Soraya Misleh
A segurança no abastecimento de energia pode estar comprometida. Preocupada com essa situação, a FNE (Federação Nacional dos Engenheiros) tem feito uma série de ações. Um dos problemas são as distorções encontradas no mercado livre. Este é formado por aqueles que podem optar por comprar energia de qualquer agente, como um gerador independente ou comercializador.
Segundo Carlos Augusto Ramos Kirchner, diretor do SEESP, aí se enquadrariam grandes usuários, por exemplo indústrias de porte. “Representam 25% do consumo no Brasil.” Já no mercado cativo estão aqueles que não podem escolher a distribuidora de energia, caso dos clientes residenciais, entre outros.
Na contratação, enquanto alguns comercializadores ou produtores independentes têm atuado na ilegalidade, sem o chamado lastro – garantia física de que possuem a energia para entrega –, as distribuidoras são obrigadas a efetuar contratos de longo prazo. Consequentemente, a segurança no abastecimento e a necessária expansão do setor para tanto recaem sobre essa última parcela e indiretamente, como aponta o consultor da Coppe/UFRJ (Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós--graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro), Roberto Pereira D’Araujo, o mercado cativo fica com a conta. “O sistema tem um custo. Se alguém consegue comprar energia a curto prazo por até 1/10 do valor, alguém está pagando muito mais (para compensar o baixo preço).”
Outro problema, na sua concepção, é a falta de transparência no mercado livre. As operações realizadas, conforme ele, permanecem completamente obscuras aos olhos da sociedade. “Não se sabe quem compra de quem, por qual custo e por quanto tempo, os contratos são apresentados (ao órgão regulador) após o consumo (ex-post) e a volatilidade nos preços é muito grande. Quando sobem, revela-se que há muita especulação. É uma estrutura artificial, que propicia a entrada de intermediários.” Kirchner observa que para “uma comercializadora ser autorizada pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) para atuar no mercado livre, não há necessidade de nenhuma comprovação de capacitação técnica e experiência anterior, nenhuma verificação de robustez financeira e nenhum patrimônio mínimo”. Além da transferência da fatura para quem não é responsável por essa situação, o resultado é o calote e a possibilidade de evasão fiscal.
Saídas propostas
Corrigir as distorções passaria pela revisão do modelo do setor elétrico, como atesta D’Araujo, porém ele acha isso pouco provável. Alternativa então, na sua ótica, seria incrementar a fiscalização e a regulamentação do mercado livre, exigirem-se contratos antecipados e de no mínimo dois anos.
Como parte de suas ações, a FNE e diversas outras entidades elencaram em documento conjunto encaminhado ao ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, em 24 de março último, sugestões para garantir essa adequação. Entre as propostas, estão a não mais aceitação dos ex-post, a não mais admissão de montantes flutuantes nos contratos de compra e venda de energia na CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) e a exigência que a aferição mensal de lastro do consumo medido e os montantes contratados nos últimos 12 meses seja efetuada caso a caso, conforme previsto no Decreto nº 5.163/2004, que, entre outros aspectos, regulamenta a comercialização. Segundo o documento, que reivindica correção das falhas e ilegalidades – apontadas em audiência pública da Aneel realizada em 2010 –, os dispositivos legais determinam que a totalidade da energia consumida ou vendida esteja garantida. “Dessa forma, o marco regulatório deveria visar e incentivar a contratação com a maior antecedência possível”, conclui.