Soraya Misleh
A FNE (Federação Nacional dos Engenheiros), juntamente com os sindicatos a ela filiados, como o SEESP, emplaca neste ano uma campanha que visa despertar o interesse dos jovens do ensino médio pelas engenharias. Para tanto, elaborou um vídeo intitulado “Mais engenheiros para construir o Brasil”. A apresentação inclui, em cerca de 20 minutos, entrevistas com graduandos e profissionais bem colocados no mercado falando sobre as atribuições em cada modalidade, o ensino e perspectivas futuras.
Esse é, na visão do presidente da Abenge (Associação Brasileira de Ensino de Engenharia), João Sérgio Cordeiro, um bom caminho para se reverter o quadro atual: o Brasil tem apenas 1,5 estudante de engenharia por mil habitantes.
Isso se torna ainda mais urgente diante das perspectivas de crescimento econômico acima de 5% em 2010. Segundo o coordenador do Conselho Tecnológico Estadual do SEESP e diretor eleito da Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo), José Roberto Cardoso, o déficit anual a um projeto nacional sustentado é de 20 mil desses profissionais. Além de incentivar a busca pelas engenharias, para atender essa demanda seria fundamental conter a gigantesca evasão escolar observada na área: conforme dados do censo de 2008 do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), vinculado ao MEC (Ministério da Educação), formam-se anualmente, nos 2.032 cursos oferecidos em âmbito nacional, cerca de 40 mil profissionais da categoria (excluídas da estimativa oficial as arquiteturas) e ingressam em torno de 140 mil. “É preciso melhorar o rendimento das escolas”, vaticina Cardoso.
Paulo Roberto Wollinger, diretor de regulação e supervisão de educação superior do MEC, explica o porquê do alto índice de desistência, em especial nos dois primeiros anos – em que se situa entre 60% e 70%: “É o chamado ciclo básico dos cursos de engenharia. Há uma carga imensa de matemática, física, química, muito cálculo, álgebra, teoria.” Conforme sua informação, hoje no mundo se aponta para uma mescla, em que se distribua o conteúdo relativo ao primeiro biênio ao longo do curso e se inicie já com alguma formação profissional. “Naqueles projetos pedagógicos que contemplam isso, a taxa de sucesso é bem maior.” O diretor da Poli pondera: “Acho possível, mas manteria o primeiro ano como básico.”
O problema vem do ensino médio, que via de regra não tem preparado efetivamente seus alunos em exatas, reconhece Cardoso. Porém, pondera que rever esse cenário não será tarefa fácil e rápida. Enquanto isso, sugere se garantir acompanhamento maior e mais próximo ao estudante e inclusive reforço extraclasse nas matérias em que esse tenha deficiência. Cordeiro lembra que tal experiência se mostrou exitosa em outras partes do globo, como nos Estados Unidos. Propõe ainda mudança de método dos professores. “Nas grandes universidades, muitas vezes, esses imprimem uma dosagem como se fossem formar físicos, químicos e matemáticos. E o aluno não consegue enxergar o tipo de aplicação. Assim, cerceamos a motivação na faculdade.” Na concepção dos dois especialistas, atividades complementares e visitas técnicas poderiam auxiliar nisso.
Relação universidade-empresa
Para o País alcançar autonomia tecnológica, o que pode alçá-lo a patamar mais elevado, nota técnica feita por Cardoso para a versão atualizada do projeto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento” indica que seria importante que setor produtivo e academia diminuíssem distâncias. Além da cooperação mútua, recomendação nesse sentido é de uma pós-graduação tecnológica, voltada à atuação no mercado. Isso poderia reduzir a carência por profissionais com maior especialização, seja em áreas de ponta como petróleo e gás, mineração e siderurgia, seja na modalidade civil. Haruo Ishikawa, vice-presidente do Sinduscon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil de São Paulo) responsável pelas relações capital-trabalho, ratifica que no setor, aquecido em especial em função do programa governamental Minha casa, Minha vida, a demanda é por engenheiros mais qualificados. Para fazer frente a ela, segundo explicita, as grandes construtoras têm procurado capacitar quarto e quintoanistas no canteiro de obras. O estagiário, ao se formar, é contratado.
O presidente do Sinaenco (Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva), José Roberto Bernasconi, identifica problemas tanto de formação adequada quanto de vagas disponíveis no ensino superior. “É necessário um turbe force na educação. O Brasil, que é visto como a bola da vez e reúne condições quase inigualáveis, tem que fazer enorme esforço nessa direção.”
De acordo com Marcos Formiga, coordenador do programa “Inova Engenharia”, da CNI (Confederação Nacional da Indústria), o País descuidou-se disso. Consequentemente, na engenharia, a presença é das mais baixas do mundo: 11%, enquanto nos países do Cone Sul está próxima a 30%. E nos desenvolvidos, chega a 80%. “Tem que repensar a matriz de formação dos recursos humanos em ensino superior de maneira urgentíssima.” Ainda na sua opinião, o setor produtivo deve fazer sua parte. “O profissional precisa ser melhor valorizado na indústria.”