“Intolerância religiosa é a face mais perversa do racismo”, disse, nesta quinta-feira (21/01), Baba Diba de Iemanjá, sacerdote africanista e presidente do Conselho do Povo de Terreiro do Rio Grande do Sul, durante a Marcha pela Vida e Liberdade Religiosa, que percorreu nesta quinta-feira as ruas do centro de Porto Alegre. É o oitavo ano que a caminhada ocorre na capital gaúcha no Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. Nesta edição, a marcha foi uma atividade do Fórum Social Temático.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Marcha toma conta das ruas de Porto Alegre nesta quinta-feira (21)
Ao som de tambores, com vestimentas brancas e cantorias, diversos terreiros do Rio Grande do Sul se encontraram no Largo Glênio Peres e seguiram até o Largo Zumbi dos Palmares. “[A marcha] surgiu como ato político para dar visibilidade à intolerância religiosa e também à luta pela reivindicação de direitos, direitos sociais, pela garantia do Estado laico e também para tentar diálogo com as outas religiões”, informou Baba Diba.
O dia 21 de janeiro é uma referência a ataques sofridos por Mãe Gilda, que teve a casa invadida por grupos evangélicos após uma foto dela ter sido colocada na capa da Folha Universal com o título “Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida dos clientes”.
A casa dela foi apedrejada e o marido agredido verbalmente. Gildásia dos Santos, nome de registro, não suportou os ataques e, após enfartar, faleceu em 21 de janeiro de 2000.
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Baba Diba lembrou os ataques incendiários em terreiros do entorno do Distrito Federal. Foram pelo menos três no ano passado. “Quanto mais avançamos em política pública, em discussões que tentam aproximar as tradições, o racismo muda de status e passa de velado à revelado. Aqui ainda não incendiaram terreiros, mas no país já. Por isso, precisamos estar nas ruas e fazer desse dia o dia nacional de combate à intolerância religiosa.”
A ministra das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos, Nilma Lino, participou da marcha e destacou o evento como um momento de celebração da força ancestral africana.
“Ainda temos de lutar muito pela tolerância religiosa. O Brasil é uma democracia, um país de diversos e todos os credos e religiões têm de ser respeitadas e ter lugar”, acrescentou a ministra.
Sobre os ataques ocorridos no Distrito Federal, Nilma Lino afirmou que a Ouvidoria do órgão tem acompanhado o caso e prestado atendimento às vítimas.
A funcionária pública Júlia Kolatayó, 37 anos, não falava de religiosidade. “A sociedade nos julga pelos olhares. Agora que tenho militado bastante na questão social e na religião africana, tenho conseguido me afirmar mais, mas é bem difícil, porque já perdi emprego, cargo, cursos." Ela foi batizada com 25 anos e sofreu resistência da família católica quando decidiu mudar de religião.
Embora não seja de religião africana, o analista de sistemas Alexandre Hahn disse que também enfrenta preconceitos por conta da religião de bruxaria Wicca. “Não é todo lugar e momento que posso dizer que sou bruxo. Quando digo, a primeira pergunta que vem à cabeça é se faço magia negra. Magia não tem cor. Se vou numa entrevista de emprego, pentagrama é sempre dentro da camiseta. Não posso mostrar. Rosário, uso aqui hoje, mas não posso usar em todo lugar.”
Michel Borges, o Pai Maicon de Oxalá, foi criado na religião africanista no município de Santa Maria. Segundo ele, a relação do terreiro com a comunidade foi construída através de uma aproximação ao longo dos anos. “Temos a festa de Natal, das crianças, das mães. Assim, estabelecemos uma relação com as pessoas e todos respeitam.”
Maria de Fátima Rodrigues também nasceu na religião. “Minha mãe diz que eu tinha 24 dias quando passei a fazer parte da religião.” Maria de Fátima lembrou que a estratégia para estabelecer um vínculo com a comunidade foi reunir crianças em uma ação de empoderamento da cultura negra.
Fonte: Por Camila Maciel – Enviada especial da Agência Brasil