Nestor Tupinambá
Acidentes aéreos são rigorosa e rapidamente investigados pelo fabricante da aeronave e, no Brasil, pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa). Investiga, analisa, conclui e distribui aos interessados. São essas análises que têm gerado grande parte do progresso dos equipamentos aeronáuticos e, principalmente, na segurança dos voos. Há até brincadeiras como “atravessar a Avenida Paulista é mais perigoso do que fazer uma viagem aérea internacional”.
O mesmo acontece com a engenharia, que se desenvolve através de pesquisas e dos feedbacks dos acidentes. A tradicional revista internacional “Tunnels & Tunneling” sempre apresenta análises de acidentes em túneis. Quando essas análises faltam, riscos eventuais não são sanados. Ameaças que causam mortes, acidentes graves, atraso nas obras, aumento de custos, intervenção no tráfego e na vida urbana. Tal ausência também compromete as melhorias e correções nos equipamentos usados, bem como nos métodos construtivos, medidas de segurança, cálculos matemáticos etc..
Assim, é possível afirmar que atrasar essas análises por motivos que não as dificuldades intrínsecas ao processo é sonegar o progresso da engenharia, com potenciais ameaças à vida urbana em suas várias matizes. Deveria haver uma legislação tão rigorosa quanto clara em relação a esses relatórios.
Aqui o foco não são os aspectos criminais ou de custos, mas tão somente o atraso no desenvolvimento da engenharia. Somos recordistas, entre os países que constroem metrôs, túneis urbanos, desses atrasos. Por quê?
Lembrando só de algumas obras urbanas complexas, em São Paulo, como túneis, sem recorrer aos registros, é notável que muitos relatórios têm tratamento superficial, sem aprovação de todas as entidades que participam do tema ou simplesmente sem consultá-las. Quantos anos demorou o relatório do acidente na Estação Pinheiros da Linha 4? Quanto tempo para sair a análise completa do colapso do túnel de esgotamento sanitário na margem do Rio Pinheiros? E do desabamento do túnel da Rodovia dos Trabalhadores? Todos estes com mortes de trabalhadores e/ou transeuntes. Também o relatório da queda do Túnel Tribunal de Justiça, na Avenida Santo Amaro, na capital paulista?
Por que, já decorrido um ano do colapso do TBM (tatuzão) construtor da Linha 6, na Marginal Tietê, do emissário da Sabesp, nada sabemos? Afinal, a máquina shield, tradução de “escudo”, é a que mais oferece segurança nas escavações. E o emissário de cerca de 4,00 x 4,00m era novo (2019) e cadastrado, coletando todo o esgoto sanitário da Avenida Paulista até o Tietê. O prejuízo é imenso, tanto ao saneamento como em relação à paralisação das obras e interrupção no tráfego em local de circulação intensa.
Esses exemplos, entre outros casos, evidenciam a falta de rigor e mesmo de protocolos que determinem que feedbacks sejam dados o mais rápido possível. É de se observar que responsáveis, profissionais, instituições, empresas envolvidas, contratantes, poder público etc., podem ser considerados omissos, até prevaricadores em sua função, tanto perante organismos legais quanto a sociedade que, ao fim, acaba pagando com custos, atrasos e, às vezes, vidas.
Enfim, um trabalho a demandar participação de amplo espectro e muito conhecimento (que nossa engenharia tem de sobra), e que deveria ser feito já, com muita agilidade, rapidez e atenção. A engenharia nacional, bem como a sociedade brasileira, merece e exige isso.
Nestor Tupinambá é engenheiro civil, mestre em Planejamento Urbano e diretor do SEESP. Trabalhou na Codrasa Construtora, na Promon Engenharia e, por 47 anos, no Metrô-SP
Imagem: Flickr/Governo do Estado de São Paulo - Arte Fábio Souza / Foto Nestor Tupinambá: Acervo SEESP
Acho que as entidades de engenharia deveriam se unir e cobrar mais agilidade na investigação desses acidentes.