Soraya Misleh*
Baseada em contribuições resultantes da série de encontros realizados pela confederação em 2011, foi lançada ao final do seminário “A CNTU na Rio+20 e na Cúpula dos Povos” a campanha Brasil Inteligente. Síntese dos debates que deram origem a essa iniciativa encontra-se na revista que leva seu nome. O evento ocorreu no dia 18 de maio, na sede do SEESP, na Capital paulista. Prestigiaram-no autoridades, líderes comunitários, acadêmicos e sindicalistas, entre os quais representantes das federações dos economistas, odontologistas, médicos, farmacêuticos, além dos engenheiros. E ainda do Sindicato dos Nutricionistas de São Paulo.
Segundo Allen Habert, diretor de Articulação Nacional da CNTU (Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados), a campanha Brasil Inteligente tem como um dos desafios conquistar para os 10 milhões de profissionais liberais no País o que a OIT (Organização Internacional do Trabalho) já consagrou como direito – disporem de 12 dias por ano, sem ônus ao vencimento, para requalificação. Sobre o assunto, “queremos que projeto de lei seja aprovado já em 2013, porque inovação é investimento em cérebro”.
Para o presidente da confederação, Murilo Celso de Campos Pinheiro – que também está à frente do SEESP –, a CNTU, com isso, vem a contribuir para o debate das grandes questões do Brasil. Nessa linha, formou no ano passado seu Conselho Consultivo, cujos novos membros foram empossados também ao final do seminário. Agora são 400, e a meta é chegar a mil.
A participação da entidade em junho próximo, no Rio de Janeiro, na Rio+20 e na Cúpula dos Povos se insere nesse contexto. Para pautá-la, a atividade no SEESP reuniu especialistas que abordaram temas fundamentais ao desenvolvimento sustentável. O vereador Jamil Murad (PCdoB/SP) foi categórico: “A sociedade precisa pegar na mão essa questão.”
Propostas iniciais
Já o deputado estadual Simão Pedro (PT/SP) levantou a premência de se discutir na capital fluminense a soberania alimentar e nutricional. Vice-presidente do SEESP e representante da FNE (Federação Nacional dos Engenheiros) no Conselho Nacional das Cidades, Laerte Mathias colocou o tema como um dos três principais a serem destacados nos debates no Rio de Janeiro – ao lado de segurança energética com ênfase em fontes sustentáveis e do papel dos recursos da biodiversidade para a inclusão social. Além disso, traçou histórico de todo o processo de debates em torno da temática do desenvolvimento sustentável nos últimos 20 anos.
Integrante dos comitês paulistas para a Rio+20 e o Fórum Social São Paulo, ele lembrou que a largada para as discussões sobre meio ambiente foi dada em Estocolmo, Suécia, em 1972. Vinte anos depois, realizou-se no Rio de Janeiro a Eco 92, da qual saíram várias declarações e tratados internacionais, cujo problema, segundo observou, tem sido a baixa implementação. Isso não obstante o reforço obtido com a apresentação do Protocolo de Kyoto em 1997, a reafirmação dos compromissos em Johanesburgo, África do Sul, em 2002 e alguns avanços. Entre os quais, a multilateralidade nos debates, a crescente consciência política e o foco no desenvolvimento sustentável, considerando-se, portanto, o tripé que abrange as esferas econômica, social e ambiental.
Na sua concepção, é fundamental retomar o que está expresso nessas declarações, na Agenda 21 e em especial na Carta da Terra – um dos documentos oriundos da Eco 92. Entre esses, mudar o padrão de produção. “As nossas propostas iniciais englobam direito soberano de desenvolvimento das nações; geração de empregos decentes, renda e riqueza melhor distribuídas; paz mundial; desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação visando a sustentabilidade; capacitação e qualificação da sociedade civil e do poder público”, finalizou.
Na visão de Wagner Costa Ribeiro, professor titular do Departamento de Geografia e do Programa de Pós-graduação em Ciência Ambiental da USP (Universidade de São Paulo), os eventos a se realizar em junho devem pautar “as correções dos graves erros cometidos no século XX”. Não obstante, ele ponderou que a Rio+20 ocorrerá numa conjuntura completamente distinta da que se tinha em 1992. “Naquele momento havia um entusiasmo e uma vontade de transcender limites territoriais, com o fim da Guerra Fria. O espírito era de convergência. Vinte anos depois, temos uma grave crise dentro do sistema operacional, o que tem que ser levado em conta.”
Conforme Ribeiro, nessa conferência da ONU é crucial repensar o padrão de produção – no caso da agricultura, sem utilização de agrotóxicos. “A sexta economia do mundo é dependente de produtos primários. Depois de vasto avanço em ciência e tecnologia, não podemos admitir isso”, criticou. Defendendo a economia verde, que seria legado da Eco 92, ele apontou esse tema e a revisão do modelo de governança ambiental como dois grandes pontos a serem tratados na Rio+20. Com relação ao último, acredita que é importante fortalecer o Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), implementado em 1986, o que exigirá maior injeção de recursos a esse. Quanto à economia e empregos verdes, o professor da USP frisou: “A inclusão social é o grande ponto a destacar.”
Cidade sustentável
Em pauta, nessa direção, um novo modelo de cidade sustentável. Nabil Bonduki, professor da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo), destacou que essa inclui política de resíduos sólidos; mobilidade, construção e planejamento urbano sustentáveis; manejo das águas nas cidades; APPs (Áreas de Preservação Permanente); qualidade do ar e segurança química. Sua viabilização depende da construção de novos valores.
O coordenador de produtos do Departamento de Estudos, Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), Renato Nunes Balbim, defendeu a participação efetiva da sociedade nessas discussões sobre um novo modelo de cidade, que privilegie o transporte coletivo. Na sua concepção, o problema não é falta de planejamento, mas o fato de esses serem “feitos para servir apenas alguns”. E defendeu a superação da fragmentação e dos interesses corporativos para se pensar as cidades, ao que é necessária a integração das políticas.
Nesse sentido, Bonduki lamentou que o tema “cidade sustentável” tenha apenas, no rascunho zero da Rio+20 – que deve nortear o documento final dessa conferência –, “um parágrafo com cinco linhas”. E informou que o governo brasileiro tem se esforçado para colocar o assunto na pauta do evento global. “O caminho para isso é problematizarmos essas questões no âmbito das discussões na Cúpula dos Povos”, apontou.
Diálogo e agenda social
Esse será o espaço de participação da sociedade civil. Já na Rio+20, para Francisco Whitaker, membro do Conselho Internacional do Fórum Social Mundial, sua presença é uma falácia. Segundo observou, na divisão das atividades da conferência das Nações Unidas, embora haja um momento que está sendo apregoado como de diálogo com a sociedade, trata-se de “uma farsa montada por sugestão do governo brasileiro”. “Haverá um encontro com grandes personalidades e celebridades, com a presença de 20 pessoas em cada tema que colocarão questões, as quais eventualmente poderão ser incorporadas ao documento final, e 2 mil apenas assistindo.” O ponto de convergência entre ambas iniciativas seria que sustentabilidade é fundamental. “O que não estamos de acordo é o modo de fazê-la.” Na sua opinião, o capital quer pintar tudo de verde, mas o que se faz necessário é mudar o modelo em voga.
O especialista em políticas macroeconômicas João Sicsú não propôs tal transformação, mas uma pauta prioritária neste momento. Professor do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), ele enfatizou que o crescimento econômico é premente e tem se dado – a uma média de 4,5% de quatro a cinco anos para cá. Como consequência, tem melhorado a qualidade de vida da população brasileira. “A forma de ocupação que mais cresce é o trabalho com carteira assinada. Foram 2 milhões de empregos entre 2005 e 2011. Representa mudança profunda na vida de milhões de famílias.” Segundo sua explanação, com isso, caíram as taxas de desemprego (de 10% para 5%), houve mobilidade social e maior acesso ao crédito, o que fez com que praticamente dobrasse o mercado doméstico de consumo em dez anos. A valorização do salário mínimo, fruto da ação do movimento sindical e importante mecanismo de distribuição de renda, seria um fator preponderante nesse contexto.
A lição de casa a ser feita agora é priorizar a agenda social. Nesse sentido, destacou as tarefas a serem cumpridas: investir em infraestrutura, educação, saúde e transporte públicos. “É necessário levar o ‘Minha Casa, Minha Vida’ para perto do emprego e as indústrias estabelecerem postos de trabalho próximos das moradias”, citou. E concluiu: “Para isso, o preconceito tem que ser rompido.”
*Colaborou Rosângela Ribeiro Gil