José Roberto Cardoso
Não pretendo com este título estimular aqueles que acreditam nos negacionistas e preconizam o “não isolamento” nessa pandemia. Este título pretende alertá-lo a não se isolar no trato das mudanças climáticas, pois essa exigirá a presença de cada um no esforço de salvar o planeta.
É sobre isso que Bill Gates escreve em seu livro, recentemente lançado, “Como evitar um desastre climático: as soluções que temos e as inovações necessárias” (Companhia das Letras, 321 páginas).
A introdução tem subtítulo explosivo “De 51 bilhões para zero”, referindo-se às toneladas de CO2 lançadas anualmente em nossa atmosfera. Se considerarmos que essa tem espessura de apenas 15km, ou seja uma distância menor que o comprimento das marginais dos rios Pinheiros e Tietê, em São Paulo, dá para se imaginar que o dia da saturação chegará. No entanto, muito antes de atingir esse nível de poluição, nosso planeta deixará de existir.
A solução para esse problema passa pela substituição do consumo de combustíveis fósseis pela energia elétrica. No entanto, é importante lembrar que essa não se trata de uma fonte primária, mas da resultante da transformação da energia produzida por alguma forma. Portanto, eletricidade oriunda de produtos fósseis, como as usinas termoelétricas que usam óleo combustível, gases e mesmo diesel, não é interessante, por ocasionar índices elevados de emissões de gases de efeito estufa (CO2).
Precisamos, portanto, cuidar para que a geração de energia elétrica seja obtida a partir de fontes sustentáveis, que não agridam o meio ambiente. Isso é conseguido através das renováveis, como as hidroelétricas, e as alternativas, como eólica, fotovoltaica, biomassa e mesmo nuclear.
Das fontes que acabamos de comentar, a sociedade é refratária à nuclear devido a acidentes recentes, como o de Fukushima, e outros um pouco mais remotos, como de Three Miles Island e Chernobyl. Apesar do grande avanço tecnológico nessa área, como bem cita Gates em seu livro, obtido com a tecnologia do reator a fissão nuclear com oscilação de ondas, que garante extrema segurança, ainda teremos que fazer grande esforço para mudar a mentalidade da humanidade com relação ao tema.
Um dos grandes vilões das emissões é o transporte, setor que é objeto de intensa pesquisa e desenvolvimento, visando mitigar a geração de poluição. Por isso mesmo, veículos elétricos, em todas as categorias, estão ocupando espaços importantes na sociedade, o que anuncia grande impacto no comportamento das pessoas.
Apesar de todos os esforços para eliminar as emissões via mobilidade elétrica, precisaremos de um pouco mais de tempo para resolver a questão quando se trata de viagens aéreas e marítimas. Para se ter uma ideia, os navios que cruzam oceanos aos milhares todos os dias lançam mais CO2 à atmosfera que um país como o México.
Gates destaca também as elevadas taxas de emissão causadas pela indústria de ferro e cimento, ambos vitais ao desenvolvimento. A produção de uma tonelada de ferro equivale a 1.800kg de CO2. Números próximos a esse indicador também podem ser aplicados ao cimento. Com a expectativa de crescimento mundial prevista, que sugere que nas próximas décadas será necessário construir uma Nova York por ano, as emissões oriundas da produção de ferro e cimento devem ser reduzidas com urgência.
Para o ferro já existe solução alternativa, a qual exigirá grande quantidade de energia elétrica – mais uma vez a saída que se apresenta – para substituir a queima do coque, tornando o processo igual ao da produção de alumínio. Também já há investimentos substanciais no esforço de reduzir as emissões na produção do concreto.
Até nossa tão idolatrada agropecuária emite além da conta, devido à nossa excessiva produção de carne e à flatulência do rebanho. Mitigar o problema nessa área, contudo, seria relativamente simples: basta comer menos carne!
Você estaria disposto a esse sacrifício? Em caso afirmativo, não se isole, pois o futuro, por enquanto, ainda está em nossas mãos.
José Roberto Cardoso é professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) e coordenador do Conselho Tecnológico do SEESP
Imagem do destaque – Arte: Eliel Almeida | Imagem: Freepik