pessoas.
A engenharia ambiental, desde 1972, entrou como pauta nas discussões internacionais, como profissão. Mas nas competências e habilidades como engenheira, é que vimos muitos atributos e ações. Em nossa principal função, como a de buscar solução e alternativa de melhoria para a preservação e conservação dos recursos naturais, é um grande desafio, dentro de métodos a serem estudados e traçados, como, tratamento, monitoramento, fiscalização, planejamento, tecnologia e outros.
Acredito que a profissão tem um papel fundamental não só para a atual geração, mas para as futuras gerações também.