Investimento da ordem de R$ 30 bilhões, o primeiro submarino nuclear brasileiro estava previsto para ficar pronto em 2029. Mas “contingenciamentos” financeiros podem adiar a conclusão do projeto para 2033. O Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub), da Marinha do Brasil, começou em 1979 e vem sofrendo diversos atrasos por falta de recursos. É desenvolvido no Centro Tecnológico da Marinha, na Universidade de São Paulo (USP), em parceria com a Escola Politécnica da instituição (Poli), e no Centro Experimental Aramar, em Iperó, no interior paulista, próximo de Sorocaba, onde está localizado o Laboratório de Geração Nucleoelétrica (Labgene).
As equipes envolvidas dominaram o ciclo do combustível nuclear e a propulsão, respectivamente primeira e segunda etapas do Prosub. Nesse processo obteve-se o gás hexafluoreto de urânio, principal insumo, antes importado para a produção do combustível das usinas de Angra 1 e 2.
É em Iperó que está sendo montada uma planta do submarino, em tamanho real, piloto previsto para 2021 onde são feitos testes e servirá de modelo para a produção das peças. Para que isso fosse possível, foi necessário parceria com dezenas de instituições e companhias nacionais, como a Atech, subsidiária da Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer), o Instituto de Pesquisas Energéticas (Ipem) e a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnem), que certifica tudo o que está sendo feito.
“Não é autorizado à Marinha a importação desses equipamentos por uma questão estratégica dos países. Praticamente tudo o que existe hoje dentro do submarino foi desenvolvido pela Marinha e construído pela indústria brasileira. Em termos de projeto, é 100% brasileiro”, explica o comandante do 8º Distrito Naval da Marinha, Antonio Carlos Soares Guerreiro, que recebeu do SEESP em 2017 o prêmio Personalidade da Tecnologia na categoria “Desenvolvimento sustentável”, em nome do almirante Eduardo Leal Ferreira.
Programa e desenvolvimento
Em um submarino convencional, o eixo da hélice é turbinado por um motor elétrico, acionado por grandes baterias, que são recarregadas por geradores a diesel. Como esses funcionam por combustão, para ligar, é preciso ir de duas a três vezes à superfície aspirar ar. O nuclear também possui um motor elétrico, só que turbinas a vapor, o qual é gerado pelo reator nuclear. O fato de não depender do ar para ligar reflete diretamente em sua autonomia: poderia ficar meses debaixo d´água. No entanto, a fadiga e a alimentação da tripulação são componentes que impedem a permanência por períodos muito prolongados.
Em 2008, o Prosub ganhou novos recursos com a assinatura de um acordo com a França para a transferência de tecnologia à construção do casco e demais sistemas (terceira etapa). No pacote estão inclusos ainda quatro submarinos convencionais modelo Scorpene, base naval para submarino nuclear, mais dois estaleiros (de construção e de manutenção) – feitos no Complexo Naval de Itaguaí, no Rio de Janeiro. O acordo possibilitou a ida de 50 engenheiros (da Marinha e de empresas privadas) às instalações da francesa Direction des Constructions Navales et Services (DCNS), na França, onde passaram por capacitação. “Ao retornarem, projetaram uma alteração do submarino convencional, que não existe no original francês. O nosso é jumborizado (processo em que a embarcação é aumentada), porque projetamos uma sessão intermediária”, revela Guerreiro.
É possível constatar essas características no primeiro submarino a ficar pronto, o Riachuelo, transferido nos dias 13 e 14 de janeiro último para montagem final na área de lançamento – que ocorrerá no 2º semestre de 2018. Ele pesará 1.600 toneladas e navegará a 8 quilômetros por hora, menos que o nuclear, que terá 6 mil toneladas a uma velocidade de mais de 60km/h.
Cerca de 400 engenheiros atuam em todo o programa, que totaliza uma equipe de 3 mil pessoas. Segundo Guerreiro, o objetivo do governo brasileiro é dar maior segurança à costa brasileira, à chamada Amazônia Azul, área oceânica de 4,5 milhões de km², rica em biodiversidade, por onde o País escoa 95% do seu comércio exterior e são extraídos mais de 90% do petróleo e gás.
Alguns dos benefícios já podem ser vislumbrados na engenharia brasileira em setores como medicina, farmacologia, agricultura, climatologia, biologia e na própria indústria naval. Ao lado do Labgene, em Iperó, está sendo erguido um primeiro reator multipropósito de grandes proporções no País para a produção de radiofármaco, componente caro com diversas aplicações, como exames de imagem e a realização de tratamentos como radioterapia.
“Trata-se de um projeto muito relevante para o País sob vários aspectos. Não só na produção do radiofármaco, como de urânio enriquecido. Quem critica a energia nuclear geralmente está mal-informado. Hoje é absolutamente segura e deve fazer parte da matriz energética. Todos os países desenvolvidos têm”, afirma Fuad Kassab, que integra o grupo de Controle e Automação do Departamento de Engenharia de Telecomunicações e Controle da Poli, o qual supervisiona o programa.
Por Deborah Moreira