Das muitas interrogações sobre a economia brasileira na atual conjuntura, uma das que mais me intriga é a renitência da inflação.
Todas as medições efetuadas revelam um índice inflacionário superior ao centro da meta de 4,5%. Embora não seja um indicador de estouro da inflação e dependa de fatores sazonais e específicos, a renitência do índice é preocupante devido ao tratamento que o Banco Central tem dado à moeda: juros em alta crescente (a maior taxa Selic dos anos recentes) e as correlatas quedas no crescimento, no crédito e no consumo, e o aumento do desemprego.
É o tiro de canhão para matar passarinho, mas o pássaro tem resistido enquanto tudo ao seu redor se desmorona.
Durante alguns anos o rumo da economia brasileira destoou do rumo de algumas grandes economias mundiais pelo fato de que enfrentamos a crise com mais desenvolvimento, mais emprego e mais salário em conjunturas favoráveis ao movimento sindical, sem restrições e cortes.
Agora, igualmente, estamos na contramão do mundo no que se refere a juros e inflação. Enquanto as grandes economias têm juros básicos quase nulos e a inflação é baixa (em alguns casos chega haver deflação), aqui no Brasil persiste a contradição de juros altos e inflação renitente.
Alguns especialistas já advertem para o exagero da política monetária em curso e os preços administrados (por exemplo, o reajuste de mais de 13% nos planos de saúde) começam a ser vistos como “carregadores” de inflação, ao lado dos ganhos salariais.
E é sobre estes que se exerce a pressão maior e que se faz sentir nas negociações salariais em curso. Grandes categorias, como os trabalhadores da construção civil de São Paulo, que vinham acumulando ganhos reais na última década, conseguiram apenas a reposição da inflação, sem ganhos reais; outras, nem mesmo isto.
Fica claro que o tiro de canhão visa matar, muito mais que o passarinho, os ganhos salariais, a começar pelos ganhos reais do salário mínimo.
Nessa conjuntura, apesar das muitas interrogações e da campanha antissindical que a mídia alimenta, o bom senso e o instinto de classe devem predominar e fazer com que as direções do movimento sindical se unam, sem politiquices, em defesa dos interesses comuns dos trabalhadores.
* por João Guilherme Vargas Netto, consultor sindical