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17/10/2024

Previsões equivocadas de mudanças climáticas e suas consequências

Olimpio Alvares

 

Sem negar realidade do aquecimento global, como lidar com erros, exageros e distorções e os efeitos sobre prioridades de governo e o bem-estar psicológico dos jovens.

 

Simulação da quantidade de dióxido de carbono na atmosfera da Terra, se metade das emissões de aquecimento global não for absorvida. Foto: Nasa

via Wikimedia Commons

 

A fluidez e o descompromisso com o acerto no contexto científico e midiático do aquecimento global podem ser ilustrados por uma série não exaustiva de previsões sombrias (por vezes trágicas) e não confirmadas, de cientistas e porta-vozes extraoficiais da ciência das mudanças do clima. Os casos apresentados a seguir marcaram as últimas quatro décadas.

 

Entretanto, tais exemplos podem agora ser úteis para alertar acadêmicos, políticos, autoridades governamentais militares e civis, bem como a população em geral, sobre a suscetibilidade de ocorrência de importantes erros nessas delicadas previsões científicas, supostamente consensuais, e de altíssima complexidade, repercutidas pela dominante facção catastrofista da grande mídia ávida por rentáveis más notícias.

 

Constata-se, pelas falhas grosseiras de predição, que a divulgação massiva dessas notícias, de grande potencial lesivo, aparentemente não foi precedida do interesse investigativo e, principalmente, da velha e saudável cautela jornalística – atualmente fora de moda.

 

O problema é que, mundo afora, essas previsões podem implicar controversas inversões de prioridades na gestão pública e sérios danos materiais, econômicos, sociais e psíquicos na comunidade – especialmente nos jovens, conforme destacam abundantes estudos do comportamento humano nos campos da psicologia e sociologia política.

 

Ao contrário das gerações anteriores que não tinham acesso instantâneo às más notícias na palma da mão, crianças e jovens desprotegidos estão crescendo neste mundo (historicamente sempre cheio de problemas), onde a desgraça e a tristeza (“Doom and Gloom”) causadas pelas alterações climáticas – objeto de previsões equivocadas ou não – são sádica e metodicamente marteladas, sem freio, em tom de profecia religiosa. O impacto psíquico desse “bombardeio”, até mesmo sobre adultos, é devastador e determinante negativo de qualidade de vida.

 

Para citar um único, entre muitos estudos dos efeitos do chamado “terrorismo climático”, uma pesquisa com 600 crianças entre dez e 14 anos na Austrália revelou que 44% delas estão preocupadas com o impacto futuro das mudanças climáticas e um quarto delas acreditam ser culpadas pela destruição de uma biosfera que pode ser completamente extinta antes mesmo que fiquem mais velhas. Entre outros sintomas graves, são frequentes os diagnósticos clínicos de ansiedade, rancor, depressão, desesperança, desespero e falta de motivação para encarar os inevitáveis desafios existenciais.

 

Alguns desses erros preditivos exaustivamente divulgados – que invariavelmente comprometem a credibilidade da ciência e da grande mídia jornalística – são apresentados a seguir:

 

Na década dos anos 70, o resfriamento global costumava ser o problema da mudança climática

Quando o movimento ambientalista começou na década de 1970, a ciência estava mais preocupada com a era glacial do que com um planeta mais quente. Costumávamos então ouvir que o mundo estaria esfriando drasticamente há 20 anos (desde os anos 1950) e ficaria cerca de quatro graus mais frio em 1990 e 11 graus mais frio no ano 2000 – essa previsão enganosa foi amplamente difundida.

 

Mas o suposto consenso científico “flipou” do resfriamento para aquecimento global. Era o fim da década de 1970, e o grande e terrível frio não chegou. “Que viessem então as notícias infladas sobre o grande calor!” ... E as previsões não confirmadas se multiplicariam a seguir.

 

Alerta Vermelho do New York Times: o Polo Norte vai derreter

O New York Times reportou a previsão de uma catástrofe numa matéria de 1979, com um parágrafo de abertura chocante: “Climatologistas são informados de que o Polo Norte pode derreter. Há possibilidade real de que as pessoas hoje na infância vivam até uma época em que o gelo no Polo Norte não mais exista, o que causaria mudanças rápidas, e quem sabe catastróficas no clima.”

 

Se o aquecimento global não for revertido até o ano 2000, será tarde demais para evitar uma catástrofe mundial

O incrível discurso então aceito e propagado nos anos 1980 em diante era que nações inteiras poderiam ser varridas da face da Terra pelo aumento do nível do mar, se a tendência do aquecimento global não fosse revertida até o ano 2000. “Inundações costeiras e quebras de safra criariam um êxodo de ecorrefugiados, implicando caos político”, disse ninguém menos que Noel Brown, diretor do Programa Ambiental da Organização das Nações Unidas (Pnuma), em Nova York.

 

Segundo Brown, os governos teriam uma janela de oportunidade de dez anos para reverter o efeito estufa, antes que a situação das mudanças climáticas saísse do controle. À medida que o aquecimento derretia as calotas polares, os níveis dos oceanos subiriam até cerca de um metro, o suficiente para cobrir as Maldivas e outras nações insulares planas, Brown disse em entrevista à Associated Press. Acrescentou ainda que as regiões costeiras seriam inundadas – um sexto de Bangladesh poderia ser inundado, deslocando um quarto de seus 90 milhões de habitantes; e um quinto das terras aráveis ​​do Egito no Delta do Nilo seriam inundadas, cortando o suprimento de alimentos, conforme estudo do Pnuma e da Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA).

 

Mas a apocalíptica tragédia anunciada pela ONU mais uma vez não foi confirmada.

 

ONU sinaliza para possibilidade de devastação generalizada em menos de 20 anos

Em 1982, Mostafa Tolba, outro diretor executivo do Pnuma, apontou mais uma vez para a possibilidade de catástrofe generalizada – esta, na virada do século. Ele citou “uma devastação tão completa e tão irreversível quanto qualquer holocausto nuclear”. A previsão desse oficial da ONU foi nada menos que terrível e assustadora.

 

O apocalipse climático anunciado por Ted Turner

Nessa onda de desvarios preditivos levianos sobre o clima, em 2008, o magnata da mídia Ted Turner previu – sem medir as consequências de sua fala – as consequências da inação climática: “Não fazer isso (interromper o processo do aquecimento global, inclusive com medidas de controle populacional) será catastrófico. Estaremos oito graus mais quentes em 30 ou 40 anos, e nenhuma das plantações sobreviverá. A maioria das pessoas terá morrido, e o restante será canibal. A civilização entrará em colapso. As poucas pessoas que conseguirem sobreviver viverão em um estado falido como a Somália ou o Sudão, e as condições de vida serão intoleráveis. As secas serão tão intensas que não haverá mais cultivo de grãos.”

 

Príncipe Charles diz que temos apenas 96 meses para salvar o mundo

No início deste século o então príncipe Charles comunicou ter calculado que tínhamos 96 meses para salvar o planeta! “Enfrentamos os desafios duplos de uma visão de mundo e um sistema econômico, que parecem ter enormes deficiências, juntamente com uma crise ambiental (incluindo as mudanças climáticas) que ameaça nos engolir a todos.”

 

Num pronunciamento no Palácio de St. James, o Príncipe da Casa de Windsor disse que a “era da conveniência” havia acabado e que tínhamos oito anos para evitar o colapso irreversível do clima e do ecossistema. Entretanto, exceto pelo avanço tecnológico e alguns acordos que – infelizmente – até o presente tiveram efeito pouco significativo nos anos seguintes à fala de Charles, quase nada mudou.

 

O prazo do príncipe ambientalista venceu em 2017, e a tal “era da conveniência” ainda persiste – e o “pior” (ou melhor?), as conveniências e o bem-estar material, acessíveis por meio da energia barata, educação, desenvolvimento econômico e do consumo, se alastram “perigosamente” para os países em desenvolvimento.

 

Ursos polares resistem heroicamente no Ártico

Cinquenta anos após a proibição da caça, os ursos polares estão prosperando, mostra um novo e controverso estudo The State of the Polar Bear Report 2023.

 

O ano de 2023 marcou 50 anos de cooperação internacional para proteger os ursos polares no Ártico. Os esforços têm sido uma história de sucesso da conservação: de uma população estimada em cerca de 12 mil ursos no final da década de 1960, os números quase triplicaram, alcançando pouco mais de 32 mil em 2023.

 

Apesar desse aumento dramático nas populações de ursos polares em certas regiões do Polo Norte, as alegações de que seus números estão caindo devido às mudanças climáticas ainda dominam a maior parte da resistente cobertura da mídia, que, ao contrário do que se poderia esperar de um jornalismo imparcial, raramente transmite as boas notícias nesse campo altamente ideologizado e politizado.

 

Al Gore: “A calota de gelo polar do Ártico pode desaparecer completamente nos meses de verão em apenas cinco a sete anos”

“A calota de gelo polar do Ártico pode desaparecer completamente nos meses de verão em apenas cinco a sete anos”, disse Al Gore, o ex-vice-presidente americano, em 2009, na cúpula climática de Copenhague.

 

No mesmo evento, foi declarado que, com uma profundidade média de mais de 2 mil metros, a camada contém quase 3 milhões de quilômetros cúbicos de gelo, cerca de um oitavo do tamanho da Antártida, mas o suficiente para elevar os níveis globais do mar em 7,5m, se derretesse completamente.

 

Al Gore ganhou o Prêmio Nobel da Paz e um Oscar por seu documentário “Uma verdade inconveniente”, de 2006, marcado por previsões não confirmadas.

 

Al Gore: “O pico mais alto da África estará sem neve dentro de uma década”

Uma das mais espetaculares previsões de Al Gore é sobre o Monte Kilimanjaro, na Tanzânia. Ele afirmou em 2006, quando lançou o documentário “Uma verdade inconveniente”, que o pico mais alto da África estaria sem neve em uma década. Seus comentários – bem como as impressionantes imagens caprichosamente criadas para seu documentário – baseavam-se numa previsão de 2002 feita por cientistas: “Ao longo do século XX, a área de gelo do Kilimanjaro diminuiu 80% e se as condições climatológicas atuais persistirem, os campos de gelo restantes provavelmente desaparecerão entre 2015 e 2020.” Isso não aconteceu e, ao que parece, não ocorrerá tão cedo.

 

Secretário-geral da ONU, António Guterres: “O aumento do nível dos mares está afundando o futuro”

António Guterres, secretário-geral da ONU, disse, em 14 de fevereiro de 2023, que “o aumento do nível dos mares está afundando o futuro; ameaça vidas e coloca em risco o acesso à água, alimentos e cuidados de saúde; pode dizimar empregos e economias inteiras; mesmo que o aquecimento global seja milagrosamente limitado a 1,5°C, ainda haverá um aumento considerável do nível do mar; se as temperaturas subirem 2°C, esse aumento de nível pode dobrar; megacidades em todos os continentes enfrentarão impactos sérios, incluindo Cairo, Lagos, Maputo, Bangkok, Dhaka, Jacarta, Mumbai, Xangai, Copenhague, Londres, Los Angeles, Nova York, Buenos Aires e Santiago; no Caribe, a elevação do nível do mar contribuiu para a devastação dos meios de subsistência locais no turismo e na agricultura; inundações e erosão costeira na África Ocidental estão danificando infraestrutura e comunidades, minando a agricultura e frequentemente custando vidas, enquanto no Norte da África a intrusão de água salgada está contaminando recursos terrestres e de água doce, destruindo meios de subsistência; a Antártida está perdendo uma média de 150 bilhões de toneladas de massa de gelo anualmente; muitas comunidades baixas e países inteiros podem desaparecer para sempre”. E acrescentou: “Nós testemunharíamos um êxodo em massa de populações inteiras em uma escala bíblica.”

 

Porém, o nível do mar efetivamente monitorado pelos organismos científicos aumenta a uma taxa média de cerca de 3mm/ano nas últimas décadas, e o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), em sua previsão mais realista de 2013 (que descarta os cenários extremos e improváveis), estimou que em 2100 o nível do mar poderá subir entre cerca de 0,25m e 0,90m.

 

Desde que as emissões de gases do efeito estufa (GEE) começaram a ganhar escala, na década de 1950, até os dias atuais, o nível dos mares subiu apenas 0,18m, e boa parte disso se deve a causas naturais (relacionadas aos ciclos das correntes marítimas), que nada têm a ver com as emissões de GEE.

 

Ainda sobre a improbabilidade de certos cenários, artigo publicado no site do Center of American Experiment mostra que há cenários com valores extremos de elevação do nível do mar, mas são considerados pelos próprios cientistas como altamente improváveis ​​ou até mesmo impossíveis. No entanto, esses cenários são amplamente usados por agentes irresponsáveis da mídia enviesada, sem ressalvas e, lamentavelmente, além de provocarem turbulência sociopsicológica, têm impressionado autoridades políticas desinformadas, impulsionado políticas e planos de adaptação locais, com desvio dos recursos do que é prioridade de fato.

 

Crise de credibilidade não é desculpa para inação

Como vimos, quando se trata de previsões do aquecimento global, temos este enorme problema: somos bombardeados com tanta informação emocionada, descuidada, politizada e equivocada ao longo do último meio século que é simplesmente difícil acreditar no que vem por aí. A saída é questionar tudo e procurar informação consistente embasada em boa ciência em fontes diversas de qualidade.

 

Não obstante, o fato de a neve não ter desaparecido do alto do Kilimanjaro, e algumas outras previsões catastróficas (inclusive da “ciência oficial” e da própria ONU) não terem se confirmado, não significa que o aquecimento global não esteja ocorrendo; ele existe sim, é ponto pacífico que seja causado pela atividade humana (não se sabe em que proporção em relação às causas naturais), e vem crescendo gradualmente. 

 

Assim, não há alternativa senão enfrentar persistentemente o problema do aquecimento em concertação com outros países, mediante políticas e ações inovadoras, que produzam reduções transparentes de emissões de gases do efeito estufa (avaliadas no ciclo de vida e certificadas por organismos isentos), mas sem esquecer das indispensáveis medidas de adaptação às mudanças climáticas. E é sempre bom lembrar: “Quando a ciência está sobre a mesa, e a política entra na sala por uma porta, a verdade sai correndo pela outra.”

 

olimpioFoto: Acervo pessoal

 

Olimpio Alvares é engenheiro mecânico pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), especializado em emissões e transporte sustentável no Japão e Suécia, ex-gerente de programas de controle de emissões veiculares da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), consultor de diversas empresas e instituições, assistente técnico do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss), secretário executivo da Comissão de Meio Ambiente e Mobilidade Sustentável da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) e membro do Comitê de Substituição de Frota e do Comitê de Mudança do Clima e Ecoeconomia da Prefeitura Municipal de São Paulo

 

 

Foto no destaque: Relógio no centro da capital paulista aponta 37oC em 25 de setembro de 2024. Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

 

 

 

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