A PEC (Proposta de Emenda Constitucional) nº 231/95 que institui a medida – e aumenta o adicional de hora extra de 50% para 75% – foi aprovada por unanimidade na Comissão Especial da Câmara dos Deputados em 30 de junho último. Com isso, foi aberto o caminho para votação no plenário dessa casa, em dois turnos. As manifestações do dia 14 foram o ponto culminante de uma série de iniciativas que já vinham sendo desenvolvidas pelos sindicalistas. Desde a volta do recesso parlamentar, como disse o deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho (PDT-SP), presidente da Força Sindical, “embate importante está sendo travado na Câmara”. Uma das iniciativas tem sido a colocação de cartazes pela redução da jornada nas portas dos gabinetes dos deputados que concordem – portanto, demonstrando apoio à mudança constitucional. “Colamos até agora 260 cartazes e, para aprovação da matéria nessa casa, são necessários 309 votos”, enfatizou Paulinho.
Também integrando as ações unificadas, sindicalistas participaram de audiência com o presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP), no dia 6 de agosto. Na oportunidade, Murilo Celso de Campos Pinheiro, presidente do SEESP, da FNE (Federação Nacional dos Engenheiros) e da CNTU (Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados), lembrou o peemedebista que o pleito feito tem importância não apenas para os trabalhadores, mas também para os cidadãos brasileiros em geral. E que a aprovação da redução da jornada seria um fato histórico, que marcaria sua gestão na Presidência da Câmara. Temer garantiu empenho para agilizar a tramitação da matéria, destacando que seu encaminhamento para plenário deve ocorrer após terminadas as discussões sobre o assunto. Ao debate, foi acertada nessa audiência a promoção de uma comissão geral, cuja plenária deve acontecer em 25 de agosto. Segundo divulgado pela Agência Câmara, a intenção dos sindicalistas é viabilizar a votação da PEC nessa casa na primeira ou segunda quinzena de setembro próximo. “O que joga a nosso favor são as eleições de 2010. Temos agora que aumentar a pressão em Brasília”, apostou Paulinho. Presidente da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), Wagner Gomes completa: “Vamos levar milhares de trabalhadores no dia da votação.”
Medida para enfrentar a crise
Como lembrou Pinheiro na audiência com Temer, toda a sociedade deve se beneficiar com a redução da jornada. Na ótica de Rosane Silva, secretária nacional da mulher trabalhadora da CUT (Central Única dos Trabalhadores), tal medida, historicamente, tem o sentido de minorar a exploração da mão de obra. E especificamente para as mulheres pode ter efeitos ainda mais positivos. “Além de permitir uma maior incorporação dessas ao mercado formal, possibilitará mais tempo livre para a construção da autonomia pessoal.” Ela utiliza dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2005 como explicação. “Com relação ao tempo dedicado ao trabalho doméstico e de cuidados, os homens gastam 9,8h semanais e as mulheres, 25,2h. Dessa forma, elas têm suas vidas reguladas pela dupla jornada. Para conseguir manter ambas, reduzem o tempo livre.”
Ao enfrentamento da crise financeira global, a mudança constitucional cumpre papel preponderante, como destaca o economista do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Cássio Calvete: “A saída é justamente aquecer o mercado interno e essa é uma medida que vai ao encontro disso. Seu potencial é de geração de 2,5 milhões de postos de trabalho, a depender de outros fatores, como a limitação de horas extras.” Em prol do seu argumento, ele lembra que em 1988 o cenário era de recessão econômica e, mesmo assim, ao se reduzir a jornada de 48h para 44h, o impacto foi positivo em termos de criação de empregos. “Foi feito um estudo pela UnB (Universidade de Brasília) que indicou em torno de 1% de novos postos apenas na região de São Paulo, mesmo sem outras medidas efetivas.”
Segundo enumerou Calvete, análise do Dieese identifica que, além de aquecer a economia e melhorar a distribuição de renda, ao aumentar o salário/hora dos profissionais e empregar mais pessoas, a redução da jornada culminará na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos e diminuição de doenças ocupacionais, bem como de estresse e depressão associados a períodos muito longos de trabalho. João Guilherme Vargas Netto, analista político e sindical do SEESP, ressalta também que a aprovação da PEC ampliaria as condições de qualificação profissional.
Não obstante, o empresariado resiste, utilizando justificativa inversa: a de que a conjuntura global não é favorável à mudança. Para a CNI (Confederação Nacional da Indústria), especialmente neste momento em que a economia brasileira enfrenta os efeitos nefastos da recessão mundial, a redução na jornada de trabalho, sem o ajuste correspondente nos salários, comprometerá a competitividade das empresas. Na sua ótica, esse tema deve continuar a ser negociado entre as partes. Artur Henrique da Silva Santos, presidente da CUT nacional, refuta esse argumento: “Esse movimento não se estabelece, tendo em vista seus ganhos de produtividade.”
Para vencer a resistência e garantir a aprovação no Legislativo, Antonio Augusto de Queiroz, o Toninho, diretor de documentação do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), destaca que é necessária mobilização. Portanto, o movimento sindical está no caminho correto. Percurso, inclusive, já feito por vários países do mundo, nos quais, como salienta Antonio Carlos dos Reis, o Salim, vice-presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores), o Salim, jornada inferior a 44h é fato consumado.
Soraya Misleh