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A crise de um mercado com pleno emprego

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José Roberto Cardoso

 

Os professores têm visão privilegiada do mercado de trabalho, não pelo acesso a artigos e revistas de qualidade, mas pelo contato permanente com os egressos. A crise oriunda da desindustrialização intensificou esse contato, pois vários estudantes recorrem aos seus mestres para solicitar cartas de recomendação, seja para postular cargos em empresas ou academias no exterior, seja para anexá-las a solicitações de vistos de permanência, como o green card.

 

Dois casos me chamaram a atenção. O primeiro foi de Francisco (nome fictício), profissional com excelente formação acadêmica, especializado em desenvolvimento de simuladores para a engenharia elétrica, que não encontrou no Brasil um posto de trabalho adequado para extravasar sua inteligência privilegiada. Francisco se mudou para os Estados Unidos, foi trabalhar em uma das mais importantes desenvolvedoras de ferramentas computacionais de engenharia, que, além de garantir sua realização profissional, o remunera com salário digno. O outro caso é de Felipe (nome também fictício). Tem história semelhante à de Francisco, só que seu destino foi a Europa, para trabalhar em desenvolvimento de simuladores. Como eles, vários outros seguiram caminhos semelhantes.

 

A explosão da acessibilidade de tecnologia avançada provocou uma corrida atrás dos desenvolvedores. A popularização do big data despertou para a valorização dos dados. No passado apenas algumas amostras eram suficientes para as previsões, mas agora, com ferramentas baseadas em Inteligência Artificial e machine learning, os horizontes se expandiram, de modo que cada dado é tratado com preciosidade para os treinamentos das redes neurais de processos cada vez mais complexos. O entretenimento também é sorvedouro de desenvolvedores. O mercado de jogos é imenso, sendo responsável pela maior fatia do mercado de Tecnologia da Informação (TI) no Brasil.

 

Com todos esses atrativos, vem a notícia de que, no início desta década, mais de 26 bilhões de dispositivos baseados em Internet das Coisas (IoT) estão conectando equipamentos e sistemas em todo o mundo. Esse cenário mostra que o sonho do pleno emprego para o profissional de TI se materializou. No entanto, o inesperado aconteceu. Não estávamos preparados para atender essa demanda. A formação de profissionais na área não foi suficiente para atender as necessidades do mercado. Além disso, a dinâmica dos programas dos cursos não foi suficientemente ágil para manter a atualização dos currículos dentro das novas atribuições requeridas.

 

Os programas da área de TI, como da Engenharia da Computação e das Ciências da Computação, são muito voláteis e exigem atualizações constantes, que são muito prejudicadas pelos elevados custos de software e hardware. Mas há algo mais que nos intriga nesse cenário: a falta de atratividade dos jovens por essa profissão, principalmente das mulheres. Mesmo com número sensível de oportunidades de emprego disponíveis, há baixa procura por cursos na área.

 

Como sempre, não há problema em nosso país em que a barreira não seja a qualidade da formação. No entanto, espera-se que com a edição das novas Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Superior, recentemente homologadas, possamos enxergar um horizonte melhor para a educação tecnológica no Brasil.

 


 

José Roberto Cardoso é professor titular da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Conselho Tecnológico do SEESP

 

 

 

Imagem: DCStudio/Freepik / Montagem: Eliel Almeida - Foto José Roberto Cardoso: Beatriz Arruda/Acervo SEESP

 

 

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